Brasil “quebrado” é mais uma falácia de Bolsonaro

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O pretexto do presidente Jair Bolsonaro de que o Brasil está quebrado para tentar justificar por que não consegue governar é um desatino. Para uma economia que ostenta um Produto Interno Bruto (PIB) superior a R$ 7 trilhões, com uma industrialização média e um enorme potencial produtivo, falar em quebra é uma tentativa de fugir da realidade e de suas responsabilidades, uma manobra para justificar fracassos injustificáveis.

Bolsonaro não pode se esconder em sua confessa ignorância sobre o assunto, até porque o Estado brasileiro tem instrumentos que podem municiá-lo diariamente sobre a realidade do país. Ademais, há uma profusão de estudos mostrando que a penúria da economia brasileira tem a ver essencialmente com uma opção de administração do Estado que não prioriza a dinâmica produtiva.

A crise que se arrasta há mais de meia década decorre da opção de restabelecer a ordem neoliberal, que tantos males causou ao país e ao povo na década de 1990, agora com uma agressiva política entreguista, um neocolonialismo radicalizado e escudado na gestão macroeconômica ultraliberal do ministro da Economia, Paulo Guedes. Tudo isso embalado pela demagogia de que uma vez feita a “lição de casa” os capitais fluiriam para cá na forma de investimentos maciços.

Esse pensamento é a nata da visão da elite brasileira, aquilo que o escritor Lima Barreto chamou de síndrome de Robinsons – um sentimento de que algum navio venha salvar o país da ilha a que um náufrago o atirou. No caso de Guedes, seria uma “avalanche” de investimentos de capitalistas que viriam para cá atraídos pela austeridade fiscal e pelo absoluto controle do orçamento segundo os cânones do mercado financeiro.

Essa é uma tese antiga dos liberais e neoliberais brasileiros. Reflete o desinteresse da elite sem compromisso com o país e com o povo. Quase na virada para o século XX – apenas há pouco mais de 100 anos, portanto –, o Brasil era monarquista e escravocrata. Desde então, o que houve de desenvolvimento e progresso social veio pelas mãos do Estado. É possível dizer que se o país tivesse dependido unicamente do capital privado, provavelmente teria demorado muito mais tempo para superar a fase meramente agropastoril.

Os números mostram a falácia de Bolsonaro e o papel nefasto desse programa ultraliberal e neocolonial de Guedes. O Brasil gastou relativamente pouco no enfrentamento à Covid-19, de acordo com um levantamento do Bank of America Merryll Lynch (BofA) que comparou a combinação de estímulos fiscais e monetários em 97 países, em 2020. Foram mobilizados o equivalente a 11,2% do PIB, o percentual mais baixo entre as dez maiores economias do mundo; nas economias mais ricas, os estímulos totais somam no mínimo 37,5% do PIB.

Há ainda a falta de perspectiva de retomada de crescimento – uma decorrência da síndrome de Robinsons de Paulo Guedes – e a má distribuição da renda nacional. Um relatório macroeconômico da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) estima que enquanto o PIB deve cair 4,7%, a fatia de cada um dos brasileiros nas riquezas totais produzidas encolherá 6,3%. Para atingir a renda per capita de 2013 (melhor resultado das últimas duas décadas), o Brasil levará, no ritmo atual, ao menos dez anos.

Esse pronunciamento de Bolsonaro se insere no seu já conhecido rol de irresponsabilidades. Obcecado pelo projeto de poder autoritário, ele se mostra, a cada manifestação sobre os problemas do país e do povo, incapaz de formular raciocínios inteligíveis, que possam apontar perspectivas de enfrentamento à crise de saúde por conta da Covid-19 e, consequentemente, aos graves problemas da economia. Na verdade, ele apenas deu mais um motivo para os movimentos de soma de forças para isolá-lo e derrotá-lo.