O mundo não aguenta mais tantas guerras. Será?

A comoção dos grandes países, corporações e os civis é por conta de um desejo de paz entre os povos ou há outros detalhes nesse contexto?

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Após a invasão da Rússia à Ucrânia, um corporativismo midiático se faz presente em escala intercontinental. Com razão, famílias estão sendo forçadas a sair dos seus lares, outras tantas perdendo a vida de seus entes queridos e o país mergulha em problemas econômicos graves. Além disso, os cidadãos russos, compartilhando ou não com os propósitos de Putin, pagam o preço alto das sanções econômicas que países e grandes corporações estão impondo à Rússia. Há uma comoção popular imensa em relação à Ucrânia, pois a mídia aborda o tema três vezes ao dia desde a ameaça do ataque. Não são poucos os pedidos de paz nas redes sociais. Contudo, essa comoção dos grandes países, corporações e os civis é por conta de um desejo de paz entre os povos ou há outros detalhes nesse contexto?

O primeiro detalhe a ser levado em conta é o fato de se tratar do maior conflito na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, um continente que desde o Império Romano explora outros continentes. A Revolução Industrial foi possível a partir da acumulação de um capital adquirido com a exploração da África e do Continente Americano. Estamos falando de um genocídio que matou e escravizou milhões durante séculos e até hoje os descendentes desses povos pagam caro por essa invasão. Como exemplo, entre 1904 e 1908, na Namíbia, na época colônia alemã, dezenas de milhares foram mortos em um levante e os sobreviventes levados para um campo forçado e também mortos. Essa prática foi aperfeiçoada séculos depois em campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial.

Um detalhe curioso, depois séculos de genocídio, apenas essa carnificina chegar à Europa, a comoção aconteceu.Lembremos que os judeus, injustamente presos e mortos em campos de concentração nazistas eram europeus. Com o fim da Segunda Guerra, as justificativas pseudocientíficas que justificavam esses massacres caíram em descrédito perante a ciência e no dia e em 10 de dezembro de 1948 surge a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Antes desses instinto nada civilizado do europeu chegar à Europa, algo do tipo passou longe de ser feito.

Atualmente, na Etiópia, país que sofreu com ocupações da Itália, há mais de ano ocorre um conflito com estupros, assassinatos de civis e fome generalizada. No Iêmen, ex-colônia inglesa, desde 2011, a guerra deixou quase 250 mil mortes. Em Mianmar, as tensões políticas se arrastam há anos, resultando em um golpe militar em fevereiro de 2021 e, nos últimos meses, a violência aumentou. No Haiti, ex-colônia francesa, o presidente foi assassinato e a primeira dama baleada em julho de 2021. Desde então, o país sofre com uma onda de violência. Mais de 800 pessoas foram sequestradas e como se não bastasse, um terremoto ocorrido em agosto matou mais de 2.000 pessoas. Na Síria, uma guerra civil, desde 2011, deixou mais de 380 mil mortos e 200 mil desaparecidos, possivelmente mortos. No Afeganistão, o Talibã retomou o controle do país com a saída das tropas norte-americanas em agosto de 2021 causando uma grande crise humanitária. O isolamento imposto ao país atinge mais os inocentes do que os grupos radicais. Na África também há  grupos islâmicos fundamentalistas armados que atacam governos já fragilizados em Mali, Niger, Burkina Faso, Somália, Congo e Moçambique. Suspeita-se que haja ligação entre esses grupos e o Estado Islâmico.

Na Europa, frases de jornalistas têm chamado atenção ao falar de suas indignações com a invasão da Ucrânia. “Esse não é um lugar, com todo respeito, como Iraque ou Afeganistão que tem visto conflitos há décadas. Essa é uma cidade relativamente civilizada, relativamente europeia.”, disse um jornalista europeu durante uma transmissão ao vivo. O ex-procurador-geral adjunto da Ucrânia afirmou: “É muito emocional para mim porque eu vejo europeus com olhos azuis e cabelos loiros sendo mortos todos os dias com mísseis de Putin, seus helicópteros e seus foguetes”. Muitas outras declarações semelhantes foram feitas, o que demonstra uma naturalização dos conflitos fora da Europa e um sentimento de superioridade que não desapareceu com o fim do império colonial. Isso explicaria a comoção da mídia em escala intercontinental e também das pessoas, pois elas se comovem com o que a mídia se comove. Por que os brasileiros que se voluntariaram para ajudar os ucranianos não fizeram isso na Bahia durantes as enchentes ou em qualquer um dos outros países que estão sofrendo com a guerra? Por que os imigrantes dos outros conflitos não são aceitos em países europeus? Não, não estamos preocupados com paz, mas apenas com a paz que a grande mídia nos traz.

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