Lições da pandemia para a relação do homem com o planeta

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Cotidianamente o homem luta para controlar a natureza e assim coloca-la a serviço da satisfação de suas necessidades. A evolução da civilização está diretamente relacionada ao avanço da capacidade do homem de domar o ambiente que o cerca e foi assim, domesticando plantas, animais e até mesmo rios, que o homo sapiens construiu as primeiras civilizações na Mesopotâmia, nos vale do Nilo, do Indo ou do Rio Amarelo na China. Em termos geológicos, nossa jornada desde a domesticação do fogo até a conquista espacial tem sido feita numa velocidade estonteante, a ponto tornar essa única espécie de primata dominante em todo planeta em pouco mais de cem mil anos. Porém de tempos em tempos somos confrontados com recados duros da terra nos avisando que por mais engenhosos e supostamente poderosos que sejamos, no fim a natureza sempre poderá nos derrotar.

A pandemia do Novo Coronavírus já infectou milhões de pessoas pelo mundo, ceifou a vida de centenas de milhares e vem causando forte impacto nas economias de praticamente todas as nações. Não é o primeiro e certamente não será o último recado que o planeta nos dá do quão frágeis somos nós enquanto indivíduos e sociedades. O engenho humano já controlou outras enfermidades e controlará essa também, mas o que fazer depois disso, esperar a próxima epidemia global ou o próximo desastre “natural”? Cataclismos naturais como tsunamis, terremotos, erupções vulcânicas ou mesmo impactos de asteroides sempre aconteceram e já chegaram a causaram extinções em massa no passado. Mas há um grande desastre global em marcha, dessa vez não mais causado por incontroláveis forças da natureza, mas pelo próprio homem.

O aquecimento global é um fato, o ano de 2019 foi o mais quente desde 1880, quando começaram a ser realizadas medições confiáveis, e, ano a ano as temperaturas médias globais batem recordes. Eras glaciais e períodos de aquecimento global já houve vários ao longo dos pouco mais de 4,5 bilhões de anos dessa rocha chamada terra, que hoje habitamos. A diferença é que dessa vez há incontáveis evidências de que somos justamente nós, a espécie que aprendeu a melhor controlar as forças da natureza, que estamos causando essa mudança no clima da terra, ao ponto de nos tornarmos fortes candidatos a desencadear a “sexta extinção em massa”. Tudo isso porque descobrimos que restos de matéria orgânica, morta ao longo de milhões de anos e enterradas nas profundezas na forma de carvão ou petróleo, são verdadeiros depósitos de energia que nos legaram esses seres que viveram no passado.

Ao contrário da pandemia da Covid-19, as consequências de um aquecimento global acima de dois graus Celsius não poderão ser freadas com uma vacina. O derretimento das calotas polares, o aumento do nível dos oceanos que ameaça milhares de cidades litorâneas, tufões, furacões, tornados, secas, incêndios florestais, desertificação e outros efeitos do aquecimento global tendem a ser duradores e a impactar permanentemente a vida da maior parte da humanidade.

As mudanças climáticas e seus efeitos nocivos sobre o ecossistema e os seres humanos já são uma realidade, mas tendem a se agravar nos próximos anos, a não ser que a humanidade mude seus hábitos de produção e consumo, mais especificamente no que diz respeito à energia. O uso dos combustíveis fósseis para transportar coisas ou pessoas, para fazer funcionar máquinas ou gerar eletricidade foi determinante para a construção do mundo em que vivemos, com todos seus avanços técnicos e reflexos na qualidade de vida das pessoas. A transição energética, representada pela passagem do uso da lenha para o carvão mineral, possibilitou a própria revolução industrial entre os séculos XVIII e XIX e a difusão do uso do petróleo e seus derivados, no fim do século XIX marcou a segunda fase dessa revolução industrial, e a construção da “sociedade do automóvel” em que vivemos.

Hoje o mundo vive uma nova transição energética e a boa notícia é que dessa vez o sentido da mudança não é mais no rumo de combustíveis fósseis, mas sim da paulatina substituição desses por uma tríade que envolve energias renováveis, veículos elétricos e o barateamento de tecnologias de armazenamento de energia. A má notícia é que essa transição, embora tudo indique que seja irreversível, vem acontecendo num ritmo muito aquém do exigido pela gravidade e urgência da crise ambiental causada pela mudança climática.

Para salvar o mundo de uma catástrofe planetária será necessário mais do que o simples curso natural do desenvolvimento científico e tecnológico e sua difusão pelos mecanismos de mercado. Será necessária uma atitude ativa das empresas, dos governos e das sociedades.

A pandemia da Covid-19 nos deixa algumas lições. A primeira é de que não somos invencíveis e que mesmo um vírus microscópico, surgido aleatoriamente em algum lugar do planeta, tem o potencial de causar sérios danos às mais avançadas sociedades. A outra lição é de que com o esforço conjunto da ciência, das empresas, dos governos e das pessoas é sim possível mudar hábitos e vencer os desafios impostos. Muitos países que já venceram ou que estão vencendo a pandemia tiveram que pagar um preço alto por isso. Nações inteiras em quarentena, negócios sendo arruinados, pessoas tendo que se isolar de seus entes queridos, atitudes que trazem desconforto para todos, mas tudo por um bem comum, para que as sociedades não sucumbam diante de uma doença. Se estamos sendo capazes de nos impor sacrifícios para salvar nossas vidas e de nossos entes queridos de um vírus, porque não poderíamos fazer o mesmo para salvar o único planeta que temos para viver?

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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