Bruno Peron: Renda para um Brasil carinhoso

O carinho é um sentimento de afeto, amor, benevolência e ternura que quase toda criança dissipa ao seu redor. Basta que uma criança sorria, brinque ou faça qualquer demonstração de carinho para que se quebre o clima ensimesmado entre adultos no espaços públicos. À infância se associa também a crença num mundo bom e justo, a ingenuidade e a birra a despeito das nódoas materiais e morais que tingem a humanidade em conflitos e guerras.
 
Por Bruno Peron*, em seu blog

O governo federal anunciou o programa Brasil Carinhoso em 13 de maio de 2012, que virou lei a partir da sanção da presidente Dilma Rousseff em 3 de outubro de 2012. É uma estratégia que auxiliará o desenvolvimento de crianças em situação de pobreza extrema – cujo critério é de que cada integrante familiar ganhe menos de R$ 70 mensais – e em estágio inicial de crescimento a fim de impulsionar as políticas sociais e torná-las consistentes. O programa visa a auxiliar aproximadamente 2 milhões de famílias nestas condições.

O programa assegurará renda mínima de R$ 70 por membro de famílias que já recebem o Bolsa Família e que possuem crianças de até 6 anos e terá o propósito prático principal de aumentar o número de creches em todos os estados brasileiros e melhorar os serviços de saúde que se oferecem sobretudo a crianças nesta idade. A previsão é de que o programa investirá mais de R$ 10 bilhões entre 2012 e 2014 (http://brasilcarinhoso.net/). Pelo menos estas famílias não se classificarão mais como extremamente pobres por instituições nacionais e organismos internacionais que cuidam do desenvolvimento social.

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) informou que o programa Brasil Carinhoso visa sobretudo à redução da fome e constitui uma das linhas de atuação do Plano Brasil sem Miséria através de uma política que “reforça a transferência de renda e fortalece a educação, com aumento de vagas nas creches e cuidados adicionais na saúde, incluindo a suplementação de vitamina A, ferro e medicação gratuita contra asma” (http://www.mds.gov.br/brasilsemmiseria/brasil-carinhoso). O MDS estima que conseguiu tirar 2,8 milhões de crianças de até 6 anos da penúria através de outros programas sociais.

Grupos desfavoráveis ao Bolsa Família argumentam que a maior parte das famílias malversa estes recursos governamentais e tem número maior de filhos para viver às custas do governo com R$ 70 mensais cada um. Entretanto, esta mensalidade não é um valor suficiente para ter uma vida digna porque somente uma compra básica no supermercado para a família já excede este valor, embora este seja um grande incentivo enquanto sirva como meio para outro fim. Nisto reside o propósito da política social que complementa o já existente Bolsa Família.

A dívida social do país não se resolve enquanto o pobre financeiro crescer como pobre educativo. Para isso, é preciso fortalecer a estratégia de inserção das camadas mais pobres numa esteira de desenvolvimento nacional na qual integrantes de classes mais ricas têm corrido em número maior. A política do Brasil Carinhoso é de inclusão social. Não é possível promover o desenvolvimento de outras áreas, como Educação e Saúde, quando a criança cresce com poucos recursos financeiros e pouco incentivo familiar.

O Brasil Carinho gera inclusão social e democratização do acesso a ferramentas culturais, econômicas e educativas que, de outra forma, não seriam possíveis sem o benefício. Por exemplo, ter fluência num segundo idioma é pré-requisito para vagas de emprego às quais aspirem estas crianças nalgum momento de sua vida; para isto, é preciso ter dinheiro para pagar pelo curso desde cedo. O mínimo que se espera deste tipo de política social é que as crianças beneficiadas tenham condições de tornar-se adultos saudáveis e com nível educativo satisfatório para mudar a situação desfavorável de renda de sua família.

O propósito do programa é essencialmente econômico para tirar tantos milhões de crianças da pobreza extrema. O Brasil Carinho incentiva o desenvolvimento inicial da criança, mas ainda depende de algum complemento socioeducativo ao auxílio financeiro. Um deles é a ampliação de vagas em creches, que também se prevê no marco do programa. O governo tem tratado de fazer sua parte; o resto será com a decisão de cada família.

Há muito o Brasil aguarda políticas que priorizem a criança em seus momentos iniciais de crescimento. Embora nem todas as famílias beneficiárias utilizem positivamente os recursos, o país tem dado condições a que as novas gerações não tenham o destino lúgubre de seus antecessores. Contudo, a ascensão social virá ainda por meio da dedicação e do mérito.

* Bruno Peron é bacharel em Relações Internacionais (Unesp), mestre em Estudos Latino-americanos (Unam-México) e colaborador do Vermelho