As bestialidades de Jair Bolsonaro

Não se pode esperar um comportamento com traços de humanismo de quem, como o presidente Jair Bolsonaro, se move pela ideologia que trucidou às centenas nas masmorras da ditadura militar. Só um ser guiado pela perversidade pode elogiar a barbárie e advogar o seu uso como método de governo e de convivência social.

Daí a naturalidade com que ele se manifestou, por exemplo, nos casos dos brasileiros que estavam na China e, temendo a epidemia de coronavírus, pediram para serem trazidos para o Brasil, e da “pessoa com HIV” ser “uma despesa para todos aqui no Brasil”. Nessas manifestações está toda a sua desumanidade e brutalidade.

O presidente tem se manifestado reiteradamente nesse tom, como as ameaças aos povos indígenas, com mortes provocadas por latifundiários, e o desrespeito aos nordestinos. Sem falar em questões mais gerais, como o ataque aos direitos dos trabalhadores e dos estudantes, o arrocho no salário mínimo, a “reforma” da Previdência que dificulta a aposentadoria e a redução de recursos para a educação, para as bolsas de pesquisas, entre outras medidas contra os interesses do povo.

Bolsonaro é incapaz de compreender a importância das pessoas individualmente. Ele refinou e assimilou a ideologia que se recusa a seguir as regras que conduziram a humanidade por muitos e muitos quilômetros no caminho da sua desanimalização. É a ideia da bestialização rediviva, da máxima de que a violência sempre existiu e sempre existirá no convívio humano.

Os arroubos bolsonaristas são a expressão do pensamento vulgar de que há setores da humanidade com a natureza propícia à transgressão. A solução seria exterminar os que seriam exterminadores. Esse pensamento se traduz em slogans tão em moda como os de que bandido bom é bandido morto e de que bandido tem que morrer. Ou em manifestações como essas sobre os brasileiros na China e a “pessoa com HIV”.

Essa teoria difunde, deliberadamente, a tese de que a defesa do humanismo – o tão agredido conceito de direitos humanos – é uma tentativa de socializar culpas e não a condenação de atos como o do facínora Carlos Alberto Brilhante Ustra, o ídolo e ideólogo de Bolsonaro. Consequentemente, acha que as ideias do humanismo, as forças da civilização, são coisas de quem defende bandidos e baderneiros.

As artes, o conhecimento científico, filosófico e social, a compreensão dos valores humanos edificados ao longo da história e a luta pela elevação do bem-estar social baseado na igualdade fraternal são, por conseguinte, o alvo dos arautos da barbárie, como Bolsonaro. Em seu lugar, floresce a prática afeita ao tempo dos clãs, quando não havia noção do Direito e da justiça; a ordem era a vingança.

Em outros tempos, essa ideia de Bolsonaro serviu de base para um projeto de eugenia, de limpeza social. Seus atos, indiscutivelmente de viés discriminatório, estimulam crimes acobertados pelo manto da impunidade. Não há justificativa para se ficar indiferente quanto a eles, não respondê-los com contundência. Nem tampouco deixar de repudiar a sua conhecida truculência.

É preciso responder à opressão com resistência, não aceitando as opiniões de que as injustiças são irremediáveis – um revés da vida ditado por algum destino manifesto. Essa ideia bestial de Bolsonaro é a mesma que corrobora um modelo de governo que cria as condições para lucros com a troca de favores, com a sonegação de impostos e com a imposição de preços altos e salários miseráveis.

Bolsonaro, nesse aspecto, reaviva a elite brasileira, que se fez à custa do trabalho escravo. Durante quase quatro séculos, povos trazidos da África ergueram usinas e engenhos, povoados e igrejas sem receber salários. A ideia dos três pês – pão, pano e pau – ainda vigora nas relações sociais. Isso explica o atraso econômico e as injustiças sociais. Por tudo isso, esses atos de Bolsonaro precisam ser duramente repudiados.