Ministro defende venda dos Correios, apesar do alto lucro

Ministro das Comunicações, Fábio Faria, dedica-se a tentar convencer a sociedade sobre a necessidade de entregar a estatal ao setor privado, mesmo não sendo uma empresa ineficiente que dê prejuízo.

Correios

“Nós temos que preservar os Correios, valorizar os Correios”. A afirmação foi feita hoje (3) pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, após inaugurar o Museu da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. 

O ministro explicou que existem muitas empresas atuando hoje no Brasil, sejam nacionais ou internacionais, que “vêm, ano a ano, buscando um market share (quota de mercado) importante de encomendas que os Correios, por não ter recursos para investir e manter a sua competitividade, vai chegar um momento em que vão perder praticamente todo o seu market share de vendas e de encomendas para essas empresas. E a gente precisa fazer com que os Correios sejam preservados”.

O ministro anunciou que amanhã (4), às 10h, o relator do Projeto de Lei 591/210, que autoriza a exploração de serviços postais pela iniciativa privada, se reunirá com todos os líderes de partidos para conversar sobre os Correios. A proposta é considerada pelos parlamentares a privatização dos Correios.

“A gente sabe que é a última janela que temos para preservar os Correios e garantir o que manda a Constituição, no Artigo 21, inciso 10, que é dever da União a manutenção dos serviços postais. A gente só consegue fazer essa manutenção fazendo com que quem adquirir a empresa vai ganhar o bônus, que é a parte das encomendas, da logística, de inteligência, e ela também vai ter que preservar os 95% dos brasileiros que recebem cartas e encomendas ao redor do Brasil. Isso está garantido. Nós garantiremos, de uma vez por todas, a universalização das entregas dos Correios, com esse processo”, disse Faria.

Segundo o ministro, a privatização não vai onerar o cidadão. “No site gov.br/pelofuturodoscorreios, nós colocamos a estabilidade dos funcionários por um período, a questão dos preços”. Faria afirmou que após oito meses de trabalho com as consultorias, com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e conversando com as bancadas partidárias, chegou-se ao modelo atual para a empresa. 

O ministro disse que sem a privatização “nós não saberemos o que vai acontecer daqui a três, quatro, cinco anos se, por um acaso, todas essas empresas forem, ano a ano, tirando a participação de mercado dos Correios”. 

Nessa hipótese, o ministro disse que a União terá de bancar 100% os Correios, cujo custo alcança R$ 20 bilhões por ano. “Nem cabe no teto de gastos, e a gente sabe que tem muitas políticas públicas que temos que manter, como saúde, educação, como segurança, e a gente não tem como fazer que um custo de R$ 20 bilhões seja arcado pela União”.

Para o ministro das Comunicações, a privatização é a única saída para os Correios. “Eu tenho certeza que o Congresso, tanto a Câmara como o Senado, que são soberanos, fará uma votação justa para os Correios, para os funcionários, para essa empresa que dá orgulho ao Brasil”.

Outro lado da questão

Os trabalhadores da estatal, por meio de seus sindicatos, criticam a privatização como um risco para os trabalhadores, para o usuário do serviço e para o país, com benefícios apenas para quem assumir o serviço postal. Um dos argumentos mais ressaltados é que muitas pequenas cidades, vilarejos e periferias são atendidas pelos Correios, apesar de dar pouco lucro.

Os Correios têm 6,3 mil agências próprias em todo o país. Mais 4 mil pontos comunitários e mil franqueadas ou permissionárias. Só que dezenas de agências foram fechadas nos últimos anos “por não gerarem lucro” (segundo o próprio governo). Os sindicalistas questionam como será depois da privatização.

Em 2020, os Correios fecharam o ano com um lucro global de R$ 1,53 bilhão. Sendo assim, os trabalhadores se questionam o motivo da União abrir mão desse lucro, já que a empresa não dá prejuízo.

Os Correios têm hoje mais de 105 mil funcionários. Quantos serão demitidos pelo comprador? E os que sobrarem, terão mantidos seus direitos e vencimentos? O ministro fala num “período” de estabilidade para eles, liberando a empresa a demitir após isso.

Os trabalhadores também argumentam sobre o aumento da importância dos Correios agora na pandemia, quando muito mais gente depende de entregas.

O mais significativo, no entanto, é que o histórico de privatizações brasileiras “não dá esperança”. Citam o exemplo da Vale do Rio Doce, em que a companhia foi vendida por 3,3 bilhões de reais. Só nos 3 primeiros meses deste ano a Vale garantiu um lucro de 5,5 bilhões de dólares para seus donos. Com isso, os trabalhadores lamentam que a fortuna que entrava nos cofres públicos, agora vai direto para o bolso de meia dúzia de bilionários.

Para os sindicalistas, privatizar os Correios só traz vantagens para os bilionários que comprarem a empresa e, claro, a quem garantir esse “presente”. Para eles, seria ingenuidade acreditar que o único interesse em uma transação assim tão gigantesca seja principalmente o bem da população.

Pronunciamento

Na noite de segunda-feira (2), o ministro fez um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV para defender o projeto de privatização dos Correios. A defesa foi feita em função da retomada dos trabalhos do Legislativo após o recesso parlamentar de julho.

No pronunciamento, o ministro disse que os Correios precisam ser fortalecidos para garantir a universalização dos serviços postais.

“Com a privatização, os Correios vão conseguir crescer, competir, gerar mais empregos, desenvolver novas tecnologias, ganhar mais eficiência, agilidade e pontualidade. Somente assim, os Correios poderão manter a universalização dos serviços postais, que significa estar presente em todos recantos do país”, disse. 

Faria também disse que, no passado, a empresa foi alvo de corrupção e que a estatal registrou lucro de R$ 1,5 bilhão em 2020.

“Mesmo com muito trabalho e seriedade, o faturamento se mostra insuficiente frente ao que precisa ser investido todos os anos. São necessários R$ 2,5 bilhões por ano em investimentos para que os Correios permaneçam competitivos e possam disputar o mercado com as outras empresas de entrega, de logística que já operam aqui no Brasil”, afirmou. 

Assista entrevista com o diretor de Relações Internacionais da Federação dos Trabalhadores dos Correios, Ronaldo Leite, ao portal Vermelho, que explica porque a privatização do serviço postal é tão nociva: