Câmara dos Deputados aprova marco legal para a inteligência artificial

Texto passará por análise do Senado

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (29) o marco legal para o uso da inteligência artificial (IA) no Brasil. O texto segue para análise do Senado.

O projeto define fundamentos e princípios para o desenvolvimento e a aplicação da inteligência artificial, incluindo diretrizes para o fomento e a atuação do poder público no tema. O texto estabelece como sistemas de inteligência artificial as representações tecnológicas oriundas do campo da informática e da ciência da computação. Caberá privativamente à União legislar e editar normas sobre a matéria.

O projeto lista vários aspectos que dependerão de regulamentação do Executivo federal por meio de órgãos e entidades setoriais com competência técnica na área, como as agências reguladoras e o Banco Central.

A matéria considera sistema de inteligência artificial o sistema baseado em processo computacional que, a partir de um conjunto de objetivos definidos por humanos, pode, por meio do processamento de dados e informações, aprender a perceber, interpretar e interagir com o ambiente externo, fazendo predições, recomendações, classificações ou decisões. Entre eles estão os sistemas de aprendizagem de máquina (machine learning), incluindo aprendizagem supervisionada, não supervisionada e por reforço.

Entre as diretrizes de regulamentação destacam-se o dever de estimular a criação de mecanismos de governança transparente e colaborativa com a participação de representantes de vários setores; promover a cooperação internacional e a negociação de tratados, acordos e padrões técnicos globais que facilitem a “conversa” (interoperabilidade) entre os sistemas e a harmonização da legislação a esse respeito; e estimular a adoção de instrumentos regulatórios que promovam a inovação.

Desafio parlamentar

O projeto, de autoria do deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE), foi aprovado na forma do substitutivo da relatora, deputada Luisa Canziani (PTB-PR).

Para Bismark, a proposta sinaliza para o mundo que o Brasil está atento à inovação e à inteligência artificial. “A inteligência artificial já faz parte da nossa realidade, e o Brasil vai ainda fazer outras legislações futuramente. O momento agora é de traçar princípios: direitos e deveres e responsabilidades”, defendeu.

Os órgãos deverão monitorar a gestão do risco dos sistemas de inteligência artificial no caso concreto, avaliando os riscos de sua aplicação e as medidas de mitigação; estabelecer direitos, deveres e responsabilidades; e reconhecer instituições de autorregulação.

Segundo a relatora, deputada Luisa Canziani, a proposta aprovada também delineia direitos dos usuários de tais sistemas, como a ciência da instituição que é responsável pelo sistema, o direito de acesso a informações claras e adequadas a respeito dos critérios e dos procedimentos utilizados pelo sistema.

“Além disso, há o estabelecimento de alguns fundamentos para o uso da inteligência artificial no Brasil, tais como o desenvolvimento tecnológico e a inovação, a livre iniciativa, a livre concorrência e o respeito aos direitos humanos e aos valores democráticos. Também foram preceituados objetivos que visam, por exemplo, à promoção da pesquisa e do desenvolvimento de uma inteligência artificial ética e livre de preconceitos e da competitividade e do aumento da produtividade brasileiros”, explicou a deputada.

De acordo com a relatora, o texto original é inspirado nos conceitos e diretrizes propostos na Recomendação sobre Inteligência Artificial da Organização dos Estados para o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

“O documento da OCDE é uma das principais referências internacionais sobre o assunto e já foi formalmente subscrito pelo Brasil, apesar do país não integrar ainda a OCDE. No entanto, por se tratar de um documento de uma organização internacional e apresentar natureza principiológica, seu texto é propositadamente mais aberto e vago”, argumentou.

“Procuramos orientar a futura atividade regulatória nesse campo de modo a não inibir o desenvolvimento tecnológico, mas resguardando os cidadãos brasileiros de eventuais riscos”, afirmou Luisa Canziani.

Ela ressaltou que não seguiu o modelo europeu quanto à proibição a priori de certos tipos de inteligência artificial ou de quais seriam de alto risco, deixando essas definições para a regulação ou autorregulação setorial posterior.

A proposta chegou a ser criticada pelo deputado Leo de Brito (PT-AC), que cobrou regras mais específicas. Após a inclusão no texto de temas como a responsabilidade do Estado, foi feito acordo a favor do texto. “Fomos contemplados em algumas questões fundamentais, por isso retiramos a obstrução”, explicou.

O Plenário rejeitou duas emendas do deputado Bohn Gass (PT-RS). Uma delas pretendia incluir, entre os princípios da regulamentação, a promoção da inclusão, da diversidade e da equidade com a participação ativa em processos de consulta pública de grupos potencialmente afetados pela tecnologia específica.

A outra emenda exigia que a análise de risco deveria ser efetuada no âmbito de um relatório de impacto de inteligência artificial.

Princípios gerais

Sobre os princípios, o texto prevê que os sistemas de inteligência artificial devem buscar resultados benéficos para a humanidade (finalidade benéfica); o respeito à dignidade humana, à privacidade, à proteção de dados pessoais e aos direitos fundamentais, quando o sistema tratar de questões relacionadas ao ser humano (centralidade do ser humano); e diminuir a possibilidade de uso dos sistemas para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos (não discriminação).

Outros princípios são a busca pela neutralidade; a segurança e prevenção; a inovação responsável; a disponibilidade de dados; e a transparência, observados os segredos comercial e industrial, sobre o fato de estarem se comunicando com sistemas de inteligência artificial ou sobre os critérios gerais que orientam seu funcionamento.

Entre os objetivos, o texto cita o desenvolvimento científico e tecnológico; a promoção do desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo e do bem-estar da sociedade; o aumento da competitividade e da produtividade brasileira; a inserção competitiva do Brasil nas cadeias globais de valor; a melhoria na prestação de serviços públicos e na implementação de políticas públicas; a promoção da pesquisa e desenvolvimento com a finalidade de estimular a inovação nos setores produtivos e a proteção e preservação do meio ambiente.

Com informações da Agência Câmara de Notícias

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