As semelhanças simbióticas entre Durski, Bolsonaro e a MP 927

O conteúdo da MP, o pensamento de Junior Durski (e de Roberto Justus também) e as práticas e posições do PR demonstram que no Brasil não temos uma elite econômica, na concepção substantiva do termo. Temos ricaços, que não admitem, em hipótese alguma, abrir mão de seus seculares privilégios sustentados por um povo majoritariamente pobre, num país riquíssimo. Daí terem apoiado e eleito (a “elite” econômica), o homem errado, na hora errada, para o posto errado!

“O Brasil não pode parar por 5 ou 7 mil mortes”, disse o dono da rede de restaurantes Madero, o empresário Junior Durski, sócio do apresentador global Luciano Huck. Durski pronunciou a frase, nesta segunda-feira (23), num vídeo publicado na sua conta do Instagram. Para o empresário, “pior é o que já acontece no País”. Ele afirmou ainda que os danos econômicos serão maiores do que as mortes que o vírus pode causar.

Pois então! Junior Durski tem a cara e representa fidedignamente as classes dominantes do Brasil. A MP (Medida Provisória) 927, editada no último domingo (22), para reduzir os danos econômicos e sociais causados pela pandemia do coronavírus (Covid-19) no Brasil foi escrita para ele, pelo governo dele. Simbolicamente falando, é claro!

O fetiche do dinheiro e o lucro acima de tudo

Mas Durski não parou por aí. Foi além: “O país não aguenta, não pode parar dessa maneira. As pessoas têm que produzir e trabalhar. Não podemos

por conta de 5 ou 7 mil pessoas que vão morrer. Isso é grave, mas as consequências que vamos ter economicamente no futuro vão ser muito maiores do que as pessoas que vão morrer agora com o coronavírus”.

Este é o pensamento nu e cru das classes dominantes locais. A vida do povo é um mero detalhe. E a morte de 1 ou de milhares, não importa, é apenas dano colateral. O importante, mesmo, é manter a máquina funcionando para não diminuir ou cessar os lucros! Foi isto que Durski e Justus reverberaram. Isto não foi coincidência.

Bolsonaro também pensa assim. Por isso, o presidente minimiza a pandemia o tempo todo. Em sua fala, nesta terça (24), em rede nacional, ele dobrou a aposta. Por essa razão, editou uma MP que protege as empresas, as grandes, em particular. O seu objetivo não é apenas proteger quem o apoiou e o financiou. É não deixar que sejam prejudicados ou que tenham “dano mínimo”, nem que para isso quem tenha que pagar a conta seja o povo em geral e os trabalhadores em particular.

Ao fazer isso, não encara ou vê a empresa na perspectiva do seu papel social, mas sim na visão do lucro, da manutenção do patrimônio dos herdeiros das “sesmarias”, que devem ser mantidos a qualquer custo. É a cara dos ricos brasileiros. Herdeiros do escravismo colonial, que durou 388 anos, e deitou profundas raízes até hoje sentidas, vistas e praticadas na sociedade brasileira.

Ricos, oportunistas e antipovo

A MP, do presidente Bolsonaro, que não nutre nenhuma empatia pelo povo brasileiro, foi elaborada exatamente para atender empresários como Durski e Justus e outros tantos assemelhados, que votaram, apoiaram e agora cobram do governo a fatura. Estão se aproveitando da crise — governo e empresários — para transferir seus prejuízos, quase que integralmente, para a classe trabalhadora brasileira.

Também estão se aproveitando da crise para desmantelar, com a MP 927, os poucos direitos laborais e sociais, que ainda restam, desde o advento do congelamento dos gastos primários (Teto de Gastos – EC 95/16), da Terceirização geral (2017), da Reforma Trabalhista (2017), da Lei da “Liberdade Econômica” (2019), do fim dos ministérios da Previdência (2016) e do Trabalho (2019) e da Reforma da Previdência (EC 103/19).

Ah! Não podemos esquecer! Aproveitaram-se da crise para aprovar, numa comissão esvaziada e a portas fechadas, na terça-feira passada (17), a MP 905, que instituiu o “Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, com menos direitos. Ao mesmo tempo em que deixaram “caducar”, a MP 898/19, que tornava permanente o 13º salário para os beneficiários do Bolsa Família e do BPC (Benefício de Prestação Continuada). A MP perdeu eficácia nesta terça-feira (24). 

Bolsonaro era pobre. Hoje deve estar rico. Era oficial do Exército, média patente (capitão), quando deixou a força. Ele e os filhos, todos “políticos”, têm posses e propriedades. “Conquistaram” essa riqueza, todos, se profissionalizando na política parlamentar. Bolsonaro foi vereador por 2 anos no Rio (1989-1990). Depois foi eleito deputado federal (1990) e seguiu carreira parlamentar até 2018, quando foi eleito presidente da República. Os filhos seguem seu rastro. Mas o presidente não pertence às elites políticas e econômicas do País. Foi aceito nos “salões da corte” porque vestiu o figurino e segue o script do neoliberalismo (mas incomoda aos bem-nascidos, porque é mal educado, deselegante, espalhafatoso e descortês). Em 28 anos de mandato foi um deputado abaixo da média. A jornalista Eliane Brum (El País), o descreve assim: “O homem mediano assume o poder”. Título do artigo que o analisa fidedignamente. “O que significa transformar o ordinário em “mito” e dar a ele o governo do país?”, questiona.

E segue: “Jair Bolsonaro, filho de um dentista prático do interior paulista, oriundo de uma família que poderia ser definida como de classe média baixa, não é representante apenas de um estrato social. Ele representa mais uma visão de mundo. Não há nada de excepcional nele. Cada um de nós conheceu vários Jair Bolsonaro na vida. Ou tem um Jair Bolsonaro na família.” Bolsonaro é o nosso Lacombe Lucien. Personagem ficcional, criada pelo diretor Louis Malle e pelo roteirista Patrick Modiano, que mais tarde ganharia o Prêmio Nobel de Literatura. Virou filme. Recomendo que assistam.

MP 927 e 928

A MP 927 foi editado sob lógica diversa do que está sendo feito pelos dirigentes dos países onde a pandemia acomete a infraestrutura sanitária, a saúde do povo e a economia das empresas e dos trabalhadores. O Brasil faz o contrário dos demais países que adotaram políticas contracíclicas para combater o coronavírus (Covid-19).

A MP, gestada na Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, chefiado pelo economista representante de bancos e grande empresas, Paulo Guedes, foi editada sem com que o governo tenha se proposto qualquer ônus, com baixíssimo ônus para as grandes empresas (e os bancos, que auferem lucros bilionários, não vão entrar com nada?) e pesados ônus para os assalariados. Isto é, o governo, mesmo diante da crise, segue sua linha original. Na política, ultraconservador. Na economia, ultraliberal e “austericida”. E no social, reacionário e mistificador.

A MP permitia (foi retirado do texto, pela MP 928, o artigo 18) a absurda suspensão do pagamento do salário por 4 meses. Mas manteve a suspensão temporária de vários direitos, como o depósito do FGTS, entre outros. O conteúdo do texto, grosso modo, pode ser assim resumido: o Estado não entra com quase nada; as empresas entram com o mínimo; e os trabalhadores pagam a conta. A MP 927, entre outras deformações, permite:

1) suspender as normas de saúde e segurança no trabalho;

2) antecipar o gozo dos feriados;

3) prorrogar a jornada em atividades insalubres e nas jornadas de 12 por 36 horas;

4) retirar poderes dos auditores do Trabalho;

6) excluir os sindicatos das negociações, que serão individuais;

7) permite, ainda, a redução da jornada e do salário, a critério da empresa/patrão, em negociação individual, sem mediação sindical; e

8) permite prorrogar acordos e convenções, vencidos ou vincendos em até 180 pelo prazo de 90 dias, a critério do empregador. Inócuo!

Como se vê, o conteúdo da MP, o pensamento de Junior Durski (e de Roberto Justus também) e as práticas e posições do PR se confundem e demonstram que no Brasil não há uma elite econômica, na concepção substantiva do termo.

Aqui há ricaços, que não admitem, mesmo diante da profunda depressão econômica e social da imensa maioria do povo, em hipótese alguma, abrir mão de seus seculares privilégios sustentados por um povo majoritariamente pobre, num país riquíssimo. Daí terem apoiado e eleito (a “elite” econômica), a pessoa errada, na hora errada, para o lugar errado!

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