PF indicia mineradoras por fraudes na Serra do Curral

Gute Sicht Ltda e Fleurs Global vêm destruindo parte da Serra do Curral, um cartão postal a poucos quilômetros do centro da capital mineira

Empresas vêm burlando Termo de Ajustamento de Conduta para destruir a serra vizinha a Belo Horizonte - Foto Projeto Manuelzão

A mineradoras Gute Sicht Ltda e Fleurs Global e um diretor da Agência Nacional de Mineração (AMN), além de uma transportadora, foram indiciadas pela Polícia Federal (PF) por fraudes na concessão do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para operações minerárias na Serra do Curral, a cerca de seis quilômetros do centro de Belo Horizonte. Conforme relatório da PF, as investigações começaram após uma fiscalização da Polícia Militar de Meio Ambiente, que flagrou motoristas de caminhão na região de Belo Horizonte, divisa com Sabará, fazendo o carregamento de minério de ferro e terra de forma aparentemente ilegal.

Um representante da Valefort Comércio e Transporte Ltda., alegou que se tratava de obras de terraplanagem para construção de galpões, segundo a PF. Mas um inquérito instaurado em 2020 concluiu que o que ocorria, na verdade, era a exploração de minério feita de maneira irregular, por meio da concessão fraudulenta de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que contou com a interferência de um servidor da AMN quando ocorreu uma liberação de licença.

Uma “Certidão de Dispensa de Licenciamento Ambiental” concedida pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), também é investigada pela PF. Ela foi apresentada durante ação da Polícia Militar de Meio Ambiente sem que houvesse “apresentação de qualquer projeto de terraplanagem”. A empresa Fleurs Global sustentou a tese do mesmo procedimento que foi contestada pela Polícia Federal.

“Pois bem, embora muito sapiente tal “justificativa” apresentada pelos Doutos advogados da FLEURS GLOBAL, a mesma não corresponde à realidade constatada pela perícia no local, conforme já registrado neste relatório, o que nos leva a descartar, pois, que a finalidade da intervenção no local dos fatos fosse de fato ‘terraplenagem’, mas que se tratava, sim, de verdadeira extração mineral. Ademais, também não bate com o constatado na singela Informação de Polícia Judiciária Nº 001/2022, que traz uma fotografia de satélite datada de 17/9/2021 do local dos fatos, ainda sem qualquer galpão ou “pátio logístico”, destacou o relatório da Polícia Federal. Concluído, o inquérito foi enviado ao Ministério Público Federal (MPF).

Foto de Projeto Manuelzão

A perícia da PF achou estranho e indaga a rapidez com que o processo que as mineradoras tiveram acesso as autorizações para iniciarem suas operações na região da Serra do Curral: “Os tempos observados entre o requerimento de lavra e a concessão de lavra ou entre [protocolar o pedido para] a licença ambiental e a concessão de lavra, outorgada pela ANM [Agência Nacional de Mineração], foram menores do que aqueles observados para projetos similares, muito deste resultado alcançado em razão da inobservância das práticas ambientais consagradas no setor mineral”, diz o laudo da PF.

A Polícia Federal iniciou as investigações em 2020 e o laudo técnico-científico é de maio de 2022. A mineradora Gute Sicht acumulada R$ 6,5 milhões em multas ambientais aplicadas pela Prefeitura de Belo Horizonte. Apesar da Serra do Curral já estar em parte sob proteção ambiental, inclusive com a criação de parques, ainda há propriedades de mineradoras no local. As mineradoras Gute Sicht e Fleurs operam na região a partir de Termos de Ajustamento de Conduta fechados com o Estado.

Quem são os donos

Segundo a entidade Lei.A, o grupo Fleurs é composto por muitos nomes: Fleurs Participações Ltda; Fleurs Gestão Ambiental, Global Mineração e Logística, Fleurs International Gmbh, dentre outros. Na Grande Belo Horizonte, ele se apresenta com o nome fantasia de Fleurs Gestão de Resíduos. Entre os proprietários que aparecem como sócios no grupo de empresas estão Alan Cavalcante do Nascimento, que parece ser um dos responsáveis pelo funcionamento empreendimento instalado na Serra do Curral, e José Antônio Silva, que é também um dos donos da Mineração Gute Sicht empresa acusada pela Polícia Federal de atuar em conluio com a Fleurs, ao fornecer minério extraído ilegalmente, para se beneficiarem financeiramente.

Além deles, outro nomes que aparecem no comando do grupo são o do indiano Prashanth Balaji e do brasileiro Marcelo José Wesseling. O primeiro seria o fundador e gerente da empresa. Ele é apresentado como herdeiro de uma família de proprietários de minas no sul da Índia. Já Wesseling, cujo nome aparece também como proprietário da empresa, está registrado também como responsável pela Bracquisitions Gmbh, uma empresa com sede na Alemanha e escritórios no Brasil, que atua na área de venda de diferentes recursos naturais brasileiros, como áreas de floresta, usinas hidrelétricas e de etanol, e minas de ouro. Uma mina de ouro no Amapá, por exemplo, demandaria ao possível comprador, segundo o site da Bracquisitions Gmbh, um investimento de 35 milhões de dólares. Já uma usina hidrelétrica é vendida por eles ao preço de 780 milhões de dólares.