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Mubarak permanece no poder e frustra manifestantes

Em discurso exibido na noite desta quinta-feira (10), o presidente do Egito, Hosni Mubarak, anunciou que não deixará o cargo "mas" delegará poderes ao vice-presidente do país, Omar Suleiman. A revelação foi transmitida pela emissora de televisão "Al Arabiya" e foi recebida com indignação pelos manifestantes que lotam a praça Tahrir.

Mubarak anunciou em seu discurso a passagem de mais poder ao vice-presidente e reformas na Constituição. As reformas constitucionais em questão implicam a modificação de cinco artigos e a derrogação de um sexto artigo da constituição, acrescentou a emissora.

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Falando sobre as manifestações dos últimos dias, Mubarak arengou que "o sangue dos mártires não será desperdiçado". E ameaçou: "Não serei brando ao castigar os responsáveis".

"Vou responder às vossas exigências e às vossas expectativas", continuou, dizendo que "os erros podem ocorrer em qualquer regime político, mas o importante é corrigi-los".

Mubarak disse também que acredita nas "boas intenções dos jovens" que protagonizaram as gigantescas manifestações no Cairo e que não se apresentará às eleições presidenciais de setembro.

Na praça Tahrir os manifestantes demonstraram grande insatisfação, com gritos de "Fora", segundo informaram agências de notícia internacional. Um telão improvisado foi armado para a transmissão.

Pressão de Obama

O presidente dos EUA, Barack Obama, que horas antes discursava em um evento no estado de Michigan, disse que "os EUA farão todo o possível para apoiar uma ordenada e genuína transição para um sistema democrático, no Egito. Os tempos são de transformação porque as pessoas pediram por essa mudança".

"Estamos a viver um momento histórico", disse o chefe da Casa Branca. Obama defendeu a renúncia de Mubarak no último sábado (5), alegando que isso ajudaria o Egito a "passar" para um regime democrático.

Segundo a Fraternidade Muçulmana, a situação indica um golpe militar. Para a organização, uma evidência de que o processo de golpe já está encaminhado foi a reunião do Conselho Supremo Militar desta tarde, que se encontrou pela terceira vez na história do Egito e sem a presença de Mubarak.

Nas últimas horas circulou também o rumor de que Mubarak teria partido rumo ao balneário de Sharm el Sheikh, na costa do Mar Vermelho. Entretanto, a emissora de televisão americana NBC indicou que o chefe de Estado ainda estava no Cairo.

Foi confirmada no entanto a informação de que Mubarak gravou o discurso que foi transmitido nesta noite pela televisão estatal e que a gravação foi confiscada pelos militares. O conselho militar supremo teve lugar pela primeira vez desde 1973 e esta foi a terceira reunião do orgão na história do Egito.

Quem terá os tais poderes delegados?

Omar Suleiman, atual vice-presidente e ex-chefe do serviço de espionagem do Egito, era o nome mais falado para ocupar o lugar de Mubarak. Suleiman é homem de confiança do imperialismo na região e é a senha para dar continuidade ao regime. Recebendo alguns dos poderes que Mubarak delegará, confirma sua trajetória nos últimos dias, de homem de confiança do imperialismo.

Um documento da Embaixada dos Estados Unidos em Telavive, datado de 29 de agosto de 2008 e revelado pelo site WikiLeaks, afirmava na época que Israel se sentiria "mais confortável com a perspectiva de Suleiman" ocupar a presidência do Egito. Na época, Suleiman era chefe do serviço de espionagem do país. No cargo desde 1993, ele fez várias visitas oficiais a Israel e teve papel decisivo nas negociações entre israelenses e palestinos.

O documento vazado resume conversas que o ministro da Defesa israelense, Ehud Barak, manteve com líderes egípcios na cidade portuária de Alexandria. O documento diz que um dos conselheiros de Barak, David Hacham, teria afirmado que a delegação israelense estava "chocada" com a aparência idosa de Mubarak e com sua voz cansada.

"Hacham notou que os israelenses acreditam que Suleiman deve servir ao menos como presidente interino caso Mubarak morra ou fique incapacitado", afirma a mensagem, que acrescenta que Hacham foi "só elogios" para Suleiman.

Um dos maiores amigos de Suleiman em Israel é o ex-ministro da Indústria e do Comércio, Binyamin Ben-Eliezer, que no início de fevereiro avaliou a situação no Egito, refletindo a posição do governo israelense, que demonstrava uma calma tensa, na expectativa do que viria a ocorrer com o regime amigo instalado no país vizinho.

"Eu não creio que seja possível haver uma revolução no Egito", declarou Ben-Eliezer à Rádio do Exército Israelense. "Eu vejo a situação se acalmando", continuou. O governo de Israel mostrou reticência no início das manifestações, provavelmente dialogando com os Estados Unidos o que fazer para evitar que uma revolução detonasse o seu maior aliado na região.

Homem da CIA

Em 29 de janeiro Suleiman foi apontado vice-presidente do país, numa aparente tentativa de Mubarak de mudar o quadro de protestos que tomou o Egito. Em seguida demitiu todo o gabinete e chegou a prometer 15% de aumento para os funcionários públicos, como medida para desmobilizar os manifestantes.

Há já muito tempo Suleiman é visto como um dos prováveis sucessores de Mubarak na direção do regime subalterno ao imperialismo.

Suleiman é um homem treinado pela CIA na década de 1980 na John F. Kennedy Special Warfare School, situada no Fort Bragg, na Carolina do Norte. Como chefe da espionagem de seu país, ele tocou o programa de rendição extraordinária da agência de espionagem americana desde 1995, no qual suspeitos de terrorismo capturados pelos EUA eram repassados para o Egito e para outros países, sem procedimentos legais, para serem torturados. Como agente da CIA, Suleiman também foi investido "negociador" para as questões do mundo árabe, principalmente entre israelenses e palestinos.

Suleiman é um crítico mórbido de países como Síria e Irã, que não se dobraram ao imperialismo americano. Querido pelos israelenses, arquitetou a destruição dos túneis construídos pelos palestinos na fronteira do Egito com a Faixa de Gaza, que serviam para facilitar o acesso de artigos fundamentais para a sobrevivência dos habitantes de Gaza.

É mundialmente conhecida a história do egípcio nascido na Austrália, Mamdouh Habib, cidadão que foi preso em 2001 no Paquistão, trasladado nos voos ilegais da CIA para o Egito e impiedosamente torturado no seu país. Segundo seu livro My Story: The Tale of a Terrorist Who Wasn’t, ele foi torturado seguidas vezes por diversos guardas na prisão, até que, um dia, seu interrogador o socou com tanta força que chegou a perder seu capuz, revelando a sua identidade: era Omar Suleiman.

Habib conta que, como não tinha nada relevante a dizer, a despeito de todas as evidências negativas de que fosse um terrorista, Suleiman o cedeu aos americanos, que o levaram para Guantânamo, onde ficou até 2005.

Da redação, com agências