Livrarias Cultura fecharam

O fechamento da loja da Livraria Cultura do Recife e a leitura de livros com novas tecnologias e o curta Lucrezia Borgia, de Walerian Borowczyk

Loja da Livraria Cultura em Recife I Foto: Divulgação

Quando a Livro 7 fechou no Recife, aconteceu uma comoção, pois a Livro 7 foi realmente algo especial na cultura da cidade. Era uma livraria que no seu auge ocupou um grande armazém, e assim criava espaço para verdadeiras festas. O seu dono Tarcísio Pereira era um intelectual, que não só vendia livros, mas pactuava pessoalmente com todos os que faziam cultura na cidade. Em determinados momentos, era a Livro 7 o arcabouço da cultura recifense.

As duas Livraria Cultura que existiram no Recife eram de porte correspondente à Livro 7, mas nenhuma delas conseguiu se firmar como polo de cultura. Eram excelentes livrarias, mas não arcabouços para formação de núcleos culturais.

Entretanto, as Livraria Cultura são mais importantes para a análise do que está acontecendo com o livro. A Livro 7 acabou sem dúvida por questões administrativas assim como as Livrarias Cultura. Mas quando a Livro 7 acabou, o livro em papel ainda era um produto visível para o mercado. Enquanto agora, o que está acontecendo é que o livro em papel deixou de ser fundamental para o comércio do livro. O importante agora é o livro e-book.

Quando na década de 60 nós – Jomard Muniz, Aristides Guimarães e eu – lançamos um Manifesto Tropicalista, falávamos da modificação que o livro estaria deixando de ser de papel para ser ‘on line’. As pessoas se acostumaram com o livro também como objeto de coleção e de presentear. Um verdadeiro mimo. E então sofrem com a perda desse brinquedo. Eu mesmo tenho uma biblioteca em casa com aproximadamente 6 mil volumes. Tem vários belíssimos. O que será deles?

Penso que já tenho uma experiência de uns 20 anos com e-book. Quando iniciei, procurei escolher um romance para começar e fui descobrir justamente o “1q84” de Haruki Murakami. Inclusive me tornei um leitor permanente desse escritor japonês. Hoje tenho mais de 2 mil e-books. Nessa semana, por exemplo, ouvi uma palestra de Elias Jabbour sobre seu livro “China: o socialismo do século XXI”, e logo fui para a Amazon e comprei o livro que imediatamente chegou à minha disposição. Tudo sem sair do meu ‘Ipad’ da Apple. A diferença entre ter uma biblioteca em papel ou on-line é enorme. Para guardar 6 mil livros como os meus ocupo grande espaço na casa e já tive grandes problemas com cupim e outros animais. Enquanto isso, os 2 mil livros e-book ficam todos eles à disposição no tablet. E quando quero, vou de um para o outro com a maior facilidade.

Claro que temos muitas deficiências no e-book, mas certamente coisas que serão consertadas com o tempo. A cada dia fica mais fácil manusear um livro em e-book. Quando eu comprei os dois volumes de Baudelaire em francês, uma filha minha trouxe um deles na mão dentro do avião e sofreu para sustentá-lo durante a viagem. Hoje já comprei várias coleções de autores famosos, filósofos, romancistas, em segundos na Amazon. Por 3 ou 4 reais. Dentro de alguns anos, temos certeza de que todo mundo estará lendo livros e-book e achando muito bom.

É por isso que eu não choro a ‘morte’ das livrarias Cultura no Recife. Certo que era um local agradável, inclusive para encontrar pessoas interessantes e tomar um café. Mas os comerciantes vão conseguir novas formas de vender o produto leitura, e também criar pontos de encontro para as pessoas que gostam de ler. Quando isso acontecer, e se eu ainda estiver por aqui, poderei participar alegremente. Se não fosse o e-book, a minha vista não me permitiria mais ler.

Olinda, 03.02. 22

Lucrezia Borgia

Curta “Lucrezia Borgia” I Foto: Divulgação

É uma personagem muito conhecida na História da humanidade, Lucrécia Borgia. Mas eu quero me referir ao filme curta “Lucrezia Borgia”, que faz parte de um longa composto por quatro curtas, dirigido pelo polonês Walerian Borowczyk, “Contos Imorais”, que está em cartaz na Mubi. Walerian Borowczyk foi um artista múltiplo que viveu de 1923 até 2006, e como cineasta fez quarenta filmes, todos com uma dimensão erótica. Ele foi escritor, escultor, pintor e muitas outras expressões artísticas. E na verdade, um pioneiro em profundidade, mas certamente não conseguiu atingir essa coisa de popularidade.

Nesse filme “Contes immoraux”, o que me interessou mesmo foi o conto “Lucrezia Borgia”, onde temos uma narrativa com muita densidade dramática e em força de imagem destacando entre o erótico e o eclesiástico. Lucrécia era filha do Papa Alexandre VI e o filme conta uma visita que ela faz ao pai. A narrativa consegue uma mistura tanto pela força das imagens quanto pela de um discurso eclesiástico, mais a trilha sonora que utiliza palavras e música. Claro que não falta uma cena de contatos pessoais eróticos, que se incorporam ao drama.

Por esse filme curta fica demonstrado que Walerian Borowczyk foi autor de uma obra especial, o que poderia ser motivo para uma mostra especial numa plataforma de hoje.

Olinda, 30. 12. 21

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