Chile e Venezuela: mensagens distintas, por Atilio Boron

Enquanto a governo bolivariano se fortalece na Venezuela, no Chile o avenço da extrema direita é motivo de preocupação.

Eleição no Chile tem polarização acirrada l Foto: Pagina12

O domingo testemunhou duas eleições importantes. Na Venezuela, o a eleição tranquila e a presença de quase todos os segmentos da oposição constituem um sucesso extraordinário para o governo bolivariano, assim como um obstáculo de difícil superação para os golpistas e desestabilizadores protegidos por Washington e os burocratas reacionários da União. Europeia. No Chile, o segundo turno contava com os neonazistas José Antonio Kast, do Partido Republicano, e Gabriel Boric, candidato da coalizão Aprovar Dignidade (Frente Ampla e Partido Comunista). O que não se previa era que o candidato de Pinochet obtivesse a primeira minoria relativa, quando várias pesquisas apontaram Boric como vencedor, embora longe da maioria absoluta.

Ao contrário da Venezuela, no Chile foram convocadas eleições para eleger o presidente, deputados (155) e 27 senadores, além de vereadores regionais. O cenário ora traçado apenas nos permite levantar algumas conjecturas sobre o que poderá acontecer no segundo turno previsto para 19 de dezembro. Os antecedentes históricos dizem que de 1990 até o presente os candidatos que venceram no primeiro turno também o fizeram no segundo. Se esses números se confirmarem, pode-se dizer que estamos diante de um verdadeiro terremoto político. Não apenas pela vitória de Kast no primeiro turno, mas também porque nenhum dos três partidos que dominaram a vida política chilena desde o fim da ditadura: UDI, Renovação Nacional e Democracia Cristã, estarão presentes com seus próprios candidatos no segundo turno. Pode-se, sem dúvida, falar de um fim de ciclo, em um contexto em que o povo chileno tenta, pela primeira vez em sua história, elaborar uma constituição de caráter democrático. A incerteza gerada pelo desempenho eleitoral da extrema direita lança sombras espessas sobre a viabilidade de um propósito tão nobre.

Na Venezuela, este domingo foi a 29ª eleição desde a posse de Hugo Chávez Frías à presidência da República em 2 de fevereiro de 1999. Apesar disso, a oposição recalcitrante de Washington e Bruxelas ao chavismo não parou de estigmatizar, nem por um momento, ao governo bolivariano como uma ditadura, comparável aos que devastaram a América Latina nos anos 1970. Como não lembrar as sábias palavras de Eduardo Galeano ao afirmar “Hugo Chávez é um ditador, porém, é um ditador curioso. Ele ganhou oito eleições em cinco anos. ” Nessas eleições regionais, o governo bolivariano colocou em jogo, de acordo com o que a Constituição determina, nada menos que 23 governadores e 335 prefeitos. Se a presença da oposição foi positiva, outro indicador bastante eloquente será o grau de participação eleitoral. Há que ter em conta que desde 1984 a votação deixou de ser obrigatória devido a um acordo entre as duas principais forças políticas da época: a Ação Democrática e a Democracia Cristã. Uma cifra próxima a 50% seria saudada com alegria, tanto na Venezuela quanto no Chile, dado o papel dissuasor da pandemia covid-19 e, na Venezuela, os estragos do bloqueio. Claro, enquanto este país foi praticamente invadido por inúmeras missões de observação eleitoral, com a aprovação do governo de Maduro; enviado pela União Europeia, o Carter Center, vários especialistas da ONU, bem como outras organizações regionais na América Latina e África, no Chile, essas missões chamam a atenção, senão por sua ausência, devido ao reduzido número de seus contingentes. De qualquer forma, quando for feita a recontagem final dos resultados da “megaeleição” venezuelana (senão antes) choverão críticas dos guardiões eternos das democracias, tentando nublar o processo eleitoral e justificar novos ataques ao governo bolivariano.

No entanto, o veredicto nas urnas deve ser um poderoso dissuasor para aqueles que, em Washington e Bruxelas, apostaram durante anos numa criminosa “mudança de regime” no país caribenho. É improvável que adotem uma linha política diferente, porque Washington está absolutamente em jogo com a “recuperação” da Venezuela, a qualquer custo. Os próximos dias nos darão uma diretriz do que está por vir nos dois países.

Fonte: Pagina12

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