Derrota de Bolsonaro: Maioria do STF mantém suspensão do “orçamento secreto”

Até agora, seis ministros decidem manter liminar de Rosa Weber. Com isso, Bolsonaro perde um mecanismo de garantir apoio do Congressos por meio de atendimento a emendas.

Ministra Rosa Weber entrega Constituição para Bolsonaro em visita de cortesia Foto: Divulgação/TSE

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu (9) manter a decisão individual da ministra Rosa Weber que determinou a suspensão da execução dos recursos das chamadas “emendas do relator” (RP9) relativas ao Orçamento da União deste ano, conhecidas como orçamento secreto. Além disso, no prazo de 30 dias, o Congresso e o Executivo deverão dar ampla publicidade aos documentos que embasaram a distribuição dessas emendas nos exercícios de 2020 e de 2021. 

As emendas de relator deveriam ser um instrumento para que o relator-geral do orçamento pudesse fazer adequações legais ao projeto aprovado no Congresso, mas não para repasse massivo de verbas. Com isso, elas se tornaram um mecanismo do Congresso para reverter parte do orçamento para as bases parlamentares, sem identificação de destinação. `Foi pela dificuldade em rastrear os gastos que o dispositivo ficou conhecido como “orçamento secreto”.

Transparência

Até o momento, além de Rosa Weber, relatora da ação, seguiram o entendimento a ministra Cármen Lúcia e os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes. O julgamento continua para a tomada de mais quatro votos. Faltam os votos de Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Nunes Marques e do presidente da Corte, Luiz Fux.

A liminar foi proferida pela ministra na sexta-feira (5) e está em julgamento em sessão do plenário virtual, que vai até as 23h59.

Na decisão que suspendeu esse tipo de emenda, Rosa Weber entendeu que não há critérios objetivos e transparentes para a destinação dos recursos. A ministra considerou que há ausência de instrumentos de prestação de contas sobre as emendas do relator-geral, que, ao contrário das emendas individuais, são distribuídas a partir de critérios políticos, em geral, somente para parlamentares que apoiam o governo. 

PEC dos Precatórios

Com isso, o presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL) sai derrotado, mais um vez, ao perder um importante mecanismo de garantia de base favorável no Congresso, sem ser acusado de estar comprando votos dos deputados. Um dos argumentos contra as emendas é justamente o fato delas permitirem que apenas deputados da base de governo sejam beneficiadas.

Somente nos dias 28 e 29 de outubro, semana anterior à votação em primeiro turno da PEC dos Precatórios, o governo liberou mais de R$ 900 milhões por meio destas emendas, segundo levantamento da ONG Contas Abertas com base em dados oficiais. Aprovada com margem de apenas 4 votos, a PEC agora corre risco de rejeição na votação de segundo turno.

Foi também na eleição para a presidência da Câmara, que o mecanismo foi amplamente usado para eleger Arthur Lira, assim como denunciado pela imprensa. Como as emendas atendiam a compras de equipamentos agrícolas com indícios de superfaturamento, elas passaram a ser chamadas de “tratoraço”.

No fim de outubro, a cidade de Barra de São Miguel (AL), que tem o pai de Arthur Lira (PP-AL) como prefeito, recebeu R$ 3,8 milhões provenientes de emendas do relator, segundo reportagem publicada hoje pelo jornal O Globo.

“A utilização de emendas orçamentárias como forma de cooptação de apoio político pelo Poder Executivo, além de afrontar o princípio da igualdade, na medida em que privilegia certos congressistas em detrimento de outros, põe em risco o sistema democrático mesmo”, escreveu a ministra Cármen Lúcia em seu voto.

A questão era tão grave ao governo que, além de se manifestar oficialmente, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi ontem ao STF e se reuniu com o presidente da Casa, Luiz Fux. No encontro também estavam o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), o vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), e o relator-geral do orçamento, deputado Hugo Leal (PSD-RJ).

Deputados já procuram alternativa para driblar a decisão do STF nas RP8, as emendas de comissão, que também dificultam a identificação dos responsáveis. A manobra para manter o controle sobre o cofre do Executivo foi denunciada pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Confira a repercussão:

A líder do Psol, deputada Talíria Petrone (Psol-RJ), comemorou a decisão. “O Psol entrou com uma ação no Supremo contra as vergonhosas emendas de relator e, agora, nós e o povo brasileiro conquistamos uma vitória. É preciso dar publicidade aos repasses já efetivados e os bilhões da lógica do ‘toma lá, dá cá’, e o Supremo ficou do lado da democracia”, disse.

O deputado Henrique Fontana (PT-RS), por outro lado, afirmou que a decisão do STF devolve ao Congresso a responsabilidade de fazer o Orçamento com critérios republicanos e constitucionais. “Não é razoável que existam emendas secretas para privilegiar alguns parlamentares porque o privilégio de alguns é a discriminação dos outros”, disse.

Último apelo

Ontem (8), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), apresentou um recurso formal ao STF para derrubar a decisão da ministra. O presidente argumentou que o Judiciário não pode indicar que o Legislativo adote determinado procedimento na lei orçamentária. Além disso, a questão trata de matéria interna do Congresso e não cabe interferência de outro poder. 

De acordo com Lira, a suspensão das emendas do relator pode provocar a suspensão de serviços públicos. O Senado se manifestou na ação e também defendeu a revogação da suspensão. 

“O efeito da suspensão sistemática de todas as programações marcadas com o identificador RP 9, incluídas por emendas de relator, será o de impedir a continuidade de inúmeras obras e serviços em andamento, na maioria das vezes objeto de convênios com outros entes da federação, o que traria grande prejuízo às políticas públicas em execução e que foram regulamente acordadas no âmbito do Congresso Nacional com o Executivo, além de outras consequências jurídicas e administrativas”, afirmou Lira. 

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