Colaborador de Assange, ativista em segurança digital Ola Bini é inocentado

Após quatro anos de assédio judicial, especialista em segurança digital é inocentado no Equador, numa decisão importante contra a criminalização desse tipo de ativismo.

Ola Bini foi declarado inocente em 31 de janeiro. Foto: Free Ola Bini

O ativista em segurança digital Ola Bini foi considerado inocente pelo judiciário do Equador nesta terça-feira (31) à noite. A decisão foi unânime, em primeira instância, e reduz a ameaça de prisão de 3 a 5 anos para o programador sueco que é amigo e colaborador do jornalista Julian Assange. Ainda há possibilidade de recurso da Procuradoria local. 

Carlos Soria, membro da equipe jurídica de Bini, classificou o veredicto unânime do tribunal como “inesperado” e uma “muito boa surpresa”, considerando todas as irregularidades, mais de 100 violações do devido processo e julgamentos ao longo dos quase quatro anos desde que Bini foi preso pela primeira vez. A promotoria declarou que entrará com recurso, e Soria disse que a equipe jurídica de Ola Bini estará se preparando para isso.

“Bini não pôde deixar este país pelo processo judicial aberto contra ele”, criticou Soria, referindo-se aos quatro anos de adiamentos. Ele argumenta que a justiça equatoriana cometeu mais de 100 violações dos direitos de seu cliente durante esse processo.

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Ola Bini considerou a decisão judicial uma vitória fantástica e também destacou que ajudou a tornar o Equador um lugar mais seguro para os especialistas em segurança cibernética trabalharem.

Alinhamento com EUA

Assim que assumiu o governo, o presidente equatoriano Lenín Moreno foi responsável por revogar o asilo de Assange na embaixada do Equador em Londres, o que abriu caminho para a detenção do jornalista na capital britânica e, consequentemente, sua possível extradição aos EUA. Assange está na prisão de segurança máxima de Belmarsh, em Londres, e o Reino Unido autorizou sua extradição para os Estados Unidos, onde pode ser condenado a até 175 anos. A Casa Branca usa lei contra a espionagem da Primeira Guerra Mundial para processar o jornalista pela publicação de documentos e informações sigilosos que revelam crimes de guerra dos Estados Unidos em suas invasões no Iraque e no Afeganistão.

Bini foi preso em 2019 logo após Assange, do WikiLeaks, ser detido em Londres. O programador foi detido de maneira provisória, sem que nenhuma acusação formal tivesse sido apresentada. Moreno chegou a fazer acusações sem provas contra ele.

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Depois, se tornou réu de uma acusação de “acesso não consentido a um sistema informático”. A acusação alega que Bini utilizava o Tor, um navegador que protege a identidade do usuário e é comumente utilizado por defensores dos direitos humanos e jornalistas. Mas não conseguiu provar que ele tenha cometido qualquer crime com este recurso.

Durante o julgamento, organizações de direitos digitais, como Access Now, Article 19 e Electronic Frontier Foundation (EFF), registraram as inúmeras violações processuais e conduziram uma campanha internacional em solidariedade a Ola Bini.

Criminalização do ativismo digital

A decisão é considerada um marco na defesa da segurança digital e dos direitos humanos, pois confirma que o trabalho de ativistas como ele não deve ser criminalizado, especialmente quando não há argumentos técnicos sólidos.

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Bini disse que essa decisão é a primeira vez que uma corte do Equador tratou sobre o assunto do acesso a um sistema informático, ou um sistema de telecomunicações. O judiciário do país declara, com isso, que chegar até a página que pede uma senha ou um nome de usuário não é acessar essa página de uma maneira ilegal. “Isso é algo muito importante, porque é parte de como especialistas em segurança digital precisam trabalhar para proteger a segurança do nosso país e nosso povo”, disse ele, após a decisão judicial.

Lawfare, a perseguição judicial

Após 70 dias preso, Bini foi solto com habeas corpus, mas sofreu medidas cautelares, como o congelamento de suas contas bancárias e a proibição de deixar o país. As medidas foram derrubadas pela decisão judicial que o inocentou.

Relatório da ONG Acess Now, construído com base em pesquisa da Universidade de Harvard, aponta que Bini foi alvo de assédio judicial e perseguido sem provas de qualquer crime. A Anistia Internacional afirma que encontrou, durante o processo, violações “que podem significar que o caso contra Ola Bini é injusto” e pedia que o estado equatoriano parasse de “intimidar” seus advogados.

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Houve diversos adiamentos e negligências por parte de juízes que participaram do caso, devido a enorme pressão política. O jornalista equatoriano Diego Cazar Baquero, autor do livro “Colateral’, sobre o caso, diz que o judiciário reconheceu que “alargou etapas e processos de maneira irresponsável e com o custo de muito dinheiro público”.

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