O Milagre – A ciência vencerá!

O filme se passa na Irlanda e retrata a luta de mulheres contra o fundamentalismo religioso num período de doenças, emigrações, desigualdades sociais e fome

Cena do filme O Milagre l Foto: Divulgação

Ao assistir o filme O Milagre, imediatamente fazemos uma analogia com os tempos atuais, resguardando aspectos conjunturais de tempo (de períodos históricos), quando vivenciamos o drama cruel da negação de vacinas que poderiam ter salvo milhares de vidas que se foram, muitas delas pela falta de imunização da Covid-19. Ainda, a veiculação cotidiana de palavras e frases bíblicas, pronunciadas sem nenhuma responsabilidade ética, a demonização de pessoas que ousavam discordar do fundamentalismo religioso que, utilizando a religião e a fé como instrumento de dominação das mentes e dos corpos das pessoas, trouxeram tempos medievais em pleno século XXI.

A película O Milagre, uma adaptação do livro homônimo de Emma Donoghue – escritora irlandesa de ficção contemporânea e histórica, que também é roteirista no filme, juntamente com Alice Birch – dirigido pelo chileno Sebastián Lelio, conta com atuação central de duas mulheres: uma enfermeira Elizabeth “Lib Wright” (Florence Pugh), uma freira, Irmã Ryan (Josie Walker) e uma menina de 11 anos, Anna O’Donnell (Kila Lord Cassidy). Retrata uma situação em que a comunidade busca descobrir como Anna consegue sobreviver sem se alimentar em um período de 4 meses. O comitê científico, composto por médico e padre, convoca Lib e a irmã para acompanharem essa situação que mascara uma realidade de fome, de uma comunidade atrasada, de fundamentalismo religioso e de falta de sentido para a vida de muitas pessoas do lugar. O filme, que se inicia em um cenário de estúdio de cinema, se transfere para o ano de 1862, 13 anos após a Grande Fome. Um período de doenças, emigrações, desigualdades sociais e fome, ocorrida de 1845 a 1849 na Irlanda, que provocou a morte de cerca de um milhão de irlandeses e a emigração de outros um milhão de pessoas, principalmente  para os Estados Unidos, causando a redução de 20 a 25% da população.

A título de justificar a miséria e o obscurantismo, a justificativa de um milagre, feita principalmente pelo médico, de que Anna sobrevive pela energia, acaba por ser contestada por uma das mulheres que advogava pela ciência. Ela enfrenta os poderosos, constituídos por figuras patriarcais, que se perpetuam em nossa sociedade como referências de poder até nossos dias.

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O longa, que pode ser assistido na Netflix, tem trilha sonora impactante de Matthew Herbert, que facilita para que nos prendamos ao seu enredo, que mistura com a fotografia marcante e lembra nostalgia, abandono de uma sociedade marcada pelo obscurantismo e pela imposição e submissão de meninas à provação divina. A forte atuação de Florence Pugh que, decidida a decifrar o fanatismo, é movida por libertar-se também de seus pesadelos e livrar a menina Kila Lord Cassidy, que também tem atuação inequívoca de sua tarefa de responder aos desejos de sua mãe e de sua comunidade, é marca indelével da película.

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Conforme afirma Gaudêncio Frigotto (*), citando José Luiz Fiori, o período do então ex-presidente genocida, manifestou-se por uma “agenda de guerra cultural contra a diversidade, o pensamento divergente e marcada pelo negacionismo da ciência e pelo fundamentalismo religioso”. No entanto, para Frigotto, o fundamentalismo religioso é o mais perverso de todas as expressões, pois “não se guia pela racionalidade, mas pelo dogma e em nome de “Deus” destila violência e ódio.”

Luciana Santos ao tomar posse como Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação

A analogia que destacamos no início desse texto se refere à completa negação da ciência, totalmente contestada pela enfermeira, que pode ser indicada como exemplo na conjuntura atual, quando se desvenda os horrores praticados pelo governo de Bolsonaro, e volta-se para a defesa da ciência, tecnologia e inovação, ao assumir para a pasta desse Ministério Luciana Santos, engenheira eletricista, negra e nordestina que ressaltou em sua fala que a longa jornada a ser enfrentada para recolocar a ciência no centro da vida das pessoas. A nova ministra está firme e determinada, juntamente com o governo Lula, para enfrentar os desafios. Evidenciou Luciana: “temos um povo talentoso, capaz, construindo experiências diversas em cada recanto desse país. Vamos aproveitar a inteligência brasileira. Vou usar essa motivação e experiência na gestão pública para fazer valer o fato histórico de ser a primeira mulher ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil”.

Serviço:

O Milagre (The Wonder) | EUA, 16 de novembro de 2022

Título original: The Wonder

Direção: Sebastián Lelio

Roteiro: Sebastián Lelio, Alice Birch

Duração: 108 minutos

País:Irlanda, Reino Unido, Estados Unidos

Gênero:drama, thriller

Elenco: Florence Pugh, Tom Burke, Niamh Algar, Elaine Cassidy, Dermot Crowley, Brían F. O’Byrne, David Wilmot, Ruth Bradley, Caolán Byrne, Josie Walker, Ciarán Hinds, Toby Jones, Kíla Lord Cassidy Classificação: 14 anos

Referências:

https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rdciv/article/viewFile/66270/41708

https://www.fap.df.gov.br/luciana-santos-assume-como-primeira-mulher-ministra-da-ciencia-tecnologia-e-inovacao/

https://www.papodecinemateca.com.br/2022/11/o-milagre-florence-pugh-deslumbra-como.html

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