Lembrança do editor Eliakim Araújo

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Perdoem o lugar-comum, mas parece que foi ontem. Sim, parece que foi no máximo esta semana, aí por volta de quarta-feira. Quando estava há pouco em busca de um assunto para esta coluna, me deparo com o registro: Eliakim Araújo Pereira Filho, jornalista brasileiro, faleceu em 17 de julho de 2016.

E sinto que sou obrigado a ouvir a pergunta dos mais jovens: Quem? Então sou obrigado a copiar algumas informações sobre Eliakim.

Eliakim Araujo começou na televisão em 1983 no Jornal da Globo. Na emissora, ele conheceu a esposa, a também jornalista Leila Cordeiro. Em 1986, os dois passaram a apresentar juntos o telejornal, formando o primeiro casal de apresentadores da televisão brasileira. Na Globo, Eliakim também fez reportagens, apresentou o programa Globo Repórter, cobriu a eleição de Tancredo Neves. Juntos, Eliakim e Leila seguiram para a extinta Rede Manchete em 1989. Eles ancoraram o principal jornal da emissora. Em 1992, em São Paulo, também com mulher, Eliakim apresentou telejornais do SBT como o Aqui Agora e o Jornal do SBT.

E quando saiu da televisão no Brasil, Eliakim Araújo fundou o Direto da Redação, onde tive a sorte de ser um dos seus colunistas. O certo é que os dados acima não falam que ele era filho de pais pernambucanos, dos quais me falou em mensagem: “Muito boa a coluna, Urariano. Me trouxe à lembrança as figuras de minha mãe, recifense, e de meu pai, pernambucano. Parabéns. Abs. Eliakim”.

Com ele, pude ver que Eliakim era este fenômero raro: um apresentador de televisão que conhecia muito bem português. De Eliakim, recebi aulas práticas de uso de ferramentas da língua na internet – eu até então era basicamente um escritor e jornalista que usava pesados Aurélio e Houaiss em papel. E ganhei reconhecimento e incentivos como o deste email, que ele me reenviou com um comentário:

“Urariano, a Ana Maria Machado é uma imortal da ABL. Parabéns. Abs. Eliakim Você recebeu uma mensagem do Direto da Redação A mensagem foi enviada por:

Ana Maria Machado. e-mail:

anamarch…. Mensagem: Gostei muito de seu artigo sobre a crônica de rádio. Muito preciso. Como escritora e ex-radialista por 10 anos (dos quais uns 5 com crônicas diárias) concordo inteiramente. Parabéns”.

Por isso, em 03/08/2011 escrevi para o aniversário do Direto da Redação um texto do qual salvo alguns trechos:

“Recife (PE) – Da turma, eu sou aqui um dos mais novos. Quero dizer, faz pouco mais de três anos que apareci no Direto da Redação. Vim, pedi licença pra entrar, porque sabia do quadro de colunistas, da qualidade dos textos publicados, e por último, mas não menos importante, da boa fama do editor também, a quem conhecia somente pela voz e imagem na tevê.

Se a memória não me falha, não fui convidado, fui eu que pretensioso bati à porta. Ao que me respondeu São Pedro Eliakim: “pode entrar, eu já acompanho os seus textos”. E passei a colaborar até hoje.

Como diria Samir Abou Hana, no dia em que lhe perguntei se ia cantar Nelson Gonçalves na casa de Racine: ‘aqui só tem cobra’. Mas muito afoito, tenho procurado deixar nas colunas um pouco do veneno de Pernambuco.

Do editor Eliakim Araújo tenho recebido contribuições, das quais a não menos pequena é a mudança de títulos na coluna. Quando uma delas é muito citada, não tenham dúvida: a culpa é de Eliakim. Ele pede licença antes, e

muda o título com uma desculpa: ‘se você não concordar, mande’. Isso, para bom entendedor, significa ‘presta atenção, esmorecido, isso lá é título?’.

No Direto da Redação tenho publicado até hoje o que penso. Até mesmo quando escrevo contra a vontade e opinião do editor. Até mesmo quando falo mal de Roberto Carlos, que desconfio ser um dos compositores preferidos dele e de Leila. Paciência, não é? Tem nada não. Assim que puder, farei aqui no Direto da Redação um último e definitivo teste da mais absoluta liberdade de expressão. Ando matutando para um dia escrever e publicar uma crônica de nome ‘O santo dia em que Roberto Carlos morreu’. Aí vamos ver. Mas enquanto não, amigos, para encerrar a de hoje, envio-lhes esta última frase, que pode não ser um primor de originalidade, mas é sincera e vem a calhar, sem dúvida: a todos, parabéns pra você, nesta data querida”.

Mas não era só a mudança de títulos. Era também o de me fazer saber a quantidade de leituras das colunas, como neste email:

“Urariano, para seu controle:

4 da tarde aqui, 5 da tarde aí. Seu artigo sobre JB completou 1.167 visitas. Velhinhos Assassinos, 1.314 e Liedo, 218.

Abs. e bom fim de semana, Eliakim”.

Até chegar o dia do aniversário dos 25 anos do seu casamento com Leila, comemorado no Rio de Janeiro em junho de 2009. De fato, foi uma grande comemoração, segundo o relato de Dalva no grupo coletivo Os amigos de 68:

De: mdalvabonet > Para: [email protected] Assunto: RES: [osamigosde68] Festa de 25 anos de Eliakim Enviada: 29/06/2009 23:21 Desculpe não ter escrito antes. Andei em um redemoinho de trabalho,

emoções, mudanças e tudo mais que vc pode imaginar. Mas saí ilesa e, tchan-tchan-tchan, mais bem humorada e amiga da vida.

Muito obrigada pelo presente que foi a festa do Eliakim. Foi muito agradável e ajudou a recuperar outra parte de mim que andava mergulhada na Baía de Guanabara, ou mesmo no Oceano Atlântico, sei lá. Geralmente somos acusados de saudosismo, mas os mais velhos se valorizam através das suas memórias, não é mesmo? É quando temos certeza que algo fizemos, que se a missão não foi totalmente cumprida, pelo menos foi encaminhada…

Tudo parecia conspirar para uma grande noite: o Rubens, dono da casa, foi extremamente simpático quando telefonei avisando que iria e levaria outra pessoa que era amiga do Eliakim. Ura, vc não acredita, não tinha me dado conta do endereço: era o apartamento imediatamente abaixo daquele do Brizola, onde tantas estórias tinha vivido nas décadas de 80 e 90.

Estavam todos lá: Eliakim, Leila, Leda Nagle, Maurício Figueiredo e Vera, Mário Augusto Jacobskind e sua simpaticíssima esposa, Eliane Furtado e tantos outros que não dá para enumerar. Do Direto da Redação só faltava vc. E é claro que falei que soube da festa por seu intermédio. Eliakim ainda completou: ‘Da lista, né’?

Olha, falamos de tudo. Do passado, do presente, do futuro. Fiquei até muito orgulhosa quando descobri que a minha família, junto com o Brizola, ajudou o Maurício Figueiredo no tempo em que eu não estava no Brasil.

A minha amiga tinha trabalhado com eles na Globo e na Rádio JB naqueles tempos sonhadores e de jornalismo sério. Foi uma festa para ela e me agradece até hoje pela oportunidade de reencontrá-los. Repasso os agradecimentos.

Enfim, foi tudo muito prazeroso. A Maria Lúcia, anfitriã nota 10. Até o cachorrinho da casa, um poodle muito carinhoso, contribuiu para a leveza do tempo ali passado. A música, ia do pop dos anos 50-60 com direito a Edmundo, Let’s Twist Again e Rock Around the Clock até finalizar com Roberto Carlos “e o meu amor por vc…”. Ah, o Roberto Carlos! Não dá para esquecer a Ditadura um pouquinho?…

Tchau. Bjs,

Dalva”.

Ou como relataria o próprio Eliakim sobre a festa do aniversário de 25 anos de casamento com Leila:

“De fato, faltou vc. A festa esteve animada. Bebida de todos os tipos e pra todos os gostos. Comida farta e deliciosa. Sem contar a magia do local, o clima de emoção quando você sabe que naquele edifício morou por muitos anos Leonel Brizola. Por iniciativa de nossos anfitriões – e aprovada pelos demais condôminos – há na entrada do prédio uma placa que não nos deixa esquecer que ali viveu o grande líder. Obrigado pelo texto que nos mandou pelos 25 anos. Ainda estou em SP. Na sexta, já estaremos em nossa casa. Estou publicando os textos dos colunistas, só não estou distribuindo a NL por falta do programa próprio. Abs. Eliakim”

Sete anos depois, em 17 de julho de 2016 veio a sua morte. Alguns meses adiante, em 2017, Leila Cordeiro casou pela segunda vez com um amor de juventude. Parece que foi ontem.

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