Tereza Campello: Auxílio é questão de segurança alimentar, não fiscal

Para ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, auxílio de R$ 150 não cumpre papel de mitigar a crise sanitária e a fome.

Tereza Campello - (Foto: Wilson Dias/Agência Brasil)

O Brasil, mais uma vez, vive um momento de aceleração da pandemia. Nesta quarta-feira (23), pela primeira vez o país registrou mais de 100 mil novos casos confirmados em 24 horas. Paralelamente, a inflação não dá trégua ao bolso dos cidadãos.

Começou com a alta dos alimentos e combustíveis. Agora, a bola da vez é a energia elétrica. Em relatório divulgado nesta quinta-feira (24), o Banco Central elevou para 5,8% a estimativa para o IPCA em 2021, prevendo para agosto um pico de 8,5% da inflação acumulada em 12 meses. O principal motivo é a previsão de impacto da crise hídrica sobre a conta de luz.

Enquanto isso, milhões de brasileiros que perderam o emprego ou estão passando dificuldades devido à pandemia recebem um auxílio emergencial entre R$ 150 e R$ 375. Para Tereza Campello, ministra do Desenvolvimento social e Combate à Fome durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), o auxílio no formato atual não cumpre o papel para o qual foi desenhado em 2020.  

No início da pandemia, foi pago um auxílio entre R$ 600 e R$ 1,2 mil em três parcelas à população, para permitir que as famílias fizessem isolamento social e se protegessem da Covid-19. O valor foi aprovado pelo Congresso com articulação da oposição. O ministro da Economia, Paulo Guedes, havia enviado uma proposta para instituir R$ 200 de auxílio.

Posteriormente, o governo Bolsonaro reduziu o valor das parcelas para entre R$ 300 e R$ 600. Ao fim de 2020, deixou vencer o benefício e demorou quatro meses para restabelecê-lo em 2021, mesmo alertado sobre a possibilidade de segunda onda da pandemia. Quando o fez, foi em valores ainda mais reduzidos. Segundo o governo, não existe espaço fiscal para pagar mais.

“O auxílio foi criado por um motivo principal, que é garantir renda suficiente para que a pessoa pudesse ficar em casa, não precisasse sair para procurar emprego. Tinha um objetivo sanitário. Já começa aí o erro grosseiro do governo federal. A questão não é fiscal, é sanitária”, argumenta a ex-ministra.

“Parece que somos gastadores e governo está preocupado com questão fiscal. Mas, neste momento, não gastar é ruim para situação fiscal. Quando o PIB [Produto Interno Bruto] cresce, aumenta a arrecadação, e diminui a proporção da dívida com relação ao PIB”, acrescenta.

Tereza Campello defende o retorno do auxílio ao patamar de R$ 600. “Os R$ 600 são necessários e por isso foi uma luta da oposição. Não estamos falando nem de pagar o aluguel, pagar o gás, pagar a energia. Uma cesta básica não custa menos de R$ 650”, observa, em referência à bandeira dos partidos de oposição e das centrais sindicais, que têm se mobilizado pelo pagamento de um auxílio de R$ 600 até o fim da pandemia.

Segundo a mais recente Pesquisa Nacional da Cesta Básica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em maio, a cesta básica mais cara do país, registrada para Porto Alegre, custou R$ 637. A mais barata, em Salvador, ficou em R$ 470,14.

Tereza Campello destaca que, no caso específico dos alimentos, o governo não adotou medidas para controlar os preços. Em vez disso, está colocando à venda os armazéns da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que deveriam ser para manter estoques reguladores que protegem a segurança alimentar da população em situações como a atual.

“A gente tinha em dezembro, ainda com auxílio de R$ 300, um nível de insegurança alimentar onde 55% dos brasileiros comiam mal [segundo pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar]. Uma parcela estava em situação de fome e outra não estava comendo como deveria comer. Mandam substituir arroz por macarrão, ou seja, não come fibra, proteína, verdura. É gravíssimo e está muito pior hoje, após quatro meses sem auxílio nenhum e agora com um auxílio insuficiente. A situação terá consequências não só no curto prazo, mas no médio e longo prazo”, prevê.

Questionada sobre como um governo progressista deverá atuar, caso eleito, para reverter os efeitos sociais da pandemia e da gestão desastrosa do governo Bolsonaro, a ex-ministra afirmou que deve haver um conjunto de medidas.

“Uma grande frente tendo como objetivo combater a fome, a pobreza e as desigualdades. Você só consegue fazer isso quando considera que as medidas não são só sociais, são também econômicas. É preciso voltar a crescer, gerar empregos, aumentar o salário mínimo e construir políticas públicas de transferência de renda. É preciso ampliar o Bolsa Família não só em termos de público, mas de valor”, diz. Segundo ela, a ampliação já está prevista no Projeto de Lei nº 4.086/2020, conhecido como Mais Bolsa Família, apresentado pelo PT à Câmara.

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