As eleições para o governo de São Paulo e a Educação

Qualquer que seja o plano de governo para a Educação, este deve ter como eixo central a questão do ensino

Foto: Governo de SP
  • Ismália
  • Quando Ismália enlouqueceu,
  • Pôs-se na torre a sonhar…
  • Viu uma lua no céu,
  • Viu outra lua no mar.
  • No sonho em que se perdeu,
  • Banhou-se toda em luar…
  • Queria subir ao céu,
  • Queria descer ao mar…
  • E, no desvario seu,
  • Na torre pôs-se a cantar…
  • Estava perto do céu,
  • Estava longe do mar…
  • E como um anjo pendeu
  • As asas para voar…
  • Queria a lua do céu,
  • Queria a lua do mar…
  • As asas que Deus lhe deu
  • Ruflaram de par em par…
  • Sua alma subiu ao céu,
  • Seu corpo desceu ao mar…
  • GUIMARÃES, Alphonsus de. Obra Completa. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1960, p. 231-232.

Pronto! A colunista enlouqueceu igual a Ismália, inicia o título do artigo dizendo que vai falar de eleições e educação e me bota um poema de Alphonsus de Guimarães.

Mas vou tentar me explicar. Desde a semana passada procuro as propostas dos candidatos ao governo do Estado de São Paulo para a Educação, não encontrei! O que encontrei foram entrevistas e reportagens sobre o último debate entre os candidatos, em que todos eles apresentam algumas opiniões e propostas. Em um ponto, de uma forma ou de outra, todos convergem: é preciso garantir o direito à educação.

Notem que pontuei a palavra direito. Dante Alighieri dizia: “Direito é a proporção real e pessoal de homem para homem que, conservada, conserva a sociedade e, destruída, a destrói”. Nessa linha de compreensão, o direito seria conceitualmente o que é mais adequado para o indivíduo, tendo presente que, vivendo em sociedade, tal direito deve compreender fundamentalmente o interesse da coletividade.

Pois bem, vamos lá sem mais rodeios. O Brasil vive um verdadeiro apagão educacional. Isso já ocorria desde o golpe de 2016. De lá para cá, com a ajuda da pandemia e do homem insano que ocupa a presidência, o quadro só se agravou.

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É fato que o próximo governador terá um desafio enorme em suas mãos: a questão da Educação. Ninguém em sã consciência é capaz de verbalizar que é contra a educação ou que não investirá em educação. No entanto, tanto no campo da direita como no dos progressistas o discurso ainda é muito vago. Temos várias questões a tratar (investimento, currículo, plano de carreira, gestão democrática, planejamento, concepções pedagógicas, formação de professores etc.), mas tratarei delas nos próximos artigos. Este vou terminar explicando o porquê do poema Ismália de Alphonsus de Guimarães, com o qual fui ter meu primeiro contato no ensino médio. Me lembro como se fosse hoje, a professora Kiki, uma senhora obesa de poucas palavras, mas que demonstrava do jeito dela muito conhecimento, uma autoridade em literatura, entrou na sala, pediu para que abríssemos o livro e começou a leitura. Eu fiquei tão impressionada com aquele poema que reli diversas vezes. Sei de cor até hoje, e muitas vezes me pego recitando, ainda tentando entender Ismália.

Digo isso para que possamos lembrar que, qualquer que seja o plano de governo para a Educação, este deve ter como eixo central a questão do ensino. O ensino é o ponto de chegada e o ponto de partida. Se não fosse a Escola Estadual Oswaldo Catalano e a professora Kiki, talvez eu jamais tivesse tido contato com esse poema. Consequentemente, hoje não saberia o que foi o Simbolismo do século XIX e talvez não gostasse de literatura.

Alguns podem perguntar: “e daí, pra que você usa isso na sua vida hoje?” (os pragmáticos da educação. Isso dará outro artigo). Respondo com José Sérgio de Carvalho, filósofo e professor na USP. Em uma certa palestra ele nos contou que estudou em escola pública na Vila Matilde, zona leste de São Paulo, e que ele odiava as aulas de Educação Física. Para piorar a situação o professor foi ensinar handebol. Mas foi ali que ele percebeu o papel de uma escola verdadeiramente democrática e decidiu que queria ser professor. Segundo ele, a escola serve para oportunizar aos filhos e filhas da classe trabalhadora o que muitas vezes eles não poderão acessar em seus cotidianos, em suas casas. A escola serve para socializar conhecimentos e para que homens e mulheres possuidores destes possam decidir o que farão com eles. E voltando ao meu direito individual, gosto de poesia, e ela me ajuda a compreender os interesses da coletividade.

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