Casas – moradias

As casas sempre me impressionaram, tanto pelo seu aspecto externo de construção, como pelo seu interior, de modo especial.

Foto: Inácio Carvalho

As casas sempre me impressionaram, tanto pelo seu aspecto externo de construção, como pelo seu interior, de modo especial.

Muitas vezes sinto-me atraída pelo estilo de uma edificação, particularmente as de arquitetura rudimentar. E, quando me deparo com uma casa antiga, fico analisando a fachada, as portas, as janelas ou as muradas da rua em que se localiza e pergunto-me como viveram ou vivem ali seus habitantes. Se gosto do seu aspecto, imagino-me morando dentro dela, como disporia o mobiliário, os enfeites, os livros.

Costumo dizer que as casas têm alma, identificam-se com a personalidade de seus moradores. Velhos, adultos ou crianças vão selando com o tempo a identidade de uma casa onde habitam. Estas moradas dão-me a impressão de serem um ente maior, mesmo sendo de médio porte ou minúsculas; elas, na verdade, dão a dignidade aos seus habitantes. O teto onde morar é um elemento fundamental da existência. Numa sociedade justa não haveria uma pessoa sem um lugar onde se abrigar. Uma casa é a acolhida do ser humano, é guardiã do corpo e da alma de cada pessoa que vive entre suas paredes. Em cada um de seus cômodos ficam armazenados suspiros, palavras, lágrimas, risos… À medida que o tempo passa, as casas vão se tornando plenas como se fundissem ali os sentimentos encerrados. E, parece-me ainda que, quando as portas e janelas se abrem é como se a alma de cada um de seus habitantes saísse por cada fresta.

As casas antigas são aquelas mais interessantes, pois são elas que vão guardando o memorial de seus moradores através dos tempos, tornando-se quase humanizadas numa identificação mútua. E aqui recordo-me de uma passagem em O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo: Pe. Lara “passou pela frente da casa de Pedro Terra […] pela primeira vez notava uma coisa curiosa: a fachada, com a porta ladeada pelas duas janelas, possuía uma figura quase humana….” e passa a indagar-se: “Será que os homens constroem suas casas à sua própria imagem?  Ou então, que as casas acabam ficando parecidas com as pessoas que as habitam?” (SP. Companhia das Letras, p. 262).   

Aquelas casas que vão permanecendo com o passar do tempo encerram a história de seus moradores ancestrais como também suas relações com a comunidade. Muitas vezes são móveis, retratos na parede, objetos remanescentes que vão revelando o modus vivendi de seus donos que ali habitaram outrora. Não importa a sofisticação ou não desses objetos que, muitas vezes, podem ser guardados pelo aspecto valorativo do afeto. Na verdade, as casas são o registro das civilizações. Todo um conjunto de moradias vai forjando o patrimônio de um lugar, o tempo dos próprios cidadãos. (É certo que neste contexto estão incluídos os fóruns, as igrejas, escolas, outras edificações públicas). A habitação humana pode ser também isolada em lugares ermos, vilarejos, fazendas, favelas, praias ou montanhas; mas é, sem dúvida, o lugar do homem, seu sono ou sua insônia, seu refeitório, seu descanso…

Ao finalizar, a morada humana confunde-se com a própria história da humanidade desde os primórdios das cavernas. Uma casa antiga que vai permanecendo entre gerações convida-nos a mantê-la preservada. Pois, como escreveu Mário Quintana, “e se acabarem as construções antigas, nossa história vai ficar sem teto!” (Água. Edição póstuma e trilíngue. Artes e Ofícios, Porto Alegre, p. 24). E esse teto as cidades não podem perder!

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