Não temos tempo a perder

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Nossos protestos são feitos com música, performances, poesia, fantasias, estandartes e cartazes com recados inteligentes e bem humorados l Fotos: Marisa Pacheco

Que deprimência sermos obrigados a ficar em volta do arruaceiro oficial e de sua horda bárbara, ouvindo as patéticas ameaças, a mídia inteira comentando cada arroto, cada bravata, cada barbaridade, cada maluquice, cada burrice que ele(s) fala(m) ou comete(m), minuto após minuto.

Não digo da miséria de espírito dos seus seguidores – uma parcela constituída de imbecis e a outra também – , mas da tragédia da população consciente, a banda boa do nosso povo, tendo que viver aos sobressaltos, aparvalhada, assaltada a mãos armadas, amedrontada, perdida no cenário, tanto quanto todos os que parecem entender do riscado um pouco mais que a média.

Ficar, portanto, em casa, em vez de estar com a resistência em dia de manifestação, como esta do 7 de setembro, também tem seu valor, para se ter uma visão geral, em tempo real, diante das TVs independentes e das oligopólicas, das notícias das redes e das particulares, estas que compartilham os amigos nos protestos de ruas das capitais.

Duro, mas duríssimo mesmo, nesse panorama, é flagrar a realidade da falta de argumentos sólidos nas análises dos fatos da hora, pela imprensa em geral. E parece até compreensível, por um lado.

Perante a demência do mercenário-mor, que conta com o apoio de estrategistas e suas táticas já testadas noutros países, não é facilzinho achar caminhos novos ou atalhos que abortem a ressurreição fascista. Mas devia ser.

Devíamos ter na nossa massa crítica pensadores ativos o tempo todo, ininterruptamente dedicados a essa tarefa, de encontrar os meios de saída nos impasses históricos, em vez de só andarem em círculos dissertando sobre o óbvio e se (nos) angustiando com especulações às vésperas de acintes como o anunciado 7 dos bárbaros da hora.

Ficamos inconformados com atitudes coniventes e covardes de governadores (como o do DF) e de parlamentares com poderes de decisão (precisa dar nomes?); dos togados e dos policiais (precisa explicar suas posições na trajetória desde 2015?); dos militares contrários à situação (existem, de fato?) e dos donos da mídia golpista com seus fiéis escudeiros (muitos destes agora tentando se postar como democratas!); dos ogros do agronegócio e da burguesia em geral (que também atravessam com suas mentes e línguas envenenadas alguns membros das nossas famílias, para o nosso absoluto espanto!).

Mas de que adiantam o inconformismo e a falta de comando, ou a letargia que nos leva para protestos nas ruas com longos espaços de tempo entre uma e outra manifestação? Sabe-se, por criadores do caos mundial atual, como Gene Sharp, que a principal tática, entre as mais de cem criadas somente por ele e os colaboradores de seu _think tank_, é que não se pode sair da rua.

Para se ganhar a guerra, é lição deles próprios permanecer direto, diária e noturnamente, nas ruas, com revezamentos intermitentes da militância organizados pelas lideranças, em vez de esperarmos a salvação desses que nos deveriam, por dever e obrigação – os poderosos das instituições ditas democráticas do País.

Ao mesmo tempo, é de se refletir que a banda boa e guerreira da população brasileira é tão avançada, tão civilizada para a banda podre do País e mesmo para os militantes furiosos do Mundo que se crê o Primeiro, que, estes, sem os degraus, sem os meios, não têm como alcançar e compreender o nível da proposta do nosso projeto existencial pacífico de convivência humana.

Nossos protestos são feitos com música, performances, poesia, fantasias, estandartes e cartazes com recados inteligentes e bem humorados, rituais e sketchs teatrais; nossa militância carnavalesca tem o samba no pé, a alegria debochada, a piada, a descontração e uma fé inadjetivável que a cultura negra e a indígena nos legaram. Gringos que nos assistem ficam de queixo caído. Os odiosos ficam se mordendo de inveja da alta e esfuziante energia que emanamos. É um mistério gozozo que não alcançam, porque lhes faltam essa graça natural, essa bênção, que o brasileiro traz no sangue.

Daí que temos muito o que trabalhar, ao nosso modo, a nossa saída desse curral em que nos aprisionaram de corpo e alma. Nossa imensa riqueza de solo, nossa diversa, múltipla, admirável cultura, nossos brilhantes intelectuais e artistas, nossos mestres e doutores, nossos analistas, enfim, as nossas esquerdas, podem sim retomar o leme da mão dos arruaceiros que têm destruído o Brasil e que sujaram o 7, com sua grosseria patológica. De sociopatas.

Temos que nos esforçar mais, com mais vontade, convicção e autoconfiança, e voltar a arrumar a Casa e pintar o 7 com o verde-amarelo que é NOSSO e com todas as demais cores a que temos direito. Sem mais tempo a perder.

Fonte: Brasiliários

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