A esquerda bem informada
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Emendas de relator são utilizadas para valores mais altos do que o permitido

José Maurício Conti comenta essas emendas, destinadas a pequenos ajustes no orçamento do governo, mas que passaram a abocanhar recursos cada vez maiores

O relator acabou assinando emendas de valores altos, o que vai contra o que é permitido — os pequenos ajustes. Edição feita com imagens de Unsplash e Freepik

As emendas de relator, um tipo de gasto orçamentário, têm sido muito criticadas e consideradas como orçamento secreto. Apesar de serem destinadas a pequenos ajustes no orçamento do governo, passaram a abocanhar uma fatia relevante de recursos indicados por parlamentares — neste ano somam R$ 16,5 bilhões.

Prof. José Maurício Conti – Foto: Reprodução/FD-USP

O professor José Maurício Conti, de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP, em entrevista à Rádio USP, explicou primeiramente a diferença dos gastos obrigatórios e a questão do ciclo orçamentário, do qual essa emendas de relator fazem parte. “As chamadas despesas obrigatórias são aquelas despesas que você tem que realizar necessariamente por uma série de razões, por exemplo, pagamento de salário de funcionários.” Já a lei orçamentária, elaborada em conjunto pelos poderes Executivo e Legislativo, “é feita com base em previsões que podem não se concretizar, por exemplo: arrecadou menos do que estava previsto na lei orçamentária ou houve uma intercorrência, como quando houve o caso da pandemia, que obriga você a realocar os gastos”.

Emendas parlamentares

Conti prossegue, explicando que principalmente a partir da emenda 86, de 2015, começaram a dar mais força para os valores que os parlamentares incluem na lei orçamentária por meio das chamadas emendas parlamentares. “É um valor que, uma vez incluído no orçamento, a possibilidade de o Executivo mexer nisso fica bem mais complicada.” Com isso, de acordo com o professor, o Parlamento foi crescendo e conseguindo incluir ou aumentar sua participação no orçamento.

Emendas de relator

Já é estabelecida uma cota para os parlamentares no orçamento para a realização de emendas. Uma delas, a emenda de relator, tem a função de fazer pequenos ajustes na hora de finalizar a proposta orçamentária. Além disso, o relator passava a ser o autor da emenda e não mais o parlamentar. Isso porque eles “começaram a verificar que, em algumas emendas, os parlamentares não têm interesse em assumir a autoria. Eles não gostariam por uma multiplicidade de razões, de várias naturezas”, ressalta Conti.

As razões podem ser “interesses políticos, regionais e até interesses, por exemplo, relacionados a uma prática de ato de corrupção”. O professor exemplifica com o caso de uma emenda referente à destinação de um recurso para uma determinada cidade, para construir uma ponte, mas cuja licitação pode ser fraudada. “Então, o parlamentar não quer assumir a autoria daquela emenda porque, depois, quando houver uma investigação, ele vai ficar como um suspeito de ter participado.” Nesse sentido, um dos problemas refere-se à falta de transparência a respeito de quem é o autor da emenda. “A falta de transparência, que foi chamada de orçamento secreto, é essa obscuridade na autoria da emenda”, afirma Conti.

Ele destaca também que isso sempre ocorreu. Os parlamentares trocavam entre si a autoria das emendas e as emendas de relator seriam para “facilitar e organizar isso, simplesmente colocando no relatório”. Além disso, o relator acabou assinando emendas de valores altos, o que vai contra o que é permitido — os pequenos ajustes.

Por fim, o professor destaca que a lei precisa ser cumprida. Logo, o problema é utilizar as emendas de relator para valores além dos permitidos. “Ela é feita para pequenos ajustes e não está sendo usada para isso. E também não é para poder acobertar ou somar emendas de todos os parlamentares e colocarem o nome do relator”, pondera.

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