Manifestação em Fortaleza defende a democracia e a educação

Movimento popular, lideranças políticas e sociais, estudantes, sindicalistas e artistas reuniram-se em Fortaleza para se somar ao Dia Nacional em Defesa da Democracia.

O advogado Inocêncio Uchôa leu a carta em defesa da democracia. Ao seu lado o ex-senador Inácio Arruda e a ex-prefeita de Fortaleza, Maria Luiza Fontenele l Foto: Flavienne Vasconcelos

Dezenas de manifestantes reuniram-se na Praça da Bandeira, em Fortaleza, na manhã desta quinta-feira (11), no Ato em Defesa do Estado Democrático de Direito, a exemplo do que ocorre em pelo menos 50 outras cidades brasileiras. Na capital cearense também foi lida a Carta às Brasileiras e aos Brasileiros lançada há cerca de duas semanas, apoiada por quase um milhão de assinaturas e lançada em grande evento realizado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), também nesta manhã . Após a leitura do documento, a manifestação seguiu em caminhada pelas ruas até a reitoria da Universidade Federal do Ceará (UFC), onde os estudantes criticaram os cortes na educação feitos por Jair Bolsonaro.

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O ato foi convocado por diversas entidades e organizações sociais como a Frente Brasil Popular Ceará, Frente Povo Sem Medo, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central Única dos Trabalhadores no Ceará (CUT-CE, Intersindical – Central da Classe Trabalhadora), União Nacional dos Estudantes (UNE), União Estadual dos Estudantes (UEE), União Estudantil de Fortaleza (Unefort) e Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (Adufc-Sindicato).  A manifestação contou ainda com o apoio do ator Jesuíta Barbosa (o Joventino, da novela Pantanal) e do cantor Falcão, que ajudaram a convoca-las através das redes sociais.

 A carta foi lida pelo advogado Inocêncio Uchoa, membro da Associação Brasileira de Jurista pela Democracia (ABJD) e juiz do trabalho aposentado. Uchôa ressaltou o seguinte trecho do documento: “Ataque infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito, tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional”.

O ex-senador e candidato a deputado federal pelo PCdoB Inácio Arruda considera que o 11 de agosto de 2022 em Fortaleza e no Brasil, que também é Dia do Estudante, é uma data histórica na luta democrática do país. Arruda, que foi também Secretário de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Ceará, destacou que o ato defendeu a educação e que os participantes não abrem mão da liberdade e da democracia

Presente à manifestação, previdenciário Luciano Simplício, presidente da Central das Trabalhadoras e dos Trabalhadores do Brasil (CTB-CE), criticou a postura de Jair Bolsonaro. Para o sindicalista, o presidente gera um “risco” à democracia e contra tal ameaça são realizadas as manifestações em defesa da democracia. Já o presidente da ADUFC, Bruno Rocha, defende a ocupação das ruas “para reafirmar que não aceitaremos golpe nas eleições do Brasil”. O professor universitário considera que Bolsonaro está desesperado diante da iminente derrota. “Diremos não a esse governo da morte nas ruas e nas urnas”, destaca o sindicalista.

A presidente da UEE-CE, Yara Larissa, afirmou que as entidades estudantis e diversos movimentos sociais se uniram, durante o dia, na luta pela educação, democracia e por eleições livres. “Infelizmente, em 2022, a gente está indo para rua para defender o óbvio. (….) Os estudantes, como sempre, na linha de frente e dessa vez eu acho que a gente tem que ampliar os nossos horizontes. Por isso que a gente está ampliando e consegue com que a nossa a nossa luta unificada consiga dar um retorno maior”, enfatizou a líder estudantil.

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Duas outras atividades marcarão a defesa da democracia em Fortaleza nesta sexta-feira: ao final da tarde será realizado um ato cultural na Praça da Gentilândia, bairro que concentra um grande número de universidades e escolas – e à noite a carta em defesa da democracia será lida na Universidade de Fortaleza (Unifor). 

Leia a íntegra da ‘Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito’:

“Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

Estado Democrático de Direito Sempre!!!!”