Doria abandona corrida presidencial e escancara a crise da 3ª via

Decisão deve ser anunciada em entrevista coletiva prevista para as 16 horas desta quinta-feira (31)

De forma surpreendente, o governador João Doria (PSDB-SP) anunciou a aliados que abortou seu projeto presidencial. O tucano tinha até esta sexta-feira (1/4) para se desincompatibilizar do governo paulista, e sua pré-campanha à Presidência da República já contava com coordenadores, equipes e até as primeiras peças de divulgação. Mas Doria voltou atrás.

Sua decisão deve ser anunciada em entrevista coletiva prevista para as 16 horas desta quinta-feira (31), após evento oficial no Palácio dos Bandeirantes. Especula-se que o governador pode até se desfiliar do PSDB, mas deve permanecer à frente do Palácio dos Bandeirantes, sem concorrer à reeleição. A se confirmarem todos esses rumores, várias crises se abrem.

A primeira é com o vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, que, no ano passado, trocou o DEM pelo PSDB e era o nome apoiado por Doria à sua sucessão. Só que, para ganhar mais visibilidade e ampliar a competitividade de sua candidatura, Garcia esperava assumir o governo estadual a partir desta semana, com a prometida renúncia de Doria e uma transição meticulosamente planejada. Considerando-se golpeado, o vice renunciou ao cargo de secretário de Governo e tende a deixar o PSDB. Ele já anunciou que não será mais candidato a governador.

A crise tucana também está dada. Embora tenha vencido as prévias do PSDB contra o então governador gaúcho Eduardo Leite, Doria deixou seu partido ainda mais rachado. Nas últimas semanas, o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG) liderou uma articulação para que Leite permanecesse no partido, à sombra de Doria, podendo ser eventualmente ungido como presidenciável. O movimento surtiu efeito, a ponto de Doria, em conversa com um aliado, ter acusado a “traição de Aécio”.

No dia 23, o PSDB já havia perdido Geraldo Alckmin, que foi governador de São Paulo por 14 anos e se filiou ao PSB. Com a polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) na corrida presidencial, é provável que o PSDB se desidrate ainda mais e perca relevância. A possível perda do governo paulista, nas mãos do partido desde 1995, sacramentaria o encolhimento peessedebista.

Por fim, a crise da terceira via está escancarada. Doria, mesmo com a projeção do governo paulista, não conseguiu sair de 2% das intenções de voto. Apesar do pioneirismo do governo paulista na vacinação contra a Covid-19 – uma das apostas do tucano para a corrida presidencial –, a rejeição a seu nome permaneceu elevada. Conforme pesquisa CNT/MDA divulgada em fevereiro, 66,5% dos eleitores brasileiros não votariam de jeito nenhum em Doria – um índice superior até ao do presidente Jair Bolsonaro. Nem militantes esquerdistas nem bolsonaristas o toleram.

Se para Doria o fator que mais pesou para o abandono da disputa foi o fiasco da pré-candidatura, razões similares podem tirar outros candidatos da corrida presidencial. A dois dias do fim da janela partidária – que vai definir a força de cada partido, coligação ou federação nas eleições 2022 –, o ex-juiz Sergio Moro decidiu trocar o Podemos pelo União Brasil. Sua nova sigla – fruto da fusão entre DEM e PSL – tem mais dinheiro, lideranças e capilaridade. Mas a rejeição a uma candidatura presidencial de Moro também é maior. Há indícios de que o ex-juiz igualmente anunciará um novo projeto eleitoral, optando não pelo Planalto, mas pelo Congresso.

Ainda há tempo para a terceira via “catar os cacos do caos”, unir-se e lançar um candidato único à sucessão de Bolsonaro, numa coligação ampla – por exemplo, com União Brasil, MDB e PSDB. Uma chapa Eduardo Leite-Simone Tebet ganhou força nos bastidores. Não é, porém, uma saída tão viável a esta altura. Como os prazos para a janela partidária e a desincompatibilização de governadores estão chegando ao fim, as próximas horas ainda prometem mais reviravoltas.

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