Os invisíveis e justiça para Moïse

Há mais de 500 anos este país ignora a morte de pobres, negros e favelados

Ilustração: Nando Motta

Uma semana. Esse foi o tempo que a polícia do Rio de Janeiro demorou para começar a investigar, de fato, a morte do jovem africano Moïse Mugenyi Kabagambe, de 24 anos.

 “Após vários protestos de amigos e familiares, o inquérito andou. Foi uma semana praticamente sem nada ser feito”, afirmou um membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ.

Não demora algum cínico ou desavisado esbravejar “direitos humanos para humanos direitos”. Esses esquecem, ou fingem esquecer, que há mais de 500 anos este país ignora a morte de pobres, negros e favelados.

Na doente sociedade brasileira, marcada por uma profunda desigualdade social e individualismo extremo, morrem, todos os dias, estrangeiros e brasileiros.

Eles morrem por um pedaço de pão. Morrem pela ausência do Estado, de justiça, por falta de oxigênio nos hospitais públicos. Morrem vítimas do desemprego ou pela falta de segurança no próprio trabalho. 

Moïse Mugenyi Kabagambe chegou ao Brasil quando tinha 13 anos de idade. Veio com outros familiares fugindo da Guerra Civil em seu país, a República Democrática do Congo.

Aqui, logo começou a trabalhar. Foi garçom em restaurantes, atendente em lanchonetes e quiosques. O seu sonho era juntar dinheiro para visitar o irmão que morava na França. Moïse nunca teve a carteira assinada pelos seus patrões.

No dia 24 de janeiro, Moïse Mugenyi Kabagambe foi morto a pauladas perto de um quiosque na Barra da Tijuca. Ele tinha ido até o local cobrar o salário atrasado. O valor: R$ 200 reais.

Segundo testemunhas, o jovem, que ainda tentou escapar correndo, foi alcançado pelos assassinos. Em seguida, Moïse teve pés e mãos amarradas. Durante a tortura, ele pediu pela própria vida. De nada adiantou. Após a sua morte, o quiosque continuou funcionando normalmente. A indiferença também mata.

Neste exato momento, existem outras pessoas sendo mortas e torturadas nesse país. De acordo com as estatísticas, a maioria desses crimes não serão solucionados. As vítimas são, na maioria, “invisíveis”. Nesses casos, a injustiça é regra. Não exceção.

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