Como nada será eterno o Brasil já está contra Bolsonaro

Qualquer pessoa racional sabe que “nada é eterno”, mas, talvez, pareça precipitado falar em “brasil contra Bolsonaro” quando seu governo acaba de tomar posse com 57 milhões de votos. Mas essa assertiva não é apenas pelo fato de que seus 57 milhões de votos representam somente 39% do eleitorado nacional e hoje mais de 60% da população é contra as suas principais bandeiras.

Se explica, também, pelo ódio que ele destila contra os adversários (61% dos eleitores não votaram nele); pela sua determinação de subordinar nossa soberania aos interesses dos Estados Unidos; por sua pauta grosseiramente anti-povo, o que prejudica a todos, incluindo seus eleitores e, por isso mesmo, tem provocado profundas contradições com o povo.

Sua pauta era conhecida. Pode-se mesmo dizer que em boa medida ele ganhou as eleições em torno dessas bandeiras. Mas, embora alertados, pouquíssimas pessoas levaram a sério tais disparates. Imaginavam que era apenas proselitismo eleitoral.

E qual é a tática central de Bolsonaro e suas contradições essenciais com o povo?

É comum que um novo governo goze da complacência popular por algo como 180 dias, sendo que a sua “marca”, o traço essencial, geralmente é definido nos 3 primeiros meses. Nesse período o governo vai definindo seu rumo estratégico e ajustando a sua tática. No caso de Bolsonaro tudo indica que a sua tática central será polemizar ações pirotécnicas para “prender” os adversários num debate sem fim, enquanto seus operadores econômicos ficam à vontade para executar a política de desmonte do estado nacional.

Assim, as forças progressistas precisam ter clareza de propósitos e de rumo estratégico. Do contrário ficarão refém das pautas sociais e moralistas que Bolsonaro cuidará para que não faltem à “mesa”, enquanto seus operadores cuidarão da pauta estratégica: submeter nossa soberania aos interesses dos Estados Unidos da América; entregar nossa economia ao capital estrangeiro; privatizar empresas estratégicas; por fim ou reduzir a política de incentivos fiscais e suprimir direitos sociais e trabalhistas do povo sem serem molestados.

No geral os militares se orientam por uma concepção positivista e uma prática cartesiana. São pouco afeitos a flexões e a interpretações mais largas. Mas, mesmo com essa limitação, é pouco razoável imaginar que Bolsonaro não saiba a distinção entre um governo petista e um socialista, o que me leva a concluir que a sua declaração de “acabar com o socialismo e o politicamente correto” está na categoria de bravatas para atrair o debate para o terreno que tanto lhe interessa.

Eis porque o governo nem completou 01 mês e as contradições com o povo já estão expostas, fazendo com que mais de 60% da população sejam contra as suas principais bandeiras.

De forma sintética é preciso destacar que 60% do povo é contra a redução de terras indígenas; 60% se levantam contra as privatizações, como a entrega de 100% de nosso espaço aéreo para os estrangeiros; 57% são contra a redução de direitos trabalhistas (mas ele e Temer reduziram por 3 anos consecutivos o salário mínimo, enquanto asseguram mais de 1,5 trilhão de reais para os especuladores financeiros); 61% não concordam com a flexibilização da posse de armas; e 66% não aceitam que o governo privilegie os Estados Unidos nas suas relações internacionais.

Não me parece pouco para tão curto tempo de mandato, o que justifica plenamente o porquê do povo está contra Bolsonaro.

Por que o choque será inevitável?

A ciência nos ensina que nada será eterno, na medida em que tanto na natureza, quanto na sociedade, todos os fenômenos estão interligados, interconectados e interdependentes, sendo fácil concluir, portanto, que tudo, absolutamente tudo, está em permanente movimentação, transformação e evolução.

Eis porque a sociedade tem presente que a bonança de hoje pode ser a tragédia de amanhã; e a catástrofe do presente pode ser a essência de uma nova sociedade, de um novo patamar civilizacional pois, como se sabe, as sociedades não evoluem de forma linear.

É o que explica a longa e dolorosa trajetória de nossa organização social. Iniciada com a sociedade dos clãs (comunismo primitivo), sucedida pelo escravagismo, que cedeu lugar ao feudalismo, que foi suplantado pelo capitalismo, o qual tenta por todos os meios e recorrendo a qualquer mecanismo – aí incluído a eliminação física de adversários -impedir que as primeiras experiências de sociedades socialistas (Rússia, China, Cuba, Vietnã, Coreia, Laos, etc.) se consolidem e, num futuro distante, possam evoluir para uma sociedade comunista, a qual ainda não foi experimentada no planeta Terra.

A luta do “novo contra o velho e do velho contra o novo” é permanente, animada pelo conteúdo de classe e a sua historicidade. Ocorre tanto em torno de questões centrais, como o caráter e o papel do estado; soberania e independência das nações; subordinação da economia ao interesse nacional; papel estratégico da conservação dos recursos naturais e do desenvolvimento de tecnologias sustentáveis como base do desenvolvimento nacional sustentável; ou pode se dar apenas em torno de temas sociais e de valores morais, que vão da pregação grotesca e caricata de que “meninos vestem azul e meninas vestem rosa”, à pautas fundamentalistas, como a tentativa de contrapor o criacionismo à ciência, como no “espelho” deles, os Estados Unidos.

Nessa luta permanente, enquanto algumas sociedades já iniciaram experiências sociais avançadas, outras sequer saíram do estágio tribal, demonstrando que os três estágios básicos do desenvolvimento social: selvageria, barbárie e civilização podem existir simultaneamente, em permanente disputa. E dentro de um mesmo estágio como, digamos, a civilização, esse conflito é permanente. Ora vencem as ideias e práticas mais avançadas, ora elas são momentaneamente suplantadas por ideias e práticas que o senso comum já considerava ultrapassada e vencida.

O fracasso da experiência socialista na União Soviética está dentro desse patamar e se insere na categoria de revés estratégico, enquanto a derrota das forças de esquerda na América Latina, incluindo o Brasil, é de caráter conjuntural, na medida em que nenhuma dessas nações jamais fez experiência socialista, em que pese os delírios fundamentalistas afirmando o contrário. Mas, ao fim e ao cabo desse eterno conflito civilizacional sempre surgirá uma sociedade superior, mesmo que indicações conjunturais apresentem resultados diversos daquilo que se entende por progresso.

É esse conflito de classe, civilizacional – do qual tratamos em outra coluna – somado às contradições de sua pauta anti-povo, o que explica a essência da contradição entre o governo e a sociedade, daí porque faz absoluto sentido se afirmar que o Brasil está contra Bolsonaro.

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