Paraguai precisa superar agroexportação

Para Raul Monte Domecq, desafio do novo governo a ser eleito em abril de 2023 é implementar uma agenda que promova o desenvolvimento nacional sustentável

O economista Raul Monte Domecq

O economista paraguaio Raul Monte Domecq, em entrevista exclusiva, defende que a realização das eleições presidenciais e parlamentares, em 30 de abril do próximo ano, será uma excelente oportunidade para popularizar o debate sobre a construção de um novo modelo econômico para o Paraguai, que seja inclusivo. Esta é uma preocupação do estudo “Agenda 2030 – Olhares da Sociedade Civil sobre as metas do Desenvolvimento Sustentável”, elaborado pela Associação de Organizações Não-governamentais (ONGs) do Paraguai (Pojoaju), citado por ele.

Segundo Raul, que defende as candidaturas do ex-chanceler Euclides Acevedo, do Movimento Nova República, e do senador Jorge Querey, da Frente Guasú, à presidência e à vice-presidência, “o levantamento, realizado com profundidade, apontou a necessidade de romper com o modelo neoliberal vigente, que só perpetua a dependência e enriquece uma pequena oligarquia”.

“Precisamos de um governo que combata de frente o modelo primário agroexportador, a enorme informalidade, a evasão fiscal e realize uma reforma tributária que contemple as necessidades do país. Infelizmente, com a lógica neoliberal, mantivemos o Paraguai estagnado, sem investimentos para um desenvolvimento sustentável e submetido à camisa de força da concentração da renda e perpetuação da pobreza, enquanto elevava o endividamento em 144% nos últimos sete anos”, afirmou o economista Raul Monte Domecq, em entrevista exclusiva.

Assessor econômico das centrais sindicais do Paraguai, Raul avalia que o estudo apresentado pelas ONGs reconhece dois elementos, “tanto remotos, quanto recentes” para tanta desigualdade, pobreza e fome: “a alta concentração de terras produtivas e a alta concentração de renda nas mãos de uma pequena casta”.

“Um dos principais fatores determinantes de caráter estrutural que perpetua a pobreza e a miséria é o modelo econômico primário agroexportador que o Paraguai mantém há décadas e cujos efeitos colaterais afligem a grande maioria da população”, concluiu.

Tamanho da fome e da miséria

No país em que a política é subordinada à economia da agroexportação de carnes e grãos – fundamentalmente soja (81%), milho (7%) e trigo (6%) –, a fome é uma verdade nua e crua no campo e na cidade, constata o economista com formação em sociologia, membro da Pojoaju, ex-diretor geral da Unidade de Departamentos e Municípios do Ministério da Fazenda do Paraguai e ex-diretor de Planificação Econômica de Assunção.

Em 2020, 279.609 homens, mulheres, crianças e idosos – 3,9% dos 7.153.948 habitantes do país – viviam abaixo até mesmo dos limites da extrema pobreza, “pessoas que sobreviviam em domicílios cuja renda per capita era inferior ao custo de uma cesta básica”, declarou Raul.

Pelo levantamento, que contou com estudos produzidos pelas ONGs associadas e vinculadas à Pojoaju, três em cada 10 pessoas se encontravam em situação de pobreza total (26,9%), um aumento em relação aos 23,5% registrados em 2019. “Isso significa que 264.590 pessoas entraram em situação de pobreza em 2020. Por sua vez, a incidência foi maior no setor urbano, com registro de 247.454 pessoas, enquanto no rural foi de 17.136 pessoas”, acrescentou.

Na definição do Instituto Nacional de Estatística (INE), explica, no Paraguai a pobreza extrema se refere ao conjunto de pessoas que vive em lugares cuja renda per capita é inferior ao custo de uma Cesta Básica de Alimentos. Para se ter a dimensão da tragédia em números, o custo mensal por pessoa desta cesta ou linha de pobreza extrema na área urbana era de 272.067 guaranis (R$ 190), e para a pobreza total de 712.618 guaranis (R$ 499). Por sua vez, na área rural, a linha de extrema pobreza equivalia a 248.461 guaranis (R$ 174) e a linha de pobreza total de 506.201 guaranis (R$ 354) por mês por pessoa.

Por não ter acesso nem mesmo à cesta básica, alertou o economista, essas pessoas sofrem a deterioração de suas vidas, com grave risco de desnutrição e o desenvolvimento de inúmeras doenças evitáveis, principalmente as crianças, “o que reforça a necessidade de políticas preventivas urgentes e direcionadas pelo Estado”.

(com edição de Cezar Xavier)

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