Brasil: presente, passado e futuro

O debate sucessório começou no 1º dia de mandato de Bolsonaro. Ao invés de convocar o povo e as forças políticas à união para superação dos graves e endêmicos problemas nacionais fez o oposto. Trata-se, pois, de figura política fora da curva. Para dizer o mínimo, com elegância. Embora o artigo da jornalista Mariliz Pereira Jorge tenha sido invulgar. Aquele em que ela o nomina com vários adjetivos e que ele “assina o recibo”.

O debate político nacional está rebaixado, desorganizado e não aponta rumos seguros. Tudo isso tem a ver com a lógica do atual mandatário, a quem não interessa debate político racional. A ele interessa o caos, pois nesse ambiente tresloucado e esquizofrênico pode, em alguma medida, se sobressair e seguir essa trajetória rumo ao abismo autoritário.

Com a eleição de Bolsonaro, em 2018, o Brasil deu um “grande salto para trás”. O País involuiu sob todos os aspectos. A pandemia não é responsável direta por esse atraso, apenas explicitou de maneira meridiana e elevou as mazelas estruturais brasileiras à 3ª potência.

Este é o presente. Sob Bolsonaro, o País está submetido a uma regressão autoritária, e caminha, em marcha batida, para inação completa.

O passado como imposição ao presente desmantelado

O País está tão ruim, que voltar ao passado, dar marcha à ré, por medo ou receio do futuro e do novo, pode ser a alternativa viável, afinal, o ser humano tem tendências antineofílicas (medo do novo).

O pensamento progressista — esquerda, centro-esquerda, direita e centro-direita liberal — parece, não mais se preocupar em formar quadros políticos, daí não haver novidades ou lideranças políticas que encantem e mexam com corações e mentes. Contraditoriamente, o mundo precisa disso, como estímulo. Não no sentido apenas emocional ou afetivo, pois política é lugar para a racionalidade, ainda que possa (ou precise) haver emoção e afetividade. Política são propostas e saídas das encruzilhadas. O resto é narrativa.

Esta afetação, tão comum e tradicional na política nacional e latina, mostra-se nefasta, à direita e à esquerda, pois assim não há necessidade de apresentar projetos. Não há disputa de projetos, mas de quem pode ou se apresenta como o líder “salvacionista”, na lógica sebastianista1, de a volta do messias salvador.

A polarização odienta e desinteligente pós 2013 — que redundou na eleição do pior, dentre os candidatos em 2018 —, só é “positiva” para as chamadas candidaturas polares.

Por óbvio, diante do desastre, da fraude e do engodo que representa o governo atual, a volta ao passado se anuncia alvissareira. E, assim, não há espaço para nada novo, que não represente esses polos, que não permitem nada que seja crítico e alternativo, que ambas as tendências polares querem impor ao debate político-eleitoral.

Desse modo, voltar ao passado é a alternativa apresentada pelos que foram derrotados em 2018, pois ninguém em sã consciência, em comparação direta, pode negar esse dado da realidade objetiva. Entre o passado de “boas lembranças” e o presente trágico, o melhor é derrotar o segundo. Com efeito, para o bolsonarismo, entre ambos, o melhor é derrotar o primeiro, pois, por óbvio, não representam “boas lembranças” para esses.

Abrir perspectiva rumo ao futuro

O futuro, nesse debate, ou embate, ainda está perdido entre o presente e o passado, um alimentando o outro. Não há (ainda), mas é preciso construir, espaço para confrontações que fujam do figurino das obviedades polares. Em meio à tragédia econômica, da desindustrialização, só para citar dado do macro debate, enquanto o mundo em desenvolvimento e desenvolvido estuda, debate e executa a Revolução 4.0, o Brasil sequer se debruça sobre a involução industrial nacional.

Nesse debate, os neokeynesianos chamam o Brasil de “Saci Pererê”, que sob esse neoliberalismo atávico anda para trás. Enquanto o Brasil “pula” em busca do futuro, o mundo em desenvolvimento e desenvolvido “corre”, com as 2 pernas, rumo ao tempo que há de vir.

O neoliberalismo é o projeto da burguesia brasileira, que Bolsonaro abraçou cegamente, das contrarreformas, que vão aprofundando as seculares desigualdades e mazelas nacionais. O governo anterior não foi capaz de apresentar um projeto nacional de desenvolvimento e busca o liberalismo econômico, agora mais explicitamente, para mostrar ao mercado que é confiável e palatável. Não aprenderam nada, parece, com o golpe de 2016.

Sem projeto integrado de desenvolvimento, o Brasil caminha para ser uma “grande fazenda” exportadora de grãos ou grande manancial exportador de commodities, como foi a Era Lula, entre 2003 e 2014. Isso não é a negação dos saltos econômicos no período citado e as várias e relevantes políticas públicas de inserção da extrema pobreza e dos pobres ao mercado consumidor. Mas aquelas políticas, hoje, são insuficientes. É preciso mais, muito mais.

O pensamento progressista precisa buscar candidatura, sob projeto de desenvolvimento nacional, que represente essa perspectiva, que fuja das candidaturas polares e que, de algum modo, tenha a capacidade de propor e bancar o debate, por exemplo, que a Espanha fez em 1977, os famosos “Pactos de Moncloa2. O atraso político brasileiro é tão espetacularmente impressionante, que não consegue sequer fazer reformas capitalistas avançadas. É possível e preciso tentar.

Diante disso, há espaço para construção de frente ampla, sob a hegemonia do progressismo, com projeto de desenvolvimento nacional para tirar o Brasil do atraso secular, imposto por elites políticas e econômicas oligárquicas. O debate não é de quem pode mais (pelo menos não deveria ser), mas de como superar a tragédia que se abateu sobre o Brasil.

Superada essa tragédia que ora vive o País, depois cada qual busca seu rumo. Em situação de equilíbrio, de proteção e manutenção do Estado Democrático de Direito, sob um projeto de desenvolvimento nacional.


Notas

[1] Crença mística, propagada em Portugal logo após o desaparecimento de D. Sebastião 1554-1578, segundo a qual este rei, como novo messias, retornaria para levar o país a outros apogeus de glórias e conquistas. Método anacrônico, doutrina ultrapassada, estagnada; obscurantista; reacionária; teimosa, caturra.

[2] Os Pactos de Moncloa (formalmente eram 2, denominados “Acordo sobre o programa de saneamento e reforma da economia” e “Acordo sobre o programa de ação legal e política”). Os acordos foram assinados no Palácio de La Moncloa durante a transição espanhola, em 25 de outubro de 1977, tomando conhecimento e comprometendo-se com o desenvolvimento do Congresso dos Deputados. Dois dias depois, foi a vez do Senado, em 11 de novembro, entre o governo da Espanha, de legislatura constituinte, chefiado por Adolfo Suarez e depois Felipe González. Os principais partidos políticos com representação parlamentar no Congresso dos Deputados, com o apoio das associações empresariais e das Comissões Sindicais dos Trabalhadores (comisiones obreras) (exceto algumas seções sindicais das mesmas) e a rejeição da União Geral dos Trabalhadores (que viria a assiná-la) e da CNT (Confederação Nacional dos Trabalhadores). O objetivo dos pactos, era o de tentar estabilizar o processo de transição do franquismo para o regime democrático, bem como adotar política econômica que contivesse a grande inflação que atingiu 26,39%.

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