A turbulência nas hostes bolsonaristas está apenas começando

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(Foto: Adriano Machado/Reuters)

A saída de Moro do Ministério da Justiça, nas condições em que foi demitido, abalou fortemente o chamado mercado financeiro. 

No último dia útil da semana passada, após atingir a máxima de 9,54%, o Ibovespa encerrou o dia com forte baixa de 5,45% e o dólar chegou a atingir R$ 5,73. Nas casas de câmbio, a moeda norte-americana era negociada próximo dos R$ 6,00.

Bolsonaro foi ágil no gatilho e chamou uma reunião ministerial hoje (27) pela manhã, após a qual deu o recado: o “homem que decide a economia do Brasil é um só: Paulo Guedes. Ele nos dá o norte“. 

Realmente, foi sob a bússula de Guedes que conquistamos a proeza de um pibinho de 1% em 2019 e, ao que tudo indica, na atual situação agravada pelo coronavírus, poderemos bater o recorde no encolhimento da economia nacional. As projeções mais otimistas indicam que o PIB poderá encolher até 3%. 

Nem mesmo a mais grave crise sanitária de nossa história alterou minimamente o comportamento do ministro da Economia e seus garotos de Chicago. 

A ordem é manter o figurino monetário-fiscalista que estava em curso antes da decretação do estado de calamidade pelo Congresso Nacional, mesmo com a pandemia. 

A ordem, ainda que dissimulada, é estrangular o auxílio emergencial aprovado para os pobres, dificultar ao máximo os empréstimos dos bancos ao setor produtivo (mesmo depois do BC autorizar uma liquidez trilionária e reduzir os depósitos compulsórios), sabotar o apoio aos Estados e municípios e estimular a suspensão dos contratos de trabalho, ou a redução da jornada e a respectiva queda na renda dos trabalhadores. 

O Ministério da Economia já registrou mais de 3,5 milhões de acordos entre empresas e empregados para reduzir jornada e salário ou suspender contratos durante a crise, com base na abominosa MP 936, uma medida cuja lógica é oposta às ações de solidariedade que deveriam imperar em momento tão dramático. 

A redução das jornadas de trabalho (com redução proporcional no pagamento) por até 90 dias e a suspensão dos contratos por até 60 dias representam, na prática, menos dinheiro no bolso dos trabalhadores, no momento em que mais precisam. 

Esse o norte de Guedes, a quem Bolsonaro fez questão de fortalecer após as especulações de que o titular da Economia teria perdido força diante do anúncio, pelos militares, de um plano, o Pró-Brasil, prevendo investimentos em infraestrutura da ordem de R$ 300 bilhões nos próximos dez anos. 

O programa deixou a equipe de Guedes de cabelo em pé. Afinal, a ordem é cortar gastos, cortar investimentos, cortar salários, cortar jornadas, enfim, cortar tudo que for possível, tudo, em nome da responsabilidade fiscal que nem mesmo os seus autores originais defendem mais, como também economistas da corrente neoliberal que tiveram a honestidade de aprender um pouco com a crise sanitária mundial. 

Entre os militares que o rodeiam e Guedes, Bolsonaro deixou reverberar de forma cristalina sua preferência, o que já era previsível, afinal, o ministro da Economia atua na lógica do chefe, a do boicote às ações governamentais para estimular os que menos podem a pressionar pelo fim do distanciamento social, ainda a arma mais poderosa que temos para salvar vidas. 

E assim Guedes vai tocando a flauta do ultraliberalismo mesmo sob o coronavírus, mesmo diante do escândalo que representou o Estado mínimo para muitos países, destacadamente o Brasil, nos últimos anos. 

Agora mesmo, um estudo do INESC, sob o título “O Brasil com baixaimunidade – Balanço do Orçamento-Geral da União 2019”, mostra que o resultado da política de austeridade, combinada à aprovação da ‘PEC da morte’, que fixou um teto para o crescimento das despesas, resultou em um corte de 28,9% nas despesas discricionárias nas áreas sociais do país. 

Apenas no período entre 2014 e 2018, o corte nos gastos foi de 8,6%”, resultando na penalização dos mais vulneráveis da sociedade, aqueles que a política de Bolsonaro/Guedes quer eliminar (matar, mesmo!) ao estimular a desobediência às normas sanitárias, associada ao boicote às diversas modalidades de auxílio emergencial.  

A área da saúde, segundo o estudo, foi uma das mais atingidas com a manutenção do nefasto processo de subfinanciamento do SUS. O resultado dramático está aí diante dos efeitos do coronavírus.  “Com o orçamento congelado por 20 anos, o prejuízo ao SUS pode ultrapassar R$ 400 bilhões”, alerta o INESC. 

Nada disso sensibiliza Bolsonaro e Guedes. Preferem apostar no caos, enquanto os poderosos de sempre do setor financeiro ganham com a crise. 

Apenas isso seria suficiente para caracterizar um crime de responsabilidade do chefe do Executivo. 

Todavia, há outros sobre os quais o Supremo está se debruçando, como também uma provável CPI no Congresso Nacional se debruçará. 

A turbulência nas hostes bolsonaristas está apenas começando…

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