As ocupações vistas de dentro e as lições dos secundaristas

Um dos fatores mais interessantes do ponto de vista social e político que aconteceu (e ainda acontece) ao longo dos últimos três meses sem dúvida tem sido as ocupações estudantis. Com irreverência e muita crítica os estudantes de ensino médio estão dando um banho de cidadania em muito ‘sabe-tudo’ que posa de bom moço, mas que no fundo morre de medo da organização juvenil.

Para conseguir escrever este pequeno texto, fiz questão de visitar algumas ocupações secundaristas em diversas cidades e dormir em algumas para ver de perto como funcionam.

O primeiro e mais fantástico ponto é a politização dos ocupantes. Todos e todas, de maneira geral, sabem muito bem o que estão fazendo nas escolas e porque estão lá. Debates importantes como os motivos de serem contra a PEC 55, a luta feminista, o combate ao racismo, a importância das organizações estudantis e a batalha contra a LGBTfobia fazem parte do cotidiano dos estudantes.

Sem dúvida alguma o presidente ilegítimo Michel Temer tem motivos de sobra para se preocupar, afinal de contas tem muito secundarista ocupando escola que dá um banho de organização e eloquência em muito ministro do seu desgoverno.

O secundo ponto que acho mais curioso se dá na organização e gestão do espaço escolar. Não se vê lixo jogado pelo chão e salas ou ambientes coletivos sujos, cada um tem sua tarefa e a cumpre com a maior boa vontade, sem fazer corpo mole e entendendo que o não cumprimento de sua parte prejudica a todos que ali estão. Destacam-se também os estatutos das ocupações, não permitindo o uso irresponsável do ambiente escolar, como por exemplo, a proibição de bebidas alcoólicas e cigarros lá dentro.

Este segundo ponto é muito interessante de ser pensado, pois é lugar comum escutar de servidores da educação que os alunos pouco valorizam a escola, deixando-a frequentemente suja ou vandalizada. De maneira fascinante, o que se vê é o contrário, com estudantes cuidando uns dos outros e cuidando (muito) da própria instituição que estudam.

O terceiro ponto se dá na clareza objetiva ao enfrentar diretores e professores contrários às ocupações. De maneira geral, o diálogo existe e os secundaristas só partem para o enfrentamento em defesa de seus direitos de protestar quando se esgotam todas as possibilidades de conversa. Sabemos bem que, infelizmente, ouvir alunos e alunas não faz parte do dia a dia de muitos gestores, ver estes sujeitos que nunca dialogam com ninguém serem obrigados a conviver com quem questiona o status quo é de um simbolismo muito importante para o ambiente escolar.

O quarto e mais importante ponto que pretendo abordar é sobre o que estamos aprendendo com os estudantes de ensino médio que ocupam os colégios é a diferença imensa entre qual o tipo de escola que existe hoje e qual o tipo de escola que eles realmente querem.

Fica muito claro que alunos e alunas gostam muito de suas instituições, adoram ir pra lá e conviver com os colegas, o que eles não gostam é da estrutura hierárquica vencida de ensino que temos. Este é o ponto chave! Nas palestras e atividades das ocupações são muito raras as conversas paralelas e gente dispersa. Tal atitude se justifica porque estas oficinas realmente dialogam com o que o corpo discente escolar almeja!

Além do enorme ensino de cidadania e participação popular organizada, creio que a maior lição que as ocupações tem a deixar para o ambiente escolar, independente de se conseguir ou não barrar esta famigerada PEC 55, é a necessária reforma do ensino médio diferente do que Mendoncinha e o MEC propõem. Os alunos sonham sim com um ensino cidadão que os levem a pensarem por si próprios, tenham como compreender e questionar o que assistem na mídia burguesa e, principalmente, consigam entender porque a escola que tem tudo para ser tão legal tem um ensino tão maçante.

Obviamente que o Ministério da Educação não está disposto a nada disso, afinal de contas o desgoverno Temer quer mais que as instituições públicas se danem. Todavia, os professores e diretores que são capazes de compreender a enorme insatisfação de seus alunos e alunas com tudo que estamos vivendo e aprender que é possível sim lutar por nossos direitos de maneira organizada e responsável podem fazer muita diferença no ambiente escolar futuro.

A escola que tivemos não será a mesma que teremos. Aprender com as ocupações para construir junto com toda a comunidade educacional um modelo novo de ensino pode se tornar não somente uma das pautas imediatas do movimento estudantil, mas de todas as agremiações que defendem a educação pública, gratuita, de qualidade e para todos e todas. 

Ver a juventude lutando pra fazer história não tem preço! Vale a pena sonhar, afinal os sonhos não envelhecem!

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