Nosotros no silenciamos: fuera colonialismo y imperialismo

El gran error de nosotros los latinoamericanos, es no unirnos para proteger nuestros intereses. Ese es nuestro error, y estar sometidos a los intereses de los europeos, de los yanquis ¡ese es el gran error nuestro! (…) ¿En qué medida

O “Por qué no te callas?” (“Por que você não cala a boca?”), pronunciado pelo rei Juan Carlos da Espanha, contra o presidente Hugo Chávez, durante a Cúpula Ibero-americana, em Santiago do Chile, em 10 de novembro de 2007, é emblemático de como a luta de classes vem refletindo-se na atual conjuntura latino-americana e brasileira.



De um lado, os velhos liberais conservadores, submetidos historicamente ao domínio colonial, hoje pajens do imperialismo e das políticas neoliberais. De outro, as forças libertadoras e revolucionárias, em luta por suas independências nacionais, ante-sala de projetos socialistas.



A frase de Juan Carlos foi elogiada em editoriais da grande imprensa, estampada em camisetas para o mercado capitalista, veiculada em sons de chamadas para celulares de gente apegada ao consumismo efêmero. Na forma, reforçou a visão secular daqueles que não admitem os mínimos avanços da luta popular por mais democracia e soberania em nossos países, situados abaixo das linhas divisórias da Califórnia, do Arizona, do Novo México e do Texas.



Desde 1492, quando passamos a servir como colônia produtiva para as metrópoles Espanha e Portugal, depois dominação neocolonial britânica, passando pela autonomia política de nossas independências, sem as respectivas liberdades econômicas e sociais, [1] chegando até a fase imperialista, em especial do domínio inglês e norte-americano, nossos lacaios mantêm a sua estratégia.



Baseados na acumulação interna de capital, cujo montante principal circula e é investido nos centros hegemônicos, geraram em nosso subcontinente classes dominantes heterogêneas, mas com objetivos comuns: a manutenção das estruturas dependentes que geram a miséria e a opressão de maioria de nossas populações.



Séculos de escravidão negra e indígena, milhões de vidas ceifadas pela alta exploração da mão-de-obra, pelo genocídio e pela repressão quando buscavam liberdade, independência e novos modos de produção; décadas de saques, contrabandos, piratarias, ditaduras e golpes de Estado quando a democracia era almejada para muitos; tudo isso ainda não basta para o eurocentrismo e o imperialismo.



Temos que ouvir herdeiros das tiranias monárquicas e do acúmulo do ouro e da prata, hoje representados pelo capital financeiro e pelos grandes monopólios mundiasi, especialmente europeus e dos EUA, resultado de anos de domínio sobre nossas nações, com rompantes e arrogância de vencedores, dizer que temos que nos calar para seus desígnios.



Pior que a “bronca” de Juan Carlos, aquele mesmo que foi conivente com o franquismo espanhol, que de forma condescendente poderia soar como uma gentileza para seu compatriota José Luis Rodríguez Zapatero poder terminar a sua fala, foi a instrumentalização de sua frase como forma de depreciação não só das lutas chavistas, mas de toda a resistência atual da América Latina.



Os mesmos lambe-botas costumeiros do colonialismo das potências européias e dos Estados Unidos, sempre prontos a conotar nossas críticas como “idiotia latino-americana”, foram os primeiros a se agarrar nas madeiras podres da fala joanina, asseverando que o líder venezuelano, eleito, ao contrário do rei espanhol, teve a resposta que merecia.



A maior parte da mídia, serviçal e parcial, como não poderia deixar de ser, aos propósitos dominadores, sequer teve a hombridade de mostrar que outro presidente eleito, Daniel Ortega, da Nicarágua, ainda se manifestava, quando o mesmo Juan Carlos abandonou a reunião da Cúpula. [2] Há, mas isso não é deselegância, não é arrogância, não e topete! A omissão de fatos como esse, além das manipulações grosseiras e cotidianas, estão nas bases das razões porque a RCTV venezuelana não teve a sua concessão pública renovada. Porém, no restante do América Latina, a maior parte dos telespectadores, dos ouvintes das rádios e dos leitores de jornais permaneceu submetida a uma mídia mentirosa, manipuladora e a serviço do capitalismo mundial e seus sócios menores em nível local.



Pois foi esta parcela da mídia, bem como muitos de nossos intelectuais que ficaram ao lado do Rei, estruturada na síndrome do colonizado, que descontextualizou os questionamentos de Chávez a Zapatero. Chávez interpelava sobre o papel do neoliberal José Maria Aznar e sua atitude fascista, provavelmente fazendo referência ao golpe de Estado que a oposição tentou contra o presidente venezuelano, em 2001. Naquele momento, o Embaixador da Espanha, nomeado pelo primeiro ministro Aznar, esteve no Palácio de Miraflores, ao lado do golpista Pedro Carmona, avalizando a destituição do governo chavista.



Por que, então, este conteúdo não ficou explícito para o público que deveria receber a informação? Por que, já sabemos, a forma do “Por qué no te callas?” servia aos propósitos da desqualificação de Chávez e o simbolismo de sua resistência na atual conjuntura latino-americana.



Com Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correa, somando-se a Fidel Castro e a lembrança de Simon Bolívar, José Martí, Augusto César Sandino, José Carlos Mariátegui, Ernesto “Che” Guevara, temos a linha de frente da resistência popular contra o colonialismo e o imperialismo. São os símbolos contemporâneos da resistência negra e indígena à escravidão, dos libertadores que buscaram a independência e as repúblicas longe dos interesses exploratórios das nobrezas européias e seus sucedâneos, ou seja, toda sorte de imperialismos.



No Brasil, estamos no contexto dos duzentos anos da Fuga da Família Real e o início do Reino Unido de Portugal e Algarves, justamente promovido por integrantes da Dinastia de Borbón, em parte, antepassados de Juan Carlos.
Para os que continuam na luta pela liberdade nacional e da classe que vive do trabalho, o proletariado, muito a rememorar, nada a comemorar. Para os súditos dos reis, muito a festejar.



Entre vários historiadores, intelectuais e tradições do movimento popular são fortes os resquícios da veneração à monarquia. Na atualidade, revisões historiográficas, sobretudo influenciadas por concepções européias, em especial originárias da França, têm reconstruído uma linha de interpretação no mínimo conivente com nosso passado colonial e monárquico.



Assim como o mote do “fim das revoluções” (francesa e, por conseguinte, soviética), defendido pelo conservadorismo romântico de renegados marxistas como os historiadores como François Furet e Emmanuel Le Roy Ladurie  [3], muitas biografias de Pedro I e Pedro II, estudos acríticos sobre a monarquia brasileira e as revisões sobre o 1808, no Brasil, têm proliferado em novas edições.



Subjetivamente encantados pelo passado monárquico, enraizados numa tradição restauradora, uma linhagem de intelectuais da academia ou da mídia passam a contentar-se com o passado perdido. Descentram a análise política numa história imóvel, negam a luta de classes como motor da transformação histórica, privilegiam o privado e o mercado que ganham espaço sobre o público e o Estado, enquanto as rupturas dos novos momentos históricos são negligenciadas ou tornadas insignificantes, em prol de um retorno nostálgico a um idílico Antigo Regime. [4]
A restauração conservadora, própria dos tempos neoliberais em que vivemos, procura reconstruir uma história de consolidação do capitalismo sem conflito de classes e sem a intervenção popular no rumo das mudanças, exatamente como certa lenda da história inglesa. Enquanto isso, velhos heróis são reificados dentro de uma lógica anti-revolucionária e pretensamente sem ideologias, quando, em essência, nega-se o universalismo das mudanças em favor do cotidiano da ordem e da harmonia social.



Outro exemplo, o da França e de certo recorte histórico feito por um Guy Chaussinand-Nagaret que “opõe uma nobreza dinâmica e progressista”, inserindo-a no patrimônio nacional “para transferir suas cinzas para nosso panteão”, através de uma noção de liberdade com o intuito de preservar intactos “os privilégios honoríficos contra as aspirações igualitárias”, [5] devem nos servir como aprendizado histórico. Os duzentos anos da Corte Portuguesa no Brasil têm que servir para a reafirmação de uma história que negando o passando, anuncia o que será.



Ou podemos esquecer que foi da Casa de Bragança e Bourbon (Borbón em castelhano, de onde se origina o atual Rei Juan Carlos) que uma família real dominada pelos interesses ingleses, encontrou a “saída diplomática” para fugir para a sua mais importante Colônia, inaugurando, em 1808, o Reino Unido de Portugal e Algarves. Não sem antes retirar mais de metade do dinheiro circulante em Portugal, saquear as riquezas e o ouro de suas igrejas e deixar seu povo à mercê do domínio francês e napoleônico. Chegando aqui, abriram os portos às nações amigas, no caso somente a Inglaterra, e despejaram os habitantes cariocas de seu lares para dar lugar a uma casta de 15 mil nobres parasitas.



Não bastasse tudo isso, em 1810, em novos Tratados, reforçando a submissão com a Inglaterra, que vinha dos tempos de  Cromwell e do Tratado de Methuen (aquele que trocava vinhos portugueses por tecidos ingleses, origem da proibição de indústrias no Brasil Colonial do século XVIII), a nobreza brasileira deu mais um passo para a nossa dependência com a Grã-Bretanha. Ali, taxou os produtos ingleses em 15%, enquanto que os próprios produtos portugueses eram fixados com impostos de 16%. Além disso, os ingleses tiveram uma ilha para embarcar produtos sem taxação alguma, no caso, a Ilha de Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, uma porto livre para o contrabando e o saque de riquezas.



Foi esta mesma dinastia que, após a Revolução do Porto e a Restauração de 1820, com a expulsão dos franceses de Portugal, voltou à Europa, deixando aqui um herdeiro, aquele que, segundo a história oficial “nos deu a Independência”, porém acatou as imposições da negociata inglesa que por pressão diplomática transformou nossa liberdade política em dependência de uma dívida externa de dois milhões de libras esterlinas, ainda em 1822. Somou-se a isso uma monarquia parlamentar e constitucional que, entre as repúblicas latino-americanas, aprofundou o modo de produção escravista colonial em pleno século XIX, nos legando uma das sociedade mais desiguais da história, marcadas pelo racismo e pelo preconceito, a última a abolir a escravidão, sem falar nas formas privatistas e corruptas de Estado, gerenciado por uma classe dominante perdulária e antipatriótica, primeiro monarquista, agora capitalista.



Esta mesma classe que não titubeou em reprimir todas as revoltas por liberdade e igualdade, direcionada por uma lógica sempre questionável de progresso e modernização, na qual o nacional e o popular só interessa quando é pasteurizado e devolvido de forma harmônica, enquanto que o classista e o revolucionário é reprimido política, social e ideologicamente.



É diante de tudo isso que muitos de nós latino-americanos, cada vez mais, não nos calamos aos reis de plantão. Por isto abrimos nossas bocas e continuamos com  nossas insígnias de fora eurocentrismo, fora colonialismo, fora imperialismo e fora seus vassalos. Por isto, nos 200 anos da Corte no Brasil, nosso história pretérita só deixará de ser um fantasma quando continuarmos a parafrasear Moses Finley: “é preciso mudar o mundo, não o passado”.


[1] O grande sociólogo Octávio Ianni sempre questionou que independência política tem um país, quando é mantida a sua dependência econômica.



[2] Numa transcrição de parte do discurso pronunciado por Ortega, na sessão final do Cumbre Ibero-Americana, em Santiago, o presidente nicaragüense afirmou: “privatizaron en Nicaragua la distribución de energía, te lo comentaba ayer José Luis, y le decía también a Su Majestad, que le hice una llamada cuando se encontraba en China, con el tema de Unión Fenosa; desgraciadamente Unión Fenosa, una empresa española y no es culpa tuya, no creo que vos tengás acciones en Unión Fenosa, mucho menos Su Majestad, o el Canciller Moratinos tengan acciones en Unión Fenosa (Neste momento Juan Carlos de Borbón se retira da sala de sessões). Esa empresa española, llega a Nicaragua, dice que a ayudar para que la energía llegue a todo el país, que va a controlar el precio de la energía; llegó con los Gobiernos peleles. Nosotros no hubiéramos dejado entrar a Unión Fenosa, no hubiéramos entregado la distribución. Igualmente, entregaron el 47% de la generación, ¿Qué compraron los inversionistas? No compraron las empresas generadoras que estaban en mal estado, ¿quién las va a comprar? estaban en manos del Estado ¡esas no las compraron! Compraron, en medio de actos de corrupción, las empresas generadoras que estaban en buen estado, donde podían sacar utilidades y ganar en un año lo que estaban dando por la empresa. Sacaron lo que habían invertido y luego, ¡lo que han continuado ganando por años! Toda una mafia, esa es una actitud mafiosa, prácticas gansteriles dentro de la economía global, de la que son víctimas nuestros países, por culpa de los peleles, ¡no de los pueblos! porque ellos no son consultados, Nicaragua no ha sido consultado con estas privatizaciones”. Foi uma clara demonstração de como a exploração imperialista age em nossos países, sob o rótulo dos investimentos. Cf. o discurso na íntegra em http://www.rebelion.org/noticia.php?id=59272. Acesso em 07-01-2008.



[3] Furet, que aderiu ao Partido Comunista Francês em 1947, rompendo com este em 1956, afirmou no pós-1968: “em me sinto bem próximo dos representantes mais esclarecidos do pensamento liberal”. Ladurie, filho do ministro da Agricultura e do Abastecimento do governo colaboracionista de Vichy, em 1942, entrou jovem no PCF, saindo em 1957. Seu argumento: “meu pai tinha 12º vacas, eu gostava muito delas, li em uma revista nos anos 50, na qual se dizia que os russos tinham menos vacas do que em 1913. Eu os considerei uns infelizes com tão poucas vacas”. Em 1978, adere ao Comitê dos Intelectuais para a Europa dos Libertados, dirigido por Eugène Ionesco, que se propõe a mobilizar-se contra toda perspectiva de revolução global da sociedade. Para esta geração de historiadores, a revolução passa a ser considerada impossível, senão totalitária, o engajamento político de esquerda bem como a defesa de uma história comprometida com as transformações sociais a serem negados, “um mergulho frio no passado para preservar-se do futuro”, passando a “enfeitar Clio com o papel vestal da ordem existente”. Cf. sobre estes historiadores em DOSSE, François. Uma história em migalhas: dos Annales à Nova História. São Paulo: Ensaio, Campinas: Ed. da Unicamp,  1992, p. 214-7.



[4] Até o cinema vem fazendo esta retomada. Ver em especial o filme Maria Antonieta (2006), dirigido por Sofia Coppola e sua condescendência com a autora da famosa frase: “”Se o povo está com fome e não tem pão, que coma brioche”.



[5] DOSSE, op. cit., p. 239-40.

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