Morre Paulo Rafael, uma lenda nordestina da guitarra

Um dos mais virtuosos e criativos músicos brasileiros, Paulo Rafael uniu o rock ao forró e marcou gerações de músicos e apreciadores de música.

O guitarrista e produtor musical pernambucano Paulo Rafael faleceu na madrugada desta segunda-feira (23), aos 66 anos por complicações de saúde causadas por um câncer de fígado. Ele ficou conhecido na cena musical por integrar a banda Ave Sangria, que marcou a história do rock psicodélico brasileiro, e por ter um papel fundamental na definição do som de Alceu Valença, trazendo a força do rock para canções influenciadas pela música regional nordestina, ao longo de mais de 40 anos de parceria.

A morte de Paulo Rafael foi anunciada por sua filha através do perfil do músico no Instagram onde anunciou: “É com profunda tristeza que comunico que meu pai, nosso amigo, lendário guitarrista e amor da vida da minha mãe levantou voo. Depois de uma longa batalha contra um câncer nosso guerreiro descansou”. A postagem informa ainda que o velório acontecerá nesta terça-feira (24), no Cemitério da Penitência, , no Rio de Janeiro, a partir das 11h15 e a cerimônia de cremação ocorrerá no mesmo dia e local às 13h15.

Natural de Caruaru, no Agreste pernambucano, Paulo Rafael começou sua carreira na década de 1970 no Recife com a banda Ave Sangria. Logo se tornou um dos principais instrumentistas do rock psicodélico local, no movimento contra-cultural conhecido como Udigrudi, e do gênero no país inteiro. Na época, a banda lançou apenas um disco homônimo, de 1974, que foi censurado pela ditadura. A sua sonoridade, porém, foi ganhando novos fãs a cada geração, levando o grupo a se reencontrar em 2014 para gravar um novo lançamento, intitulado Vendavais.

Além da banda, Paulo também participou de outros projetos aclamados da cena psicodélica, como o álbum Paêbirú (1975), de Lula Côrtes e Zé Ramalho, e produziu álbuns solo como sua estreia Caruá (1976), com Zé da Flauta e Lenine (ainda percussionista na época). Contudo, a parceria mais famosa de sua carreira foi com o músico e cantor Alceu Valença, com o qual tocou e produziu vários dos seus discos. Os dois se conheceram em Olinda, enquanto Paulo tocava com o Ave na rua, em frente à Igreja da Misericórdia. Após mais alguns encontros, Alceu convenceu os pais de Paulo a deixarem ele viajar para o Rio de Janeiro para tocarem em um festival. Desde então, a troca de influências se tornou rotina entre os dois, Paulo trazendo a força da guitarra e do rock, e Alceu colocando a tradição violeira regional.

Em 2014, Alceu deu um depoimento falando sobre o papel de Paulo em sua carreira. “Paulo Rafael também é da minha região e, naquele primeiro momento, a geração dele negava um pouco as músicas das nossas raízes. Ele descobriu com a gente que não precisava negar as influências do rock, que também poderia se voltar para o regional. Tornou-se um dos guitarristas mais originais do Brasil e conhece a música do interior, dos violeiros e aboiadores. Isso os guitarristas não conhecem, pois sabem é de balada, não de toada; do rock, e não do xote. Ele é supercriativo, tem sonoridade e bom gosto inacreditáveis. Originalíssimo. É uma referência e um grande amigo. Trabalhamos juntos na definição do meu som – ele teve um papel fundamental nisso.”

Um gigante

A morte de Paulo Rafael repercutiu intensamente nas redes sociais. Artistas, personalidades do meio cultural e político, além de inúmeros fãs postaram mensagens destacando sua trajetória artística e sua enorme contribuição para a música e para a cultura, em especial, a nordestina.

 Por meio de uma rede social, o cantor e compositor Geraldo Azevedo, relembrou que Paulo Rafael era um amigo de longa data. “Juntos, trilhamos um caminho cercado de carinho e realizamos diversos trabalhos. […] Siga em paz, Paulinho! Esse mundo aqui jamais vai ser o mesmo sem você “, disse.

Para o também guitarrista Lucio Maia, da banda Nação Zumbi, “a semana começa com um vazio”. Ele acrescentou, via Twiiter, que “Paulinho Rafael nos deixa com sua obra maravilhosa. Muita sorte daqueles que puderam conviver, uma dádiva pra aqueles que puderam tocar com ele. O homem vai e a obra fica. Você estará sempre entre nós. Te amo e obrigado por tudo”.

“E as guitarras silenciam. Lá se foi o gigante Paulo Rafael. Descanse em paz, meu velho”, declarou Xico Sá, jornalista e escritor.

O governador pernambucano Paulo Câmara considera que “a arte brasileira perdeu um dos seus mais talentosos instrumentistas”. Disse ainda que “o caruaruense Paulo Rafael foi um músico virtuoso e originalíssimo. Fez história nos anos 70 como integrante do Ave Sangria”.

A vice-governadora e presidenta nacional do PCdoB, que sempre teve uma ligação profunda com a cultura pernambucana, afirmou que a morte de Paulo Rafael é muito triste. Ela considera o guitarrista “um gigante que marcou a música brasileira com sua inventividade.  E influenciou toda uma geração de músicos”. Luciano dedicou ainda “carinho para os amigos, parentes e fãs do grande artista. “Um talento assim não silencia, ecoa”, enfatizou.

O jornalista esportivo André Galindo, conterrâneo de Paulo Rafael resumiu a trajetória do guitarrista num post do Twitter: “Se foi nosso Hendrix, Lifeson, Page, Richards, Beck… se foi um virtuoso. Salves e vivas à memória de Paulo Rafael. Do rock psicodélico nos anos 1970 a três décadas dando harmonia e solos à obra de Alceu Valença”.

Assista a apresentação de Paulo Rafael com o Ave Sangria durante a temporada no SESC São Paulo, em 2019.

Com informações do Diário de Pernambuco, do G1 e das redes sociais.

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