Polarização de quem com quem?

Frequentemente a evolução do quadro político em situação crítica (como o Brasil de agora) escapa à vontade subjetiva dos principais atores em presença.

Fala-se com insistência em “polarização “, mirando o próximo pleito presidencial.

Da parte do PT e de alguns dos seus seguidores, seria a tese mais apropriada para justificar uma candidatura própria, provavelmente do ex-presidente Lula, sobretudo agora que recuperou seus direitos políticos.

Lula seria, assim, a alternativa potencialmente mais forte para o enfrentamento do atual presidente, situado na extrema direita.

O entrechoque desses extremos conduziria a um segundo turno onde uma maioria seria levada a apoiar Lula, alguns o considerando um mal menor do que Bolsonaro.

Na grande mídia monopolizada, hoje às turras com o bolsonarismo, muitos apostam que essa disputa abriria espaço para uma candidatura de apelo popular — ao estilo outsider — apoiada nas forças de centro e centro-direita amplamente vitoriosas no último pleito municipal.

De outra parte, agrava-se a polarização social objetiva, na medida em que a pandemia aumentou a concentração da produção, da renda e da riqueza e acelerou a exclusão de milhões dentre os mais pobres.

Mas seria simplista em demasia imaginar que o conflito na base da sociedade possa automaticamente se refletir na esfera política.

Há a mediação de muitos fatores, entre os quais a movimentação real de lideranças e partidos e a influência midiática na informação e formação da consciência política da maioria.

Dentre os que incentivam a polarização Lula-Bolsonaro, há quem aposte que o desgaste tanto do bolsonarismo quanto do petismo favoreceria uma candidatura de centro-esquerda.

Aposta semelhante fez o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, quando da reeleição de Dilma Rousseff. Eduardo pretendia superar Aécio ou a própria Dilma e se constituir na alternativa nova capaz de vencer o pleito num segundo turno.

Seria um candidato de chegada, imaginava.

Marina Silva, que o substituiu, ficou longe disso.

Algo semelhante tenta agora Ciro Gomes, que bate duro em Lula e no PT e também em Bolsonaro, na expectativa de atrair parcelas expressivas do centro e mesmo do centro-direita.

Mas, como observou “Marx no 18 Brumário”, frequentemente a evolução do quadro político em situação crítica (como o Brasil de agora) escapa à vontade subjetiva dos principais atores em presença.

Toda a cautela é válida. Sobretudo para quem trabalha pela construção de uma ampla coalizão de forças no campo popular e progressista, capaz de derrotar a extrema direita.

Vale agora o adágio tão do gosto dos nordestinos: “devagar com o andor, que o santo de barro.”

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