Desigualdades dificultam enfrentamento à Aids no mundo, alerta Unaids  

Brasil encara, ainda, o descaso de Bolsonaro: cortes na saúde retiraram R$ 407 milhões para 2023 voltados à Aids, infecções sexualmente transmissíveis e hepatites virais

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Uma das faces mais perversas das múltiplas desigualdades está na vulnerabilidade de determinados segmentos populacionais aos mais variados problemas relacionados à saúde. Às vésperas do 1º de dezembro, Dia Mundial da Aids, o Programa das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) divulgou o relatório “Desigualdades Perigosas”, no qual mostra como questões de gênero, racismo e até mesmo a falta de tratamento para crianças têm impactado na meta de acabar com a pandemia dessa doença até 2030. 

Segundo a Unaids, entre 2010 e 2020, houve uma queda de 10,6% na proporção de óbitos de pessoas brancas, mas entre pessoas negras esta taxa cresceu 10,4%. Já as crianças, apesar de representarem apenas 4% de todas as pessoas vivendo com HIV, em 2021 foram 15% das mortes relacionadas à doença.

No caso do Brasil, a situação é semelhante na população negra. Considerando os casos notificados entre 2010 e 2020, houve queda de 9,8% na proporção de casos entre pessoas brancas. “Entretanto, no mesmo período, a proporção entre pessoas negras foi na direção oposta, com um aumento de 12,9%. No caso dos óbitos causados por doenças decorrentes da Aids, a mesma desproporção existe. Entre 2010 e 2020 houve uma queda de 10,6% na proporção de óbitos de pessoas brancas e o crescimento de 10,4% entre pessoas negras”, diz a Unaids.

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Gênero

Outro ponto preocupante diz respeito à questão de gênero. Segundo a  diretora executiva do programa, Winnie Byanyima, é preciso “abordar a intersecção de desigualdades que as mulheres enfrentam. Em regiões com alta incidência de HIV, as mulheres submetidas à violência por parte de seu parceiro enfrentam uma chance 50% maior de serem infectadas pelo HIV. Em 33 países, de 2015 a 2021, apenas 41% das mulheres casadas, com idades entre 15 e 24 anos, podiam tomar suas próprias decisões sobre saúde sexual. A única forma eficaz de acabar com a Aids, alcançar as metas de desenvolvimento sustentável e garantir saúde, direitos e prosperidade compartilhada passa por uma abordagem feminista”. 

No Brasil, a estimativa de 2021 do Ministério da Saúde aponta para a existência de 960 mil pessoas vivendo com HIV, das quais 350 mil são mulheres. A faixa etária com maior incidência geral está entre os 25 e os 39 anos, na qual 51,7% dos casos do sexo masculino e 47,4% dos casos são do sexo feminino.

Outra informação significativa trazida pelo relatório, destaca a Unaids, diz respeito a como a resposta ao HIV e à Aids está sendo atrasada globalmente pelas desigualdades no acesso ao tratamento entre adultos e crianças. 

“Enquanto mais de três quartos dos adultos vivendo com HIV estão em terapia antirretroviral, apenas pouco mais da metade das crianças na mesma situação tomam os medicamentos que salvam vidas. As consequências são mortais. Em 2021, as crianças representavam apenas 4% de todas as pessoas vivendo com HIV, mas foram afetadas por 15% de todas as mortes relacionadas à Aids. Fechar a lacuna de tratamento do HIV e AIDS das crianças salvará vidas”, aponta. 

Descaso de Bolsonaro

O Brasil, que já foi referência no tratamento da Aids, hoje patina diante do descaso do governo Bolsonaro. Os sucessivos cortes na saúde impactam diretamente no enfrentamento à doença, limitando ações importantes. 

O corte de R$ 3,3 bilhões na pasta anunciados em outubro atingiu ao menos 12 programas da pasta, entre eles o que distribui medicamentos para tratamento de Aids, infecções sexualmente transmissíveis e hepatites virais. “Somente nesta frente, o ministério perdeu R$407 milhões, quando comparados aos orçamentos propostos para 2022”, explica Harley Henriques, fundador e coordenador-geral do Fundo Positivo, em artigo no site CNN Brasil.

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Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, Mário Scheffer, professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, e Caio Rosenthal, médico infectologista, apontam que “os ministros da Saúde de Bolsonaro tinham total conhecimento do alarmante aumento do HIV entre jovens de 15 a 24 anos e gestantes, mas nada fizeram. Abandonaram as campanhas de prevenção e permitiram o desabastecimento de testes rápidos para HIV e sífilis”. 

Além disso, destacam, “por quatro anos, negligenciaram as populações desproporcionalmente afetadas pela Aids, que enfrentam barreiras para acessar serviços de saúde, prevenção e cuidados, sendo o estigma a maior delas”.