Alegria e drama no São João digital

Feliz um povo que apesar das dificuldades mantém sua tradição cultural e consegue experimentar instantes de alegria!

Bandeirinhas de São João, por Alfredo Volpi

A parte Nordeste do país costuma celebrar o São João com festejos de dimensão igual ou superior ao carnaval.

Em Pernambuco, nos bairros populares do Recife e da Região Metropolitana e nas cidades interioranas, milhares são as ruas onde se queimam fogueiras e se organizam “palhoções“, em que se dança, se bebe e se festeja com parentes, amigos e vizinhos.

Para alegria de todos e para o aquecimento da economia.

Este São João em tempo de pandemia está acontecendo quase exclusivamente na realidade virtual. Parte da minha família mesmo, que sempre organizou a festa com fogueira, quadrilha improvisada, cachaça e forró — tradição iniciada por dona Maria, minha sogra, que se viva estivesse teria feito ontem 103 anos de idade —, desta vez teve que transbordar a alegria através de videoconferência. 

Não deixa de ser uma forma criativa de contornar dificuldades, assim como as inúmeras “lives” protagonizadas por cantores e bandas, vistas na telinha dos smartphones. 

Porém nada pode evitar prejuízos da ordem de 1 bilhão de reais, considerando as principais festas de rua em Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Bahia. Maior se ainda se acrescentarmos toda a microeconomia que gira na região.

Brutal queda na arrecada prevista de ICMS. Aguçamento das dificuldades fiscais de governos estaduais e prefeituras.

Acrescente-se a previsão do Banco Mundial de uma retração do PIB brasileiro este ano da ordem 8% — a pior marca em 150 anos, desde quando se considera registros oficiais passíveis de análise.

Aos novos governantes de nossos municípios, que tomarão posse em janeiro, o dever de terem debaixo do braço dois planos: um emergencial, para os primeiros meses de governo; e outro para os quatro anos de mandato, sob condições que na esperança de cada um sejam menos agravadas do que a no início. 

Apesar de tudo, quase totalmente pelas redes e não nas ruas, e sob a terrível ameaça da Covid-19, não se deixa de dar vivas a São João.

Hoje cedo, uma amiga se queixou pelo WhatsApp: “Ficarei ausente das redes. Não posso me sentir mal por ver todos em festa como se nada estivesse acontecendo…”. Ao que respondi: “Não veja por esse ângulo. Feliz um povo que apesar das dificuldades mantém sua tradição cultural e consegue experimentar instantes de alegria!”

Celebremos por todos os que resistem e pelos que já se foram, e que homenageamos – como nos versos de Manuel Bandeira: “Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo/Minha avó/Meu avô/Totônio Rodrigues/Tomásia/Rosa/Onde estão todos eles?/– Estão todos dormindo/Estão todos deitados/Dormindo. Profundamente.”

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