Acampamento Terra Livre aguarda anúncio de demarcações por Lula

Também há demanda contra o Marco Temporal no Judiciário e projetos de lei com retrocessos no Legislativo. Lula deve anunciar terras na sexta-feira (28)

Brasília (DF) 24/04/2023 Sessão solene em homenagem ao acampamento Terra Livre. Ministra Sonia Guajajara, Deputada Célia Xakriabá, Cacique Raoni, DJ Alok e lideranças indígenas. Foto Lula Marques/ Agência Brasil.

A 19ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL 2023) é considerada a maior mobilização indígena do Brasil. O encontro ocorre desde a segunda-feira (24) até sexta-feira (28), em Brasília, com a expectativa de reunir cerca de 6 mil pessoas, segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). 

A edição deste ano do ATL tem como tema “O futuro indígena é hoje. Sem demarcação, não há democracia!”. Assim, o evento reforça a necessidade da criação de novos espaços territoriais destinados ao usufruto exclusivo indígena e a garantia de proteção das áreas já homologadas. 

O acampamento revela que a principal demanda do movimento indígena é a questão da territorialidade. A demarcação, o reconhecimento das terras e o respeito ao modo de vida que querem ter em seus territórios é reafirmado nesta mobilização.

Mas o encontro é também a oportunidade de fortalecer a cultura e os laços entre esses povos, especialmente na juventude indígena. O aculturamento, especialmente entre os mais jovens, é considerado uma violência da pressão sobre os territórios. 

Muitos jovens também passaram pela miscigenação que causa a perda da identidade étnica. Muitos no acampamento resistem a este processo buscando resgatar suas raízes indígenas, mesmo sem saber sua etnia de origem. Essas pessoas também são impedidas de participarem de demandas indígenas ao Estado brasileiro, por serem consideradas impuras etnicamente. O ATL também cumpre o papel de uma grande comunhão para a cura dessas dores da violência colonial.

Brasília 23/04/2023 (DF) – Povos de vária etnias chegando para o Acampamento Terra Livre 2023 na Esplanada dos Ministérios. Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Visita de Lula

Presente no evento, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, destacou na terça (25), que a pasta encaminhou 14 terras indígenas para demarcação do governo federal. São territórios de oito estados (AC, AM, BA, CE, MT, PB, RS e SC), que já tinham a maior parte do processo adiantado, mas estavam travados pelo governo anterior.

A expectativa é que o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva anuncie o reconhecimento federal das novas áreas nesta sexta-feira (28), durante sua visita ao Acampamento. A ministra informou que esteve na Casa Civil “para tratar dos atos que vamos assinar aqui [no ATL], no dia 28, com o presidente Lula”.

Ao anunciar o mote do ATL, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que está à frente da organização do evento, destacou que, atualmente, mais de 200 terras indígenas estão na fila da demarcação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

Ao todo, 13 territórios estão com o processo em andamento, com a homologação a ser feita. Até o momento, cerca de 600 foram regularizadas. 

Brasília (DF) 24/04/2023 Sessão solene em homenagem ao acampamento Terra Livre. Ministra Sonia Guajajara, Deputada CÉLIA XAKRIABÁ, Cacique Raoni, DJ Alok e outras lideranças indígenas. Foto Lula Marques/ Agência Brasil.

Três Poderes

Já na tarde da segunda-feira (24), centenas de indígenas de diferentes etnias marcharam pela Esplanada dos Ministérios até o Congresso Nacional, com faixas e cartazes contrários ao que classificam como projetos de lei anti-indígenas, a exemplo do PL 191, que, se aprovado, autoriza a mineração em territórios indígenas reconhecidos.

Nos quatro anos do governo Bolsonaro, houve um retrocesso de direitos. Os territórios sendo invadidos por pistoleiros, jagunços, onde há uma área de retomada. No entanto, o atual governo garantiu a conquista histórica de um Ministério voltado às demandas dos povos indígenas.

Há demandas para os três poderes, embora as demarcações sejam expectativas voltadas para o Poder Executivo. A ideia é que o governo destrave os processos demarcatórios e que a Constituição seja cumprida, garantindo o direito aos territórios tradicionais. 

A presença de representantes do movimento indígena no governo, como a ministra Sonia Guajajara e a presidenta da Funai, Joenia Wapichana, potencializa as expectativas das comunidades em relação à concretização das demandas.

Além disso, há reivindicações endereçadas ao Poder Judiciário, como a recusa ao chamado Marco Temporal, e ao Poder Legislativo, onde estão tramitando vários projetos de lei que afetam os direitos desses povos indígenas.

O atendimento a muitas das demandas esbarram na questão da institucionalidade e os processos estão sendo revistos a fim de evitar embaraços, mas há expectativa de que haja algum anúncio importante durante o acampamento.

Brasília 23/04/2023 (DF) – A Ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, visita o Acampamento Terra Livre 2023 na Esplanada dos Ministérios. Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Frente Parlamentar Mista 

Já na segunda-feira, também, lideranças indígenas, deputados, senadores e integrantes de organizações não governamentais participaram, na Câmara dos Deputados, da cerimônia de instalação da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas. 

Anunciada oficialmente no último dia 8, a iniciativa reúne parlamentares ligados à questão indígena e busca promover e defender os direitos dos membros das 305 etnias identificadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Censo Demográfico realizado em 2010.

A frente é coordenada pela deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG), e no Senado, pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). 

A frente atuará no momento em que os eleitores brasileiros elegeram a maior bancada indígena para uma mesma legislatura (2023/2026), com ao todo de cinco parlamentares que se autodeclaram indígenas.

Brasília (DF) 24/04/2023 Sessão solene em homenagem ao acampamento Terra Livre. Ministra Sonia Guajajara, Deputada CÉLIA XAKRIABÁ, Cacique Raoni, DJ Alok e outras lideranças indígenas. Foto Lula Marques/ Agência Brasil.

Mato Grosso

Este ano conta, também, com uma novidade, que acaba por consolidar ainda mais a força da mobilização nacional: o Acampamento Terra Livre do Mato Grosso. A programação de atividades começou hoje, com concentração no monumento Ulysses Guimarães, próximo a órgãos da administração pública, e vai até a próxima quarta-feira (13), unificando alianças e pleitos de 43 povos que vivem no estado.

O primeiro ATL foi em 2004 e, em 2022, reuniu mais de 8 mil indígenas, provenientes de 100 povos e de todas as regiões do país. Ao longo de dez dias de programação, os participantes aproveitaram a oportunidade para buscar fortalecer candidaturas de lideranças para concorrer a assentos no Congresso Nacional, já que era um ano eleitoral.

O ATL é organizado pela Apib e construído em conjunto com suas sete organizações de base, sendo elas: Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), pela Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul), pela Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste (Arpinsudeste), Comissão Guarani Yvyrupa, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Conselho do Povo Terena e Assembléia Geral do Povo Kaiowá e Guarani (Aty Guasu).

A programação completa do evento pode ser acessada no site oficial do Acampamento Terra Livre.

Autor