Fato consumado

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Foto: Agencia Brasil

A pergunta clássica que se faz em relação a CPIs – dará em pizza? – não cabe à recém-instalada no Senado para apurar o desempenho do governo federal no trato da epidemia da Covid-19.

Desta vez, cabe o dito por personagem de Guimarães Rosa: o que importa é o processo, não o resultado.

Ou, de outro modo: neste caso, o processo já será o resultado.

Sofridas as primeiras derrotas na tentativa de inviabilizar a CPI e, diante do fato consumado, controlá-la, inclusive querendo impedir o relator senador Renan Calheiros, Bolsonaro e sua trupe veem-se agora com um tremendo abacaxi à mão e sem nenhuma habilidade para descascá-lo.
E sem força para tanto.

Até um dos próceres do “centrão”, o senador piauiense Ciro Nogueira, do PP, parece disposto a jogar na dúbia função de criar dificuldades e tentar obter vantagens nas suas relações com o Planalto. Na eleição do presidente da Comissão votou contra o governo.

Em princípio, a correlação de forças contra o governo é de sete a quatro. A que se soma a truculência e inabilidade do presidente, que podem gerar muitos gols contra.

A pauta começará pelo emblemático caso de Manaus, tragédia sob todos os títulos, visivelmente associada à insensibilidade e à incompetência do então ministro da Saúde, general Pazuello, que proclamou diante de câmeras de TV apenas cumprir as ordens “dele”, Bolsonaro.

Pazuello deve ser o primeiro a depor na CPI, de uma lista inicial de 24 atuais e ex-integrantes do governo.

E a cada instante surgem mais revelações comprometedoras. O que a CPI por acaso não venha a apurar, a grande mídia antecipa.

Grandes e “pequenas” mancadas, como a que registra Elio Gaspari em sua coluna na Folha de S. Paulo: “O programa Pátria Voluntária, aninhado no Palácio do Planalto com o objetivo de recolher doações para enfrentar a pandemia, gastou R$ 9,3 milhões para fazer propaganda de si e arrecadou R$ 5,89 milhões.”

Pois bem, se não dará em pizza, dará em quê?

A propósito de um comentário em meu canal no YouTube uma amiga me cobrou uma referência explicita à possibilidade do impeachment.

Respondi que me parecia precipitada a afirmação, antes mesmo do início dos trabalhos da CPI. Não há (ainda) na Câmara e no Senado uma correlação de forças favorável ao impedimento do presidente.

E, por enquanto, nas hostes oposicionistas os esforços parecem se concentrar no acúmulo de forças para o pleito vindouro.

Entretanto, a aspiração ao impeachment, que fervilha em boa parte da população convencida do caráter genocida do presidente, é mais do que legítima.

E não se pode de antemão supor que a CPI não venha a produzir alterações na cena política a ponto de se interromper o governo.

No caos semeado pelo presidente tudo pode acontecer, inclusive a sua queda.

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