Latifúndio prova do próprio veneno: a  CPI contra Kátia Abreu

A senadora Kátia Abreu (DEM-TO) destaca-se no Congresso Nacional por sua agressividade “moderna” contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ela é presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), entidade que reúne os latifundiários, muitos dos quais defendem métodos ilegais, entre eles a organização de milícias armadas voltadas contra a luta pela reforma agrária.

A senadora prometeu modernizar as formas de atuação dos latifundiários adotando formas jurídicas e políticas de pressão contra os trabalhadores rurais. Tornou-se uma das campeãs na exigência de criminalização dos movimentos sociais e, no Congresso, esteve à frente da articulação da CPI para investigar supostas irregularidades financeiras cometidas por cooperativas ligadas ao MST.

Tudo indica, entretanto, que a senadora encara a legislação de forma muito particular e, tentando usar as instituições como arma contra os trabalhadores rurais, deixa na sombra as suspeitas de irregularidades das quais ela própria teria compartilhado.

No final de novembro a revista Carta Capital publicou uma ampla reportagem denunciando a existência de um complô formado por figurões do estado de Tocantins para apropriar-se de terras alheias. Se fossem trabalhadores rurais, seriam imediatamente classificados de “invasores”. Mas tratam-se de figuras que rodeiam, e controlam, o poder público naquele estado. São figuras contra as quais não passa pela cabeça dos incansáveis defensores da inviolabilidade do direito de propriedade de pressionar a justiça pela emissão de ordens judiciais de reintegração de posse…

Mas o direito de propriedade que defendem é o seu próprio, e o de seu grupo, que não se acanha de usar sua influência política para atropelar igual direito, só que de pequenos lavradores. Segundo a revista, a senadora teria sido uma das principais beneficiadas daquele esquema que, usando decisões judiciais suspeitas, que desconsideraram o direito constitucional à posse da terra de pequenos lavradores na região de Campos Lindos (TO), os expulsaram de suas glebas que, depois, foram repassadas aos comparsas ilustres daquele conluio a preços irrisórios. Terras que, antes disso eram produtivas e agora estão tomadas pelo mato. A reportagem relata inclusive o uso de influência pessoal da senadora no Judiciário de Tocantins para obter vantagens nesse esquema. “Foram ações do poder público que lhe garantiram praticamente de graça extensas e férteis terras do cerrado de Tocantins”, registrou a revista.

Uma vítima desse esquema foi o agricultor Juarez Vieira Reis, expulso de terras que sua família ocupava desde 1948. O Ministério Público de Tocantins desconsiderou o constitucional direito à usucapião (que reconhece a posse pacífica de terras ocupadas a mais de cinco anos). Nem levou em conta uma ação de usucapião ajuizada pelo agricultor em 2000. Em 2003 a justiça de Tocantins classificou aquelas terras de “grilagem”, abrindo caminho para a expulsão de Reis e sua família, cujas terras foram apropriadas pela senadora Kátia Abreu. Outras famílias da região sofreram ações semelhantes e as terras que ocuparam foram parar nas mãos de latifundiários que faziam parte daquele esquema expropriatório.

Para investigar esse esquema um grupo de deputados federais apresentou à Comissão de Agricultura da Câmara um requerimento exigindo explicações da senadora sobre aquelas denúncias. A proposta enfrenta as previsíveis resistências de parlamentares do DEM e da bancada ruralista, mas seus autores estão dispostos a superá-las e fazer aqueles representantes da grande propriedade rural engolirem seu próprio veneno. Quem ganha com isso é a democracia e o progresso social em nosso país.