Bolsonaro não mudou nem vai mudar

“Bolsonaro ‘paz e amor’, do diálogo e de um suposto governo de centro-direita é uma contrafação, uma ópera-bufa, um mito, inventado por setores da mídia. O diálogo, entendimento, conciliação ou seja o que for que esteja sendo engendrado entre o Palácio do Planalto e os chefes das duas casas do Congresso Nacional poderá levar a qualquer coisa, menos à estabilidade, à solução da crise do país e à defesa da democracia”

(Foto: Reprodução)

O inquilino do Palácio da Alvorada voltou à carga neste sábado (18), fazendo da área externa da residência oficial cenário de pantomimas e patriotadas, com içamento do Pavilhão Nacional e o canto do Hino por um coro desafinado e desenxabido. Foi mais um episódio da simbologia neofascista que passou a fazer parte da rotina presidencial.

Novamente, Bolsonaro demonstrou a essência da linha governamental de gestão da pandemia, em boa hora catalogada com a palavra certa por um eminente membro da Alta Corte: “genocídio”. E como exibição de que na “rentrée” segue beligerante, atacou de novo os governadores, não se importando com o fato de que alguns deles nem adversários são e foram constrangidos a executar políticas irresponsáveis de abandono do distanciamento social. Inopinadamente, alguns passaram a defender a reabertura das atividades econômicas e o retorno ao “normal”. Não suportaram o caos provocado por Bolsonaro, a pressão da crise econômica e social, confrontados com o desamparo causado pela ruinosa conduta do governo federal. Por óbvio, somente com ações coordenadas e a responsabilidade compartilhada, seria possível assegurar a proteção socioeconômica em situação de quarentena prolongada.

A cena deste sábado foi um recado político a desmentir os incautos e iludidos de que Bolsonaro estaria iniciando uma fase de diálogo com as forças democráticas, mudando de tom e transformando o caráter do seu governo e de sua própria personalidade. Segundo a lenda, largamente difundida nas últimas três semanas, estaria propenso ao entendimento nacional e até revelando um outro perfil, em substituição ao tosco, truculento mensageiro da morte, chefe de governo neofascista e de extrema direita. Não descartamos que entre os principais atores no palco da vida política, passe a prevalecer uma postura, que aliás nunca deixou de existir, de conciliação e entendimento com Bolsonaro. O fracasso está à vista, esta é a sorte de toda vã ilusão.

Bolsonaro não mudou nem vai mudar. Ele é o polo irradiador e continuador da atual crise política e tragédia nacional.

Uma crise continuada, ligada a fatos de seis anos atrás. Está registrado na história: no dia seguinte à eleição de 2014, o PSDB, secundado automaticamente pelo DEM, PMDB, outros partidos do “centrão”, pelo oligopólio dos meios de comunicação, setores do Judiciário e do Ministério Público, forças armadas, polícias e lideranças de centro-esquerda dissidentes da frente progressista que governava o país, decidiram assestar o golpe contra a democracia. Que resultou nisto que aí está.

Os fatos são conhecidos. Destituíram a presidente Dilma em 2016, condenaram e encarceraram o presidente Lula em 2018, inabilitando-o a concorrer nas eleições presidenciais do mesmo ano. Hoje está demonstrado o que então se intuía: foi um golpe manipulado também de fora, nos Estados Unidos.

O governo que emergiu das urnas na sequência deste golpe continuado tem uma natureza imutável. É neofascista e de extrema direita. Ataca a democracia, os direitos civis, os direitos humanos, as instituições do precário estado constitucional de direito, os direitos do povo, as conquistas dos trabalhadores, com a reforma da previdência e os seguidos retrocessos na legislação laboral, os valores culturais e civilizacionais. É um governo submisso ao imperialismo, agressor dos países progressistas da região, particularmente a vizinha Venezuela. Governo militarizado, de explícita simbiose com as forças armadas e polícias. Um dos papéis preponderantes para sua instalação foi desempenhado pelo ex-comandante da força terrestre. Pelo twitter, deu o sinal para o golpe contra Dilma e a prisão de Lula. Governo fora da lei, de notórias ligações com as milícias.

Bolsonaro “paz e amor”, do diálogo e de um suposto governo de centro-direita é uma contrafação, uma ópera-bufa, um mito, inventado por setores da mídia. O diálogo, entendimento, conciliação ou seja o que for que esteja sendo engendrado entre o Palácio do Planalto e os chefes das duas casas do Congresso Nacional poderá levar a qualquer coisa, menos à estabilidade, à solução da crise do país, ao respeito às liberdades democráticas e à mudança do caráter do governo e do seu titular. São manobras ligadas ao acirramento recente dos ataques à Constituição, aos Poderes legislativo e judiciário. Resultaram também do medo pânico do clã presidencial em face das investigações que atingem filhos e amigos. E do perigo de criminalização internacional, com o espectro de sua condenação por delito contra a humanidade pela gestão genocida da pandemia.

Enquanto isso, o Brasil vive uma crise multidimensional, agravada pelo alinhamento pró-estadunidense adotado pelo governo de extrema direita: crise política, econômica, social, sanitária e ambiental. Na circunstância atual, a crise sanitária enfeixa as principais contradições. E as espelha. Nesse quadro, a luta pela vida e pela proteção dos direitos do povo entrelaça-se com a luta pela democracia e em defesa da soberania nacional ameaçada.

A mudança de rumo do país só ocorrerá a partir do fim deste governo. É uma questão de salvação nacional interromper sua continuidade, seja pelo impeachment ou pela cassação da chapa eleita em 2018, o que deveria obviamente ser sequenciado pela antecipação das eleições presidenciais.

Fora Bolsonaro, democracia, proteção aos direitos sociais e defesa da soberania são bandeiras que podem unir amplas setores políticos e sociais democráticos, patrióticos e progressistas. Partidos, organizações dos movimentos sociais, personalidades.

Setores de direita que fazem oposição a Bolsonaro por seus interesses próprios e não por convicções democráticas e patrióticas, recusam-se a dar encaminhamento legislativo ao impeachment. É conveniente a esses setores a polarização da vida política entre eles próprios e a extrema direita. E que a solução da crise política, sob seu estrito controle, seja a resultante dessa divisão.

Dois fatores são decisivos para as forças progressistas alcançarem êxito na luta para pôr fim ao governo Bolsonaro: a unidade entre as correntes democráticas, patrióticas e populares e a mobilização do povo. A superação da fragmentação e da divisão entre as forças progressistas e de esquerda é condição sine qua non para a conquista desse êxito.

A ampla unidade entre as forças democráticas é a condição indispensável para formar uma maioria política democrática no país. Uma unidade não apenas partidária. Envolve um conjunto imenso e variado de organizações sociais e personalidades democráticas e patrióticas. Trata-se de um processo objetivo, que não tem (nem está no horizonte que tenha) expressão orgânica nem eleitoral.

O esforço de unidade inclui múltiplos embates em situações objetivas, nas quais se realizam ações pontuais convergentes entre todas as forças de oposição.

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