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Espetáculo Vida propõe novos significados à obra de Chico Buarque

O disco Vida, de Chico Buarque, primeiro depois do fim da ditadura militar no Brasil, chega aos palcos através da adaptação de Luciana Sonck, sob a direção de Luis Aranha e direção musical de Daniel Conti. Baseado no momento atual, o espetáculo não é um show e não é uma peça de teatro, é outra forma de perceber o disco e mesclar experiências pessoais com a vida política do Brasil de hoje.

Por Mariana Serafini

luciana sonck - Divulgação

Para Luciana, levar Vida ao palco é uma forma de homenagear a obra de Chico através de seu disco preferido e levantar um debate sobre temas que vieram à tona com a abertura política após o fim da ditadura, mas ainda hoje são latentes. “[O disco] e é um compilado e um expurgo porque são músicas que não foram censuradas naquele momento e resgatam alguns temas que eram tabus. As canções falam sobre homossexualidade, violência contra a mulher, tem personagens travestidos, suicídio, divórcio. São alguns temas que foram resgatados e, dentro da obra do Chico é considerado um disco bem visceral”.

O desejo de montar um espetáculo com base no disco surgiu ainda em 2010, à época para homenagear os 30 anos do lançamento. Entretanto, Luciana encarava a obra de uma forma muito ligada à vida pessoal e o projeto foi adiado. Cinco anos depois a política do país ganhou novos aspectos e parecia o momento certo de resgatar os temas de Vida, foi então que o projeto saiu do papel.

Luciana não imaginava, porém, o que estava por vir em 2016: toda a onda de instabilidade politica que invadiu o Brasil com o golpe parlamentar contra a presidenta Dilma Rousseff e diante disso o espetáculo ganhou novos significados. “A gente fez duas temporadas em 2016, no primeiro semestre, na semana que a íamos entrar em cartaz protocolaram o pedido de impeachment. Nós estreamos com isso, imagina o que era ir para o palco com este sentimento?! E no segundo semestre, quando voltamos com o espetáculo, foi justamente na semana que o processo foi deferido. Nada combinado, claro, mas foi muito significativo e muito simbólico para todo o elenco. Talvez agora o significado seja novamente renovado”.

Com uma hora de duração, o espetáculo é dividido em três grandes atos. Os personagens “nascem e morrem” no palco porque toda a construção de figurino e maquiagem é feita em cena, ao passo que o show avança e termina com a desconstrução dos mesmos personagens, entre eles o travesti Genival e Bárbara Calabar [que não está no disco, mas foi inserida no espetáculo]. “É uma grande reflexão sobre tudo que foi vivido”, explica. Além de Luciana na concepção e execução, Vida conta com Luis Aranha na direção geral; Daniel Conti, na direção musical; Taty Kanter na iluminação, Talita Righini como assistente de produção; Fábio Marins na flauta e sax e Ygor Saunier na percussão.


Luciana trabalha com sociologia e música, no palco, consegue fundir as duas áreas (Foto: Clécio Almeida)



Além de socióloga formada pela PUC-SP, e mestranda em gestão territorial pela Ufabc, Luciana estudou Canto Popular pela Universidade Livre de Música e trabalhou durante três anos como atriz na Cia Paidéia de Teatro. Fora do palco é consultora em seleção e gestão de projetos, modernização em políticas públicas e transparência em governo.

E foi a “socióloga Luciana” que visitou a redação do Vermelho um dia depois de chegar de Bogotá, onde praticava do World Summit of Nobel Peace Laureates, o encontro mundial de personalidades laureadas com o Prêmio Nobel da Paz. Esta edição foi realizada na Colômbia porque o mais recente laureado é o presidente do país, Juan Manuel Santos.

Vida e o empoderamento feminino

Como milhares de mulheres brasileiras, Luciana também tem um capítulo de sua vida marcado por um relacionamento abusivo e isso fez com que, de certa forma, dirigisse o espetáculo à luta por igualdade de gênero. “Eu quis dar ênfase na questão de gênero no espetáculo, não só porque estava latente nas canções, mas porque isso fez parte da minha vida pessoal de tomar consciência de um processo de violência, de querer lutar contra isso, descobrir a dificuldade que é e construir uma rede de apoio e depois encontrar força para se engajar numa luta política”.

Para ela, Vida é também um grito para dizer “estamos todas juntas”, para engajar e mobilizar pessoas dispostas a lutar pelo fim da violência contra a mulher. Luciana questiona, por exemplo, a participação de mulheres na politica institucional: “nós temos uma participação muito baixa de mulheres no Congresso Nacional e nos executivos municipais de todo o país. São 5.500 municípios, e onde está a mulher neste quadro? Nós ainda temos muito para melhorar, principalmente nesta área”, defende.

Segundo Luciana, a luta pelos direitos das mulheres é tão latente que até mesmo no encontro de laureados com o Nobel da Paz este foi o tema mais debatido. “Os grandes temas discutidos durante todo o seminário foram sobre o empoderamento feminino e a eleição de Donald Trump. Mesmo as mulheres premiadas criaram um poder paralelo de “mulheres Nobéis da paz” para debater sobre como elas lutam pelo empoderamento feminino no mundo inteiro. Acho que a tendência é se fortalecer cada vez mais.

Serviço

Espetáculo Vida
Local: Teatro Sérgio Cardoso – Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista, São Paulo
Dia: 17 de fevereiro
Horário: 20 horas
Entrada: R$50 e R$25 (meia)