A “tempestade” temida por Guedes e Bolsonaro é outra

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Quando assumiu o mandato de presidente da República há exatos um ano e quatro meses, Bolsonaro não tinha a menor noção do que teria pela frente, por uma razão muito simples: sua eleição foi uma eleição sem noção, fruto do esgotamento das forças e dos projetos hegemônicos até então.

Imaginou o “mito” que seria um passeio, mas foi logo sendo enquadrado pelo grande capital financeiro que escalou Guedes para fazer o jogo do “mercado”, não para potencializá-lo, é claro, mas para adestrá-lo aos interesses mesquinhos e apodrecidos da banca.

Em pouco mais de um ano, rasgaram direitos sociais históricos como os inscritos na seguridade social e aceleraram o desmonte trabalhista iniciado por Temer.

Turbinaram a PEC da morte e estrangularam gastos e investimentos públicos. Investimentos, apenas os privados, silenciosos até hoje.

Tentaram e quase deram, não fosse a reação social, um tiro de morte na educação, na universidade pública, na cultura, na ciência e na tecnologia, que sobreviveram sabe Deus como.

Ensaiaram várias privatizações, inclusive a da estratégica Eletrobrás.

Deram continuidade à corrosão pelas bordas para enfraquecer a Petrobrás.

Facilitaram o jogo sujo para que a Boeing se apoderasse da Embraer, contrato recentemente rescindido pela megacorporação norte-americana diante da crise que bateu forte nos seus calcanhares.

Deixaram o câmbio solto para facilitar as importações de produtos e serviços de alto valor agregado e estimularam a reprimarização da economia.

Prosseguiram, avassaladoramente, o processo de encampação de empresas brasileiras por estrangeiras.

Atrelaram escandalosamente a política externa aos interesses decadentes dos EUA e deram uma banana para parceiros históricos e estratégicos, como a China, a Argentina e o mundo árabe.

O resultado não poderia ser outro senão o pibinho de 1% em 2019 e a perspectiva de um encolhimento sem precedentes da economia em 2020, agravado pela crise sanitária.

Mas aí, veio o que não esperavam, o que não estava previsto no calendário governamental: a Covíd-19.

Que ousadia desses comunistas chineses criarem um problema de vulto mundial exatamente no momento em que o Messias cumpria seu primeiro ano de governo…

Não, aqui será diferente, nosso povo, acostumado a nadar nos esgotos a céu aberto nas vilas, mocambos, favelas e palafitas, em meio às temperaturas elevadas, não será atingido por uma “gripezinha” qualquer chamada coronavírus.

O tempo passou e, hoje, Bolsonaro foi praticar tiro ao alvo quando jornais e telejornais matutinos informavam que a vida de mais brasileiros foi tragada pelo vírus. O contágio já bate à casa dos 80 mil e os mortos 5.446 em dados de hoje (29), letalidade que supera a da China por onde a epidemia começou.

Wanderson de Oliveira, secretário de Vigilância em Saúde, que também integrava a equipe do ministro Mandetta, afirmou que o período de maior força de vírus respiratórios se dá pela 20ª semana de disseminação e que o Brasil passa, agora, pela 18ª semana desde que foram iniciados os boletins a respeito da Covid-19 no país.

Disse, peremptoriamente, diante de um “novo” ministro perdido em meio à pandemia, que “estamos na semana epidemiológica de número 18. O período de maior incidência de vírus respiratórios ocorre em torno da 20ª, 22ª, 27ª semana. Em alguns anos ela se antecipa, em outros isso é prorrogado”.

O alerta entra por um e sai pelo outro ouvido do Messias que se adiantou, é ele próprio, mas “não faz milagres”.

Qual a razão para se preocupar com o coronavírus, não é mesmo, se vão morrer mesmo… “E daí…”, resumiu, diante do genocídio em massa que acontece diante de seus olhos.

Enquanto isso, estados fazem um esforço monumental, em que pese o boicote de Guedes à ajuda já aprovada pelos deputados federais e o estímulo bolsonarista ao fim do distanciamento social, para preparar as redes de saúde e ampliar as testagens na fase mais aguda da crise.

 Já não contam com Guedes, ocupado que está em chantagear os senadores a aprovar um plano de socorro a entes federados, sem consistência no conteúdo e nos prazos, sob a condição de contrapartidas como o congelamento dos salários já exauridos dos servidores públicos.

 Afinal, ainda anteontem (28), foi confirmado pelo chefe que representa o “norte” da economia e que o plano Pró-Brasil, apresentado pelos militares, não passa de uma ficção que deve ficar subordinada aos caprichos dos garotos de Chicago comandados por Guedes.

O “teto de gastos”, a “âncora fiscal”, deve ser protegido a qualquer custo, mesmo que continuem faltando respiradores, ventiladores, leitos de UTIs e ambulâncias para os brasileiros que morrem todos os dias nos hospitais ou em casa por falta deles.

Qual a razão para se preocupar com o coronavírus, não é mesmo Messias, se vão morrer mesmo… “E daí…”, resumiu, diante do genocídio em massa que acontece diante de seus olhos.

“Por que mexer no teto se é ele que nos protege de uma tempestade?”, afirmou o ministro renomeado depois da coletiva do general Braga Netto.

O orçamento do governo federal aprovado para 2020 e que já está sendo executado foi de 3,6 trilhões de reais. Para o refinanciamento da dívida pública federal reservou-se a bagatela R$ 917,1 bilhões dos cofres públicos, ou seja, 25%, ou 1/4, o que significa dizer que a União gasta, todos os meses, algo em torno de R$ 76 bilhões.

Mas, para Guedes, o correto é o que consta na lei. Está disposto até a fazer algumas concessões diante do estado de calamidade pública e do “orçamento de guerra” aprovados pelo Congresso Nacional, mas o “teto” não pode nem deve mexer nos encargos financeiros, afinal os bancos, rentistas, fundos de investimento (ou de especulação) estão em dificuldades…

O “teto” vale para salário de servidor, saúde, educação, obras, e ponto final, não se fala mais nisso.

É o hegemonismo do capital financeiro em sua fase mais decrépita, materializada em uma política econômica criminosa que mata silenciosamente e, agora, estrondosamente, em razão do coronavírus.

Trata-se, no plano ideológico, da “seleção natural” historicamente defendida e executada pelas correntes nazifascistas. 

O quadro político mudou e ganha uma nova qualidade.

A tempestade temida por Guedes, agora, é outra e chega forte sobre o núcleo que o sustenta politicamente por conta dos ventos soprados fortemente pela sociedade, o meio político e o Supremo. Uma tempestade que haverá de varrer, além do “teto”, a tragédia política que se abateu sobre o país desde janeiro de 2019.

Que o faça o mais rapidamente possível, pois o que está sob ameaça, todos os dias, é a vida de milhões de brasileiros.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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