Ultraliberais escancaram receita para arrochar o povo
O programa de governo das candidaturas do campo conservador se assemelha àqueles filmes que de tanto serem reprisados fica fácil descrevê-los de cor e salteado, quadro a quadro.
Publicado 24/08/2018 18:05 | Editado 13/12/2019 03:29
Os três candidatos desse front que despontam como protagonistas no xadrez eleitoral – Geraldo Alckmin, Marina Silva e Jair Bolsonaro – falam o idioma do “mercado” com a maquiagem da demagogia, mas seus economistas têm escancarado propostas que são verdadeiras reedições de experiências que resultaram em receitas severamente amargas enfiadas goela abaixo do povo.
Pérsio Arida, o porta-voz das propostas econômicas do tucanato, tem se manifestado sobre pontos nevrálgicos de maneira a não deixar dúvidas de que num eventual governo Alckmin o povo não terá vez. Para ele, a economia real do país deve girar pela mão invisível do mercado, enquanto a mão visível do Estado administra a lógica rentista. Geração de empregos, por exemplo, é responsabilidade exclusiva da “iniciativa privada”. Não há dinheiro para se “ter uma política específica para emprego” e a ideia “de que o Estado deva fazer isso é uma noção errada”.
O quadro seguinte do filme ultraliberal é o da “política de preços de combustíveis e privatização de refinarias da Petrobras”. Segundo Arida, os preços interno e internacional precisam se corresponder para não gerar “distorções na economia”, que seriam a amortização da diferença via tributos. Ou seja: ao importar combustíveis, o preço internacional passaria pelo filtro da tributação interna. A ideia faz parte de outro conceito de Arida – o fim do monopólio de refino da Petrobras para estabelecer a “competição” como mecanismo de controle de preço.
Essa anunciada privatização atinge a essência da Petrobras. Com o refino sob controle estatal, o governo tem um importante instrumento para impedir distorções nos preços a favor dos interesses privados. Aliás, essa foi a ideia da criação da Petrobras, que surgiu como desmentido aos que só acreditavam nas maravilhas da “iniciativa privada”. Os monopólios privados sabiam que a estatal era a solução certa para o problema do petróleo brasileiro e que seria a base econômico-financeira do desenvolvimento nacional.
No início da década de 1960, o monopólio estatal foi reforçado com a incorporação da importação de petróleo e da distribuição de derivados. A integração de todas as fases da indústria petrolífera – exploração, produção, transporte, refino e distribuição – no regime de monopólio permitiu ao país controlar a totalidade do seu petróleo. O setor evoluía em um ambiente iluminado pelo debate democrático e parecia intocável, apesar do assédio incessante das multinacionais – que ressurgiu com força assim que o projeto neoliberal desembarcou no Brasil.
A proposta de Arida também se contrapõe à prática das grandes companhias de petróleo; a integração faz parte do negócio. Está aí o exemplo da Shell, que em 2016 compensou seu prejuízo na exploração, devido ao baixo preço internacional do barril de petróleo, com o lucro no refino. Essa lógica explica por que a Petrobras, que já entregou o setor petroquímico, mais uma vez está no centro de debate eleitoral; exatamente por ser o eixo da economia num projeto de desenvolvimento nacional sustentado em bases soberanas.
Esse ponto demarca com nitidez os dois campos que disputam as eleições de 2018. As propostas de Arida e de outros economistas do campo conservador retomam o caminho do reinado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), interrompido com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva em 2003. A Petrobras vinha de um processo de esfacelamento; estava sendo moída para ser entregue à privatização. Essa interrupção possibilitou à estatal alcançar a autossuficiência em petróleo, anunciada em 21 de abril de 2006, e à descoberta do pré-sal.
Lula falou sobre a sensação de presenciar aquela conquista. “Eu acredito que ser brasileiro, conhecer a história da Petrobras e viver o 21 abril de 2006 como eu vivi, eu acho que é uma dádiva de Deus”, afirmou. O então presidente lembrou as críticas que a estatal enfrentou no decorrer de sua história. “Eu sei que a Petrobras desde 1953, com o decreto de Getúlio Vargas, foi vítima de críticas daqueles pessimistas que gostam de criticar tudo, daquele mesmo que disse que a Petrobras não ia dar certo”, comentou.
Na outra margem estão, além de Arida, Paulo Gudes, economista do candidato Jair Bolsonaro, com um discurso além de ultraliberal mais agressivo em relação às estatais. Para ele, todas as estatais devem ser sumariamente privatizadas. Marina Silva, por sua vez, se esconde em malabarismos retóricos, mas deixa claro que a Petrobras “não pode ter uma visão dogmática em relação ao mercado”.
O fundo da questão vai muito além da retórica da “competição”. Paulo Guedes disse, sem rodeios, que as privatizações são para abater a dívida pública – uma repetição mecânica do que FHC passou oito anos proclamando, sem apresentar absolutamente nada de concreto para justificar o mantra. Essa lógica é a mesma das “reformas” do Estado e da Previdência Social, pontos centrais do programa ultraliberal que une os três candidatos protagonistas do campo conservador.
A meta é cobrir o deficit fiscal às custas de um violento arrocho no Orçamento Público e no Estado, um aprofundamento da Emenda Constitucional 95, sacrificando o povo impiedosamente (Guedes chegou ao ponto de propor “reformar” a Constituição para desvincular recursos para áreas como saúde e educação). A soma dessas medidas resulta numa receita certa para atravancar o país. Para o povo, o crucial é a retomada do caminho político no rumo da adoção de um projeto nacional de desenvolvimento.
Evidentemente, a grande mídia trata de “dourar a pílula”. Mas, como bem disse um conhecido pensador e revolucionário, “o povo aprende por sua própria experiência”. E grande parte dele já padeceu em demasia em consequência desse receituário nefasto. A liderança de Luiz Inácio Lula da Silva na corrida das eleições presidenciais, em todas as pesquisas de intenção de voto, demonstra esse aprendizado da classe trabalhadora.