49 anos da epopeia da Guerrilha do Araguaia

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Morreram? Quem disse, se vivos estão!
Não morre a semente lançada na terra.
Os frutos virão…
Amanhã – Lila Ripoll

Há exatos 49 anos, frente ao ataque de tropas do exército em busca de “subversivos” na região do Rio Araguaia, no “Bico do Papagaio” – confluência dos Estados do Pará, Goiás e Maranhão – teve início a resistência guerrilheira do Araguaia, que durante três anos resistiu a três campanhas de cerco e aniquilamento das Forças Armadas Brasileiras.

O Brasil vivia um dos períodos mais terríveis da sua história: a oposição fora calada, o Congresso fechado, as eleições suspensas em todos os níveis, as guerrilhas urbanas aniquiladas. Os partidos políticos, os sindicatos, as entidades estudantis e populares se encontravam garroteados. As prisões estavam cheias; generalizavam-se as torturas, os assassinatos, os desaparecimentos, assim como a censura aos meios de comunicação. Milhares de brasileiros viviam no exílio. A euforia com o chamado “milagre econômico” e a conquista da Copa do Mundo anestesiavam amplas parcelas do povo. O regime dos generais parecia invencível e eterno!

Nas selvas do Araguaia, com base na concepção de “Guerra Popular”, desde 1966 dezenas de militantes e dirigentes comunistas – entre eles João Amazonas, Maurício Grabois, Ângelo Arroio, Elza Monnerat, “Osvaldão” e tantos outros – procuravam organizar a luta dos camponeses e posseiros da região, ao mesmo tempo em que se preparavam para a resistência armada caso fossem atacados. Assim, ainda que precariamente armados, refluíram para a mata quando ocorreu a primeira investida militar, formando três destacamentos guerrilheiros.

Estreitamente ligadas ao povo da região – que até hoje relembra os guerrilheiros do Araguaia com imenso carinho – resistiram até o início de l975, enfrentando mais de 10 mil homens do Exército, Marinha e Aeronáutica, assessorados por especialistas estrangeiros, em uma operação bélica que só teve paralelo no envio da Força Expedicionária Brasileira aos campos de batalha da Europa, para combater o nazi-fascismo.

Embora derrotada militarmente, a Guerrilha do Araguaia – “o mais importante movimento armado já ocorrido no Brasil rural” nas palavras do General Hugo Abreu – sagrou-se vitoriosa do ponto de vista político e histórico. Não é mera coincidência que em 1974 – quando a guerrilha ainda se mantinha –, o General Geisel, ditador de plantão, deu início à chamada “abertura lenta e gradual”, tentando arrefecer a oposição ao regime.

Como todos sabemos, o fim da ditadura militar não foi fruto do acaso ou da “bondade” dos generais. Decorreu da resistência do povo brasileiro – desde os primeiros dias após o golpe de 1964 –, que teve na Guerrilha do Araguaia a sua elevada expressão. Após a Guerrilha do Araguaia, a luta do povo brasileiro ganhou mais força e impulso.

A Guerrilha do Araguaia pertence à história. No contexto da ditadura militar, foi uma forma de luta justa e necessária. Ao reverenciá-la, os comunistas não fazem apologia desta ou daquela forma de luta. O povo cria e escolhe o modo de lutar, de acordo com as circunstâncias de cada momento histórico. Hoje a luta em defesa da soberania nacional, da democracia e dos direitos do povo segue sob outras formas, mais adequadas à realidade política do país.

Homenagear os guerrilheiros e as guerrilheiras do Araguaia – entre eles os gaúchos João Carlos Haas Sobrinho, José Humberto Bronca, Paulo Mendes Rodrigues e Cilon Cunha Brum – e de tantos outros patriotas, que tombaram lutando em defesa do nosso povo, significa redobrar nossa luta por um Brasil Democrático e Soberano, que garanta uma vida digna e feliz ao nosso povo.

Concluo com duas estrofes da poesia “Araguaia”, de autoria do amigo e então vereador José Valdir, declamada em 1996, no Paço Municipal de Porto Alegre, por ocasião da cerimônia de assinatura pelo Prefeito Tarso Genro de lei de minha autoria em homenagem aos guerrilheiros caídos no Araguaia:

Araguaia

Vidas, históricas vidas.
Simbólicas vidas
Utopia que o povo reconstrói
Obsessão dos poderosos
Que ainda tramam alucinados
A destruição dos seus registros
A sobremorte
Dos seus heróis

Araguaia!
Nosso Hino ganhou sentido
Teus filhos não fugiram à luta
Nem temeram a morte
Na Lapa e na Mata hostil
Lutando por esta Pátria
Que um dia será mãe gentil
Dos excluídos dos filhos deste solo
Do nosso imenso Brasil!

Parte do cartaz em homenagem aos mortos e desaparecidos na Guerrilha do Araguaia – Reprodução

Canção das Forças Guerrilheiras do Araguaia

Não somos do norte,
nem somos do sul.
Nossa geografia
é um sopro de liberdade.
O verde invadiu nossos olhos.
Verde a floresta
e verde a nossa certeza
nos novos frutos da terra.
Decerto que há fuzis
muitos mortos, muitos nossos
há os do ofício do não
entre o povo e a madrugada.
Decerto que há um muro de homens
verdes (verde-velho, verde-lodo)
entre nós – entre o povo –
e a madrugada.
Mas (antes de tudo)
é preciso que se faça o dia
e se as nossas águas, nosso fogo
vão dar no dia
que noite nos deterá?
Decerto não fizesse escuro
deitaríamos os fuzis no
leito do Araguaia
e passaríamos a cantar
uma flor, uma floresta: esta.
Mas que flor de mais cantigas
que a liberdade buscada?
Não somos do norte
Nem somos do sul.
Nossa geografia
São as pétalas da madrugada.

Araguaia – Foto: Acervo

Osvaldo da Costa (Osvaldão)

Foi dos primeiros a chegar à região do Araguaia, por volta de 1966/67.

Entrou na mata como garimpeiro e caçador.

Era o maior conhecedor de toda a região, tanto da guerrilha como das áreas circunvizinhas.

No ano de 1969, fixou sua residência às margens do rio Gameleira.

Foi o Comandante do “Destacamento B”, onde participou exitosamente de vários combates.

Era, ao lado de Dina, o mais conhecido combatente entre a população do Araguaia.

Estava entre os combatentes que foram atacados por grande contingente das Forças Armadas em 25 de dezembro de 1973.

Está desaparecido desde meados de 1974.

Osvaldão
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