O duplo fracasso de Bolsonaro e Guedes

Paulo Guedes e Jair Bolsonaro

Um fracasso em dose dupla. Assim pode ser definido o programa econômico do governo do presidente Jair Bolsonaro, concebido e comandado por seu ministro da Economia, Paulo Guedes. Em primeiro lugar, ele não serviu à promessa de retomada do crescimento, mostrando ser um fiasco já no início do governo. A ideia de Guedes de que bastaria arranjar R$ 1 trilhão, via “reforma” da Previdência, para tampar o buraco fiscal e tudo estaria resolvido naufragou na partida.

Em segundo lugar, com a letargia instalada no governo a equipe do ministro começou a debandar. Abandonaram seus postos Joaquim Levy (BNDES), Marcos Cintra (Receita Federal), Marcos Troyjo (Comércio Exterior), Rubem Novaes (Banco do Brasil), Caio Megale (Fazenda), e Mansueto Almeida (Tesouro Nacional). Mais recentemente, pularam fora Salim Mattar (secretário especial de desestatização) e Paulo Uebel (responsável pela secretaria especial de desburocratização).

As alegações são variadas, mas chama a atenção a coincidência de motivos dos dois últimos a abandonar o barco, segundo o próprio Guedes. “A privatização não está andando, prefiro sair”, teria dito Mattar. “A reforma administrativa não está sendo enviada, prefiro sair”, teria alegado o segundo. Os dois motivos convergem para a pauta contracionista do governo Bolsonaro, centrada no entreguismo e no desmonte do Estado.

Bolsonaro fez questão de reafirmar esse propósito em uma rede social, defendendo as privatizações e do teto de gastos públicos. Voltou defender estes postulados ultraliberais no início da noite desta quarta-feira (12), após reunir-se com os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, Guedes e alguns parlamentares, com o intuito de tentar demonstrar alguma harmonia no governo e com o Legislativo.

O problema, como se vê, não é a falta de rumo, mas uma mistura de incapacidade e conteúdo intragável de suas propostas. Bolsonaro enfrenta dificuldade para articular uma base com alguma capacidade de movimentação no Congresso Nacional em parte por inépcia e também pela rejeição de alguns aspectos do seu cardápio por muitos parlamentares.

O resultado é uma certa paralisia da relação do Executivo com o Legislativo, agravada pelos arroubos do presidente contra a normatização democrática dos Poderes da República. Armada a animosidade, alguns de seus projetos, naturalmente de difícil aceitação, esbarram também na contraposição autônoma do Congresso Nacional. Em algumas questões, o parlamento não só rejeitou a pauta bolsonarista como aprovou medidas contrárias à sua orientação econômica ultraliberal e neocolonial.

Foram os casos do auxílio emergencial de R$ 600, o socorro às empresas mais vulneráveis da economia e a ajuda aos estados e municípios. Para enfrentar essa pauta contrária aos ditames de Guedes, Bolsonaro manobrou o máximo que pôde, ao mesmo tempo em que buscou garantir a continuidade do seu ministro da Economia no cargo.

É preciso lembrar que Guedes – uma espécie de guardião do cofre do Estado, a serviço do mundo do rentismo, para evitar a destinação de recursos públicos às necessidades do país e do povo – brandiu a falsa expectativa de crescimento anual de até 5% depois da “reforma” da Previdência e déficit nominal zero em um ano. No mundo das realidades, houve o crescimento em 2019 de 1,1% do PIB e a recessão em 2020, com queda projetada de 11% no segundo trimestre.

Ou seja: o fracasso do programa econômico de Bolsonaro precedeu a pandemia. Um quadro que se agravou drasticamente, em especial pela recusa do governo de utilizar a força do Estado para enfrentar a Covid-19 e proteger economia. Com isso, não há a menor perspectiva de retomada de crescimento, o que tem levado alguns analistas a falar que o país pode chegar ao extremo da bancarrota.

Enquanto isso, Bolsonaro foca o projeto da sua reeleição, mas sabe que dificilmente terá êxito com a economia em frangalhos. Outro fator reside no fato de que Bolsonaro, para sobreviver e mirar 2022, teve que saltar a cerca do gueto Bolsonarista. O deputado Ricardo Barros (PP-PR), um dos expoentes do Centrão, acaba de assumir a liderança do governo na Câmara dos Deputados.

Esse movimento de ampliação de sua base política de sustentação traz consigo um montante de demandadas derivado da máxima “é dando que se recebe”, que não cabe nas contas ultraliberais de Guedes. Bolsonaro enfrenta uma espécie de sinuca de bico. Guedes, com apoio do chamado “mercado”, o chantageia com a ameaça de engrossar as fileiras “da debandada “, o que seria péssimo para sua imagem perante o rentismo. Se segue a cartilha de Guedes vê a economia afundando no atoleiro. Nesse entreato, tergiversa.

Mas, independente dessa questão, impõe-se o enfrentamento urgente com as causas da tragédia social já em curso. Com Guedes – que subiu novamente na corda bamba – ou sem Guedes, o governo Bolsonaro, que acaba de reiterar o seu programa econômico alicerçado no ultraliberalismo e no neocolonialismo, precisa de um fim.