O Hip-Hop Está Vivo!

"(…) é que aquele sábio Frestão, que me roubou o aposento e os livros, transformou estes gigantes em moinhos, para me falsear a glória de os vencer, tamanha é a inimizade que me tem; mas ao cabo das contas, pouco lhe hão-de valer as suas más artes contra a bondade da minha espada." (Dom Quixote)
 

22 de janeiro de 2012 data histórica para o Hip-Hop brasileiro. Pensar que há 7 anos uma par de maluco de todo o país se juntaram em São Paulo para fundar a Nação Hip-Hop Brasil. Entidade que nasceu para fazer luta, luta política.

É precisamente isso que me proponho fazer nesse domingo ao sair de casa.  Na mochila carrego livros e a lembrança daquele fatídico dia. Sexta-feira, 23 de dezembro ante vespera de natal. O Twitter foi o X9 que caguetou a tragédia, depois assisti as imagens ao vivo na tv. Aquelas cores vibrantes, o brilho intenso, não eram de uma árvore decorada com luzes piscantes e presentes. Eram chamas, labaredas que devoravam sem dó o lar de famílias. Tumulto, alvoroço, quem sabe criminoso?

Mas hoje não. É festa, reconstrução!

O primeiro soco no estômago veio antes de atravessar a linha do trem. Uma faixa de pano me acolheo com as boas vindas.

Rima pobre é isso:
Enquanto pisava no chão queimado do Moinho.
A polícia abria fogo na comunidade do Pinheirinho.

Mundano, Milton Sales, Marcio Salata, só para citar alguns que me recepcionaram e logo fizeram surgir uma mesinha, uma cadeira, canetas e eu entrei com os livros. Numa eficiencia de fazer inveja em grandes centros culturais. Mas ainda faltava algo para inaugurar aquela rustica livraria a céu aberto. Chapei, na arte do meu chapa Mundano. Numa chapa queimada de madeira, um pedaço do que foi um dia barraco, agora carbonizado, graffitado, se lia: “Livros R$ 20,00. Renda destinada para a comunidade do Moinho”.

Tudo alí, no extremo oposto ao palco, atrás do gol.
– Que loco! – Pensei sozinho quando recordei, de um debate que participei e disse que estava disposto a jogar de gandula se fosse preciso.

Diante das torres imponentes, invictas aos explosivos de Kassab, meus problemas parecem microscópicos.

Os grupos de rap se apresentam em um ato solene das quebradas, show beneficiente como eu não via há tempos, há anos.
– O Hip-Hop vive! – Falei ao Buzo.
– Não é contradição ao título de seu livro? – Ele me inquerio.
– Né não. Metáfora não é privilégio só deles… Ironia nois também sabe usá.

Eu ví. Hian e Samara naquela tarde. Delírio? Figura de linguagem? Não foi só eu quem viu. Mas como canta o Versão Popular: “Quem viu, viu”.

Foi lindo ver 3 dias depois Sergio Vaz ganhar 3 prêmios do governador e dedicar para as mesmas comunidades que este senhor causou terror.

Levei uns 150 minutos, para esgotar os livros que enchiam minha mochila. Foi o suficiente para conhecer gente, reecontrar velhos parceiros que a muito não via, tirar fotos, dedicatórias e entrevistas.

E aquela voz que conversa com agente pesava:
– Se promovendo com a desgraça alheia!
No dia seguinte estava nos blogs, sites, na nossa CNN da favelas, fotos, declaração.

Mas tiu, eu num tinha intenção. Lançamentos de meu livro serão em março, isso aqui é convicção, não promoção.
Ligação com a comunidade? Vem dos almoços com o Miltão, que vira e mexe repete que o Moinho é o meu escritório, poderia ir pra favela escrever sempre que me faltar inspiração. Acompanhei a gravação para o programa Estação Periferia, possivelmente a última equipe de TV na comunidade antes do incêndio.

Num barraco velho o graffite novo era orgulho: "Pedras no caminho? Guardo Todas… Um dia construirei um castelo" (FP)

A chuva comum nesses dias no meio da tarde, se segurou e dividiu o dia com a noitinha. Águas no Moinho mandou de volta os turistas deixando a festa exclusiva para os moradores.

Sei como é ser expulso de seu lugar, é pra lá que agora volto, com uso campeão que eu mesmo forjei. O mundo é um moinho!

Foi loco ver o Moinho Vivo e o Hip-Hop Vivo!

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