Decisão do STF sobre o Telegram, um avanço para nossa soberania

Há algo de inédito e histórico na decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), de enfrentar o Telegram. Na quinta-feira (17), a pedido da Polícia Federal, Moraes mandou suspender, em todo o território nacional, o funcionamento desse aplicativo de mensagens, que está em expansão no País, mas vinha se negando a colaborar com a Justiça, como se estivesse acima da lei.

O Telegram não tinha representação legal no Brasil nem adotava protocolos para moderar conteúdos. Não é por acaso que hordas bolsonaristas o escolheram como plataforma preferencial para a disseminação de fake news e discursos de ódio. Além disso, conforme reportagem do jornal O Globo, são tão abundantes quanto acessíveis nesse app “conteúdos como pornografia infantil, vídeos de tortura e execuções, apologia ao nazismo, comércio ilegal e uma rede de desinformação sobre vacinas”.

Em 2021, tanto o Ministério Público quanto o Supremo Tribunal Federal já haviam tentado contato com a empresa que administra o aplicativo. Mas não houve – nem seria possível haver – notificações judiciais, devido justamente à falta de representantes legais do Telegram no País.

Em dezembro passado, foi a vez de Luís Roberto Barroso, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e também membro do STF, tentar comunicar-se com o diretor executivo do Telegram, Pavel Durov. O ministro sugeria uma reunião para “discutir possíveis formas de cooperação sobre o combate à desinformação”, uma vez que o aplicativo estava “presente em 53% de todos smartphones ativos” no País. “É por meio do Telegram que muitas teorias da conspiração e informações falsas sobre o sistema eleitoral estão sendo disseminadas sem qualquer controle”, alertava Barroso.

Uma valorosa iniciativa liderada pelo ministro, o Programa de Enfrentamento à Desinformação na Justiça Eleitoral, já contava com a adesão de plataformas como Google, Facebook, Instagram e WhatsApp. Já o Telegram, além de não colaborar com o TSE nesse programa em especial, nem sequer recebeu o ofício de Barroso. Os Correios informaram não ter encontrado ninguém no endereço indicado no ofício. Todos os e-mails do TSE ao Telegram voltaram.

Assim, desde janeiro, Barroso estudava uma reação mais enérgica, cogitando até o bloqueio do aplicativo. “Nenhum ator relevante no processo eleitoral de 2022 pode operar no Brasil sem representação jurídica adequada, responsável pelo cumprimento da legislação nacional e das decisões judiciais”, reforçou o ministro, em nota. Alemanha, Itália e outros países já iniciaram uma cruzada contra o Telegram, que, mundo afora, virou uma nefasta referência na disseminação de mensagens neonazistas, antivacinas e desinformativas.

Ainda assim, na opinião de Barroso e de outros ministros, aplicativos do gênero demandam, mais do que tudo, uma legislação específica e atualizada, que leve em conta os riscos do uso dessas plataformas digitais para a democracia. Na Câmara Federal, o deputado Orlando Silva é relator do Projeto de Lei Nº 2.630/2020, o “PL das Fake News”, que prevê regras para moderação de conteúdo em aplicativos com mais de 10 milhões de usuários.

Se a proposta for aprovada, haverá responsabilidades mais claras tanto para usuários quanto para os aplicativos, com direito à defesa e sanções que vão da multa ao bloqueio das plataformas. As empresas serão obrigadas a nomear representação legal no Brasil, enquanto as chamadas “contas de interesse público” – de presidente da República, governadores, prefeitos, senadores e deputados – deverão ter uma transparência ainda maior. Trata-se, segundo o relator, de uma regulamentação que não atinge a liberdade de expressão – mas, sim, coíbe irregularidades e preserva a soberania nacional.

Por tudo isso, a decisão do ministro Alexandre de Moraes nada tem de intempestiva ou unilateral. É uma medida que reflete preocupações maiores não apenas com eleições seguras – mas com o combate às fake news e a nossa soberania.

No final, o próprio Telegram atendeu, enfim, a uma determinação da Justiça brasileira, desculpou-se pela “negligência”, indicou o advogado Alan Campos Elias Thomaz como seu representante legal no Brasil e anunciou sete medidas para combater a desinformação. Além disso, foi removida uma publicação no canal de Jair Bolsonaro no aplicativo em que o próprio presidente disponibilizava links para um inquérito sigiloso da Polícia Federal. Com isso, Moraes revogou sua determinação.

Que a corajosa e bem-sucedida decisão de Alexandre de Moraes e do STF seja um marco deste Brasil que está na iminência de viver mais uma eleição presidencial e segue na busca por sua plena soberania. Garantir o respeito às leis brasileiras é condição prioritária para que esses aplicativos possam executar seus serviços sem pôr em risco a soberania nacional e o Estado Democrático de Direito. Avançamos!