China: a garantia à propriedade e o socialismo

A Assembléia Popular Nacional da China acaba de aprovar duas medidas que, tudo indica, terão grande impacto no desenvolvimento do país. A imprensa do grande capital que, como sempre, confunde a cobertura jornalística com a propaganda de suas próprias idéias, apresentou estas mudanças como um reforço daquilo que considera como uma guinada do país para o capitalismo; a manchete de “O Estado de S. Paulo”, por exemplo, diz: “China admite propriedade privada”. E seu comentarista, o francês Giles Lapouge, afirma que hoje, “em vez de forjar 'o comunismo', [China] pretende antes dissolver o socialismo em estruturas cada vez menos estatais, cada vez mais liberais” – isto é, capitalistas.



Trata-se, porém, mais de torcida do que propriamente de noticiário. As medidas adotadas pela Assembléia Popular são revestidas, sem dúvida, de forte controvérsia. A primeira dá garantias à propriedade e foi aprovada com 2.799 votos; 52 foram contra, 37 deputados se abstiveram e um não votou. A outra é a lei sobre o imposto de renda das empresas; além disso, foram debatidas medidas de caráter social para amparar os setores mais pobres, principalmente os camponeses.



A primeira lei assegura igual proteção para todas as formas de propriedade (estatal, comunal e privada), enquanto a outra iguala os impostos pagos pelas empresas que atuam no país. Por sua vez, a lei de imposto de renda das empresas impõe mesma taxa de 25% para as nacionais e estrangeiras. Até agora, as chinesas pagavam 33% e as estrangeiras, apenas 15% de impostos, um privilégio adotado no final da década de 1970, para atrair investimentos externos. Hoje a China não precisa mais disso, diz Zhang Yansheng, diretor do Instituto de Pesquisa de  Economia Internacional, subordinado à Comissão Estatal de Desenvolvimento e Reforma. “O capital e as divisas já não constituem o principal problema para o desenvolvimento econômico chinês, motivo pelo qual perdem o status de objetivo prioritário para atrair investimentos estrangeiros”.



Um dos problemas mais agudos atacados pela lei de propriedade é a garantia da posse da terra pelos camponeses. Hoje, as zonas rurais chinesas vivem inúmeros conflitos gerados pela resistência dos lavradores contra autoridades locais que os desalojam de suas terras, muitas vezes para cedê-las a empreendimentos industriais. Em benefício dos camponeses, a lei assegura a proteção das terras cultiváveis, restringindo fortemente seu uso para construções e outros. Garante também que “nenhuma unidade ou indivíduo poderá malversar, distribuir ilegalmente, deter ou pagar de maneira negligente as compensações pela expropriação ou outros direitos”.



“A elaboração da lei de propriedade corresponde à necessidade de apoiar o sistema econômico socialista, regular a ordem da economia de mercado socialistas e salvaguardar os interesses do povo”, disse Wang Zhaoguo, vice-presidente do Comitê Permanente da APN, segundo a agencia Xinhua.



Mas não são apenas os problemas de ordem econômica que preocupam as autoridades chinesas. A ANP debateu também os problemas relacionados à educação, moradia, assistência medida e previdência social, elevação da renda dos camponeses, o desemprego e os desafios do envelhecimento da população. Wu Banggo, presidente da Comissão Permanente da ANP, enfatizou a necessidade de dar aos assuntos sociais a mesma atenção dada à melhora da legislação econômica, concentrando-se em “fortalecer as leis relacionadas com os programas sociais para proporcionar uma sólida base leal à construção de uma sociedade socialista harmoniosa”.



Nesse sentido, é preciso estudar melhor para compreender em profundidade as mudanças feitas pelo parlamento chinês, ao contrário do que fazem os analistas da imprensa das grandes empresas, apressados em enxergar nelas apenas um alegado retorno ao capitalismo.