O Desenvolvimento Nacional precisa estar no centro das preocupações

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Desde a grande crise do capitalismo financeirizado, deflagrada em 2008, e que teve desdobramentos em cascatas pelo mundo, a partir do colapso de parte do sistema bancário-financeiro nos EUA, o Brasil vem se defrontando com seus efeitos. A crise avançou pela Europa, de lá foi para a Ásia e chegou à América Latina, em especial ao Brasil, a partir do final de 2012, avançando por 2013 e de lá para cá. Essa crise, no caso brasileiro, afetou profundamente especialmente o governo da presidenta Dilma Roussef, passou pelas jornadas de junho de 2013, avançou por uma duríssima eleição em 2014, com vitória por estreita margem de votos sobre o tucano Aécio Neves, teve desenvolvimento profundo em 2015 e culminou com o golpe/impeachment de 2016. No seu conjunto, aquele movimento teve um ponto de radicalização profunda, produzindo o chamado “bolsonarismo”, o enorme avanço da extrema-direita na política brasileira, gerando uma espécie de “tsunami reacionário” que resultou na eleição de Bolsonaro em 2018 e nos seus dois trágicos primeiros anos de governo.

Nos primeiros dois anos do mandado do presidente Bolsonaro, para bem além das bravatas de cunho ideológico e do “presidencialismo de colisão” levado a efeito por ele, em confrontação com outros poderes da república, escancarando ainda mais o seu viés assumidamente autoritário de defensor da ditadura militar de 64, torturas, assassinatos em massa (“tem que matar mais uns 30 mil” nas palavras dele, anos atrás), o Brasil foi exposto a uma brutal desmobilização de estruturas do Estado Nacional, principalmente através de uma bem articulada política de sucateamento de políticas, serviços e programas de atendimento ao povo, ao lado das – ainda – insuficientes privatizações em larga escala defendida pelo seu ministro da economia, Paulo Guedes. O desmonte e retrocesso para o Brasil só não foi mais devastador e extenso, porque a pandemia do Corona Vírus forçou o Congresso Nacional a aprovar o auxílio emergencial de R$ 600,00 para quase setenta milhões de brasileiros (as)! É importante frisar que o Auxílio Emergencial gerou um paradoxo temporário de grande relevância: cerca de setecentas mil empresas, especialmente micro, pequenas e médias, faliram, em um espaço de tempo muito curto, por causa da pandemia. Uma hecatombe! Por outro lado, durante todo o segundo semestre de 2020, chegamos ao menor patamar de pobreza e miséria na história brasileira. O impacto do Auxílio Emergencial foi tão profundo que a despeito da falência em massa de empresas e das necessárias medidas de distanciamento social, sistematicamente sabotadas pelo presidente da república e seus apoiadores mais radicais, Bolsonaro teve picos positivos de popularidade. O dinheiro vivo na mão do povo, ainda que pouco, alavancou temporariamente seu prestígio junto aos mais necessitados. Contudo, ao que parece, 2021 vem reservando para Bolsonaro um período de desacumulo político intenso, pelo fim do Auxílio, pelo próprio avanço da pandemia, numa espécie de “segunda onda” ainda mais brutal em contaminação e mortes, cujo caso de Manaus tornou-se um símbolo nefasto desse processo.

Levando tudo isso em conta, agregando ainda as enormes defasagens no desenvolvimento nacional acumulado ao longo do tempo, o fosso social gigantesco e o grande retrocesso brasileiro no seu setor produtivo de bens de consumo e bens de capital, a chamada “desindustrialização do país” nas últimas décadas, é absolutamente prioritário que a nação se empenhe para encontrar um novo caminho de desenvolvimento econômico-social assentado na retomada da indústria, em um novo fluxo produtivo capaz de dar sustentabilidade aos demais setores econômicos e serviços e programas públicos de atendimento ao povo.

Não é possível a qualquer nação, especialmente a um país como o Brasil, absolutamente pleno de potencialidades, desenvolver-se de modo equilibrado, coerente, contemplando o avanço nas condições da vida da maior parte da sua população, alterando também as enormes desigualdades regionais, mantendo alguns aspectos que considero distorções profundas, verdadeiras aberrações, uma delas, o baixo patamar de industrialização do país. No seu auge, a indústria “brasileira” – com forte presença de grandes conglomerados privados transnacionais nos setores de ponta da produção de bens de consumo e bens de capital – atingiu seu pico no período entre 1980 e 1985, com cerca de 27% de participação na composição do nosso PIB, conforme dados do IBGE/FIESP. Os estudos atuais apontam ainda que, tendencialmente, neste ano, 2021, chegaremos na casa dos 9%, apenas. O setor emprega menos de 10 milhões de trabalhadores (as), conforme dados da Confederação Nacional da Industria, de 2019.

Mais de 70% do PIB brasileiro na atualidade é composto pelo Setor de Serviços e Comércio, nos quais trabalhavam cerca de 40,3 millhões de pessoas, entre empregos formais e informais, conforme dados do IBGE em 2018. A participação dos “Serviços” nesse montante é insustentável no médio e longo prazo, ou seja, articulado em torno principalmente de micro, pequenas e médias empresas, esse setor se tornou vertiginosamente grande na economia nacional pela conjugação de diversos fatores, especialmente como decorrência da desindustrialização crescente, associada à substituição de mão-de-obra por inovações tecnológicas aplicadas aos setores produtivos. Parte dos (as) trabalhadores (as) demitidos pelas indústrias foram buscar no “empreendedorismo” alternativas para garantir sua subsistência. Proliferam nas grandes e médias cidades os micros e pequenos negócios, entre comércio e serviços, geralmente com enorme instabilidade financeira, baixa capacidade de sustentação das empresas por um prazo ao menos médio – cerca de 50% das empresas abertas neste ano encerrarão suas atividades em até cinco anos! – e empregando trabalhadores (as) de modo informal. Todos os dados acima não consideram o cenário da pandemia do Corona Vírus, o que, evidentemente, está impactando todos os setores, e precisaremos de mais tempo para melhor avaliar seus impactos.

No enfrentamento que as forças efetivamente patrióticas precisam fazer para impedir a perpetuação do neofascismo bolsonarista, essencialmente entreguista e destruidor do Estado Nacional como condutor de políticas publicas positivas, como indutor do desenvolvimento econômico e gerador de programas sociais e serviços públicos de atendimento à massa trabalhadora mais carente, é preciso a composição de um grande Projeto Nacional de Desenvolvimento que tenha como alicerce fundamental a retomada da industrialização, dos setores produtivos, da infraestrutura do país, que são a base fundamental de qualquer economia desenvolvida. Não é viável, no médio e longo prazos, sustentar políticas públicas, programas sociais amplos, sem que a economia esteja fortemente alicerçada em uma intensa produção de bens de capital, bens de consumo e ampliação da infraestrutura.

Todos os países – inclusive o Brasil, ainda que com limitações e distorções – que alcançaram índices avançados de desenvolvimento social, o fizeram alicerçados fortemente na produção real, no desenvolvimento das forças produtivas. A composição de uma ampla frente política contra Bolsonaro, a articulação de uma alternativa viável de poder no Brasil, precisa se assentar na urgência da retomada da geração de emprego e renda em quantidade e com qualidade. É falsa a dicotomia entre quantidade e qualidade (“é preciso ter empregos sejam de que tipo for, por exemplo, o que importa é ter empregos”). Assim como é falsa a visão de que basta ter programas compensatórios, de distribuição de renda através de instrumentos como o Bolsa Família e o Auxílio Emergencial. Não se trata de encerrá-los, mas se trata, sim, de possibilitar ao povo acesso a empregos em larga escala mas que sejam ao mesmo tempo qualificados, que demandem a formação de mão-de-obra qualificada em todos os setores estratégicos para o desenvolvimento nacional. Uma Frente Ampla, necessária e justa para evitar a tragédia da permanência de Bolsonaro à frente do país, não pode ser restrita a escolher este ou aquele nome. Precisa ter uma Plataforma de recuperação da economia do Brasil.

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