Honduras : o retorno à democracia ?

Se confirmando essa tendência, o Libre, nascido da oposição ao golpe de 2009, desbancará o Partido Nacional, principal favorecido desse processo

Fotomontagem feita por Artur Nogueira com as fotos de: Orlando Sierra / AFP

Honduras, um dos países mais pobres do mundo, realizou eleições gerais no último dia 28 e os olhos da América Latina se voltaram para esse pequeno país, cuja área é um pouco superior a Pernambuco e cuja população, 10 milhões de habitantes, se equipara a Pernambuco ou Ceará. País devastado pela pobreza, gerando ondas migratórias que se arrastam pela Guatemala em direção aos EUA; país envolvido em escândalos de corrupção quase que permanentes e mergulhado em uma violência social, que espelha o grau de miséria que atingiu o país.

Mas por que a América Latina olha para esse país em especial? É bom sempre lembrar que o ciclo de golpes produzidos nessa região, iniciou-se, em 2009, nesse país. Naquele ano, em 28 de junho, o presidente eleito em 2005, Manuel Zelaya, pelo tradicional Partido Liberal, perdia a batalha contra o Poder Judiciário, que articulou a tomada de poder, acusando o presidente de corrupção, evidenciando a forma de como se dariam os golpes daí em diante. Zelaya foi preso, colocado num avião e exilado na Costa Rica.

Daí em diante, o país foi sacudido por uma forte violência política. Os grupos políticos “tradicionais” voltaram a controlar a política, elegendo o conservador e pró-EUA, que sorrateiramente apoiou o golpe, Porfirio Lobo Sosa, em 2009 e Juan Orlando Hernández, em 2013, ambos do conservador Partido Nacional (PN).

E nesse período da história entra Iris Xiomara Castro Sarmiento, companheira do presidente deposto Santos Zelaya, que passou a cumprir um papel de liderança política no país, ajudando a recompor as forças que apoiavam o presidente e que foram duramente perseguidas em seguida ao golpe, tendo atuado na Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP), que se formara para lutar pelo mandato de Zelaya. Em 2010, Zelaya foi inocentado das acusações, falsas, de corrupção e em 13 de março de 2011 fundou o Partido Libertad y Refundación (Libre), que unificava a FNRP com outras organizações de esquerda que se opuseram ao golpe de 2009.

Xiomara Castro I Foto: Moises Castillo/AP Photo

Assim renascia um movimento, muito inspirado no bolivarianismo e que sustentava a necessidade de profundas reformas sociais em Honduras e no seu batismo eleitoral, nas eleições de 2013, Xiomara foi lançada candidata à presidência, obtendo 28,8% dos votos, ficando em segundo lugar, atrás do conservador J.O. Hernández (36,9%), mas já evidenciava que sua força eleitoral estava recomposta, visto que o Libre elegeu 37 dos 128 deputados tornando-se o segundo maior partido do país.

Em 2017, o Libre formou a Aliança de Oposição contra la Ditadura, com Partido Innovación y Unidad Social Demócrata (Pinu-SD), um tradicional partido social-democrata hondurenho, que abrigara a candidatura de Salvador Nasrallla e as eleições daquele ano demonstraram o quanto as forças conservadoras e reacionárias resistiriam para deixar o poder. Acusações de fraude eleitoral foram feitas e o candidato J.O. Hernández foi declarado vencedor com 43% dos votos, contra 41,4% de Nasralla, uma diferença de pouco mais de 50 mil votos. Milhares foram as ruas e as manifestações produziram novo banho de sangue no país. Esse processo fraudulento repetiu-se no parlamento, com o Partido Nacional passando a 61 cadeiras, contra 30 do Libre e 26 do Partido Liberal.

Em março desse ano, nas eleições internas do Libre, Xiomara, que permaneceu ativa na luta política, venceu seus adversários com 79,1% dos votos e foi lançada como candidata à presidência da república, renovando a aliança com Salvador Nasralla e o Pinu-SD. As eleições se realizaram em 20 de novembro e ontem (30), com 51,5% das urnas apuradas, Xiomara estava com 53,6% dos votos, contra 33,9% dos votos dados ao conservador Nasry Asfura, do Partido Nacional; e 9,2% dados a liberal Yani Rosenthal.

Se confirmando essa tendência, o Libre, nascido da oposição ao golpe de 2009, desbancará o Partido Nacional, principal favorecido desse processo e, restando a contagem de votos para saber a composição do próximo Congresso Nacional, veremos se a sombria década que jogou Honduras na miséria e pobreza, se reverterá.

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