Guedes defende veto à ampliação de acesso à internet a estudantes

Ministro de Bolsonaro disse que cometerá crime de responsabilidade se liberar recurso

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse hoje (12) que o governo cometeria crime de responsabilidade caso disponibilizasse os R$ 3,5 bilhões a estados e municípios para ampliar o acesso à internet para estudantes e professores da educação pública, previstos na Lei 14.172/2021. A reiteração desse tipo de argumento frequente do ministro foi feita durante debate na Câmara dos Deputados sobre o assunto nesta quinta-feira (12).

Ele justificou com a lei da Responsabilidade Fiscal, o Teto de Gastos e o impeachment por pedaladas fiscais, ignorando que todas essas leis, e o próprio impeachment, foram criadas para dificultar o acesso da população aos recursos e serviços públicos de qualidade e garantir o pagamento de dividendos a especuladores financeiros estrangeiros.

A resposta nas redes sociais foi uma chuva de tuítes mencionando gastos supérfluos do governo que, na opinião dos eleitores, deveria ser crime.

A lei determina o repasse dos recursos da União a estados, Distrito Federal e municípios, para que invistam na ampliação do acesso à internet “com fins educacionais, a alunos e professores da educação básica pública”, de forma a amenizar os efeitos da pandemia na vida dos estudantes, em especial dando condições para a realização de aulas no formato online.

A norma só foi possível após o Congresso Nacional rejeitar, em sessão no início de junho, o veto total do presidente Jair Bolsonaro ao projeto que originou a lei (PL 3.477/2020). Diante da rejeição ao veto, o governo questionou a constitucionalidade da matéria junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), por entender que a lei dificultaria o cumprimento da meta fiscal e da regra de ouro (proibição de empréstimo para pagar despesas de custeio do governo), prevista na Constituição Federal.

Segundo Guedes, o veto presidencial não foi uma questão de mérito, uma vez que “todos são a favor de uma educação pública de qualidade”. “O veto da área econômica tinha razões técnico-jurídicas. Nunca foi uma questão de mérito. Existe uma Lei de Responsabilidade [Fiscal] em vigor e existem requisitos de leis orçamentárias. Não podemos cometer um crime de responsabilidade fiscal. Não é questão de escolha pessoal”, argumentou durante audiência na Comissão de Educação, da Câmara dos Deputados.

O ministro apontou a causa da controvérsia à “disfuncionalidade do nosso processo orçamentário, onde poderes independentes decidem sem perceber a execução ou a capacidade de execução do outro poder”.

“O Executivo tem a obrigação de cumprir a lei. Não posso cumprir instruções que não venham especificadas de maneira adequada. Caso contrário, estouro o teto e a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que já deu em impeachment no Brasil. Se a lei vem de forma inexequível, eu não consigo cumprir. Temos de discutir formas de consertar essa disfuncionalidade na execução orçamentária”, acrescentou.

Adin

Ao receber a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) apresentada pelo governo federal, durante o plantão de julho do STF, o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, prorrogou o prazo para que a União transfira os R$ 3,5 bilhões a seriam usados para garantir o acesso à internet. Na decisão, Fux argumentou que a análise dos autos revela uma série de questões constitucionais complexas, que serão analisadas pelo juiz natural da Adin, o ministro Dias Toffoli.

Segundo parlamentares que participaram da audiência de hoje – entre eles a presidente da comissão, Professora Dorinha (DEM-TO) – a Adin apresentada pelo governo representa a “quebra de um acordo feito anteriormente entre os poderes Executivo e Legislativo”.

A deputada Professora Dorinha lembrou que a própria derrubada do veto presidencial “foi construída em meio a uma série de acordos com o governo”. “Na Adin 6.926, são alegadas inadequações orçamentárias e a inexistência de estimativas de impacto financeiro. Ela, no entanto, não menciona a memória de cálculo que consta no parecer, com os critérios de distribuição e o formato de execução. Pergunto então ao senhor ministro se o governo levou isso em consideração [ao apresentar a Adin]”.

No debate, o ministro também foi questionado sobre o edital para leilão da Internet 5G não prever compromisso de fornecimento de conexão para as escolas. Guedes disse que colocará a equipe do ministério à disposição para conversar sobre o tema com o Congresso.

Fust

Nas negociações para a derrubada do veto, estaria previsto que as fontes de recursos para o programa teriam como origem o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) e o saldo correspondente a metas não cumpridas dos planos gerais de universalização do serviço telefônico fixo.

O vice-líder do PDT, deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), criticou a manobra do governo, afirmando que “não dá para aceitar que o governo entre com uma ação na Justiça, para negar conectividade aos estudantes brasileiros”. Segundo ele, “o Brasil tem dinheiro de sobra. Muito dinheiro. Essa é uma questão de prioridade, e a prioridade não é a educação”.

Em resposta às afirmações de deputados sobre os inúmeros debates sobre as fontes de recursos apontadas para o financiamento da lei, Guedes disse não se lembrar de ter participado dessas reuniões, durante as negociações com representantes do governo federal, e sugeriu que o levantamento seja encaminhado à Advocacia- Geral da União (AGU) para análise. “Não me lembro de ter participado dessas reuniões de conversa sobre o Fust”.

Outros recursos

O ministro, no entanto, lembrou que o governo tem disponibilizado outros recursos que poderiam ser usados pelos entes federativos para o mesmo fim. “Estados e municípios receberam R$ 50 bilhões livres a partir de junho 2020. Por que não cumpriram esse objetivo [com esses recursos]?”, questionou.

A deputada Professora Dorinha disse que não cabe cobrar de estados e municípios uma lei que é de execução federal:

“Nós estamos falando de uma lei que estabelece uma responsabilidade do governo federal. Aqui não cabe, neste contexto, discutir o que os governadores e prefeitos fizeram ou não fizeram com o dinheiro. Tem espaço para isso. Nós estamos falando d Lei 14.172, que foi construída em uma série de acordos com o governo, cumprindo inclusive o que está na Constituição. O governo não está fazendo um favor para estados e municípios”, disse.

Para a deputada Professora Rosa Neide (PT-MT), Guedes sugeriu que os recursos saiam da pasta da área, o Ministério da Educação, que já não consegue repassar o necessário para as universidades federais.

A história da lei da conectividade, segundo o deputado Danilo Cabral (PSB-PE), mostra que é complicado negociar com o governo:

“No fim é essa sensação. A gente não tem um ponto focal que de fato aponte quem é o responsável pela coordenação das ações do governo Bolsonaro”, observou.

Além de beneficiar alunos da rede pública do ensino fundamental e médio, bem como integrantes de famílias vinculadas ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, a Lei 14.172 beneficia também escolas das comunidades indígenas e quilombolas.

A lei determina que, caso não haja acesso à rede móvel na região ou a modalidade de conexão fixa para domicílios ou comunidades se mostre mais barata, o acesso a esse tipo de banda larga poderá ser contratado.

Metade dos R$ 3,5 bilhões previstos poderá ser usada para aquisição de celulares ou tablets que possibilitem acesso à internet. Esses equipamentos poderão ser cedidos a professores e alunos em caráter permanente ou temporário, a critério dos governos locais.

Com informações da Agência Brasil

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