“Para defender este povo, eu faço qualquer coisa”, diz Lula

Como há muito tempo não fazia, o ex-presidente Lula concedeu uma longa entrevista ao jornalista Kennedy Alencar, do SBT Brasil, nesta quinta-feira (5), abordando os principais temas da atual conjuntura política e econômica do país.

Lula entrevista SBT - Instituto Lula

Numa entrevista na qual demonstrou serenidade e compromisso com o país, Lula falou sobre as especulações em torno das eleições de 2018 e sobre uma eventual candidatura. “Se houver necessidade de defender um projeto que fez com que os pobres fossem vistos neste país, que incluiu milhões e milhões de pessoas, para defender esse projeto, se eu perceber que ele vai correr risco, você não tenha dúvida de que eu estou disposto a ser candidato”, salientou Lula.

No entanto, o ex-presidente não caiu na armadilha da grande imprensa que quer antecipar o debate e ditar a pauta da disputa eleitoral. “É preciso a gente não ficar trabalhando com pesquisa com três anos de antecedência”, disse.

Interpelado por Kennedy que disse que ele já estava com discurso de candidato, Lula acrescentou: “Não, eu não estou com discurso de candidato. Eu vou preparar ainda”.

Lula repeliu a ideia de que é o “salvador da pátria”, pois para ele, “na história da humanidade, toda vez que alguém negou a política e tentou encontrar um ‘salvador da pátria’, o resultado foi desastroso”.



Gratidão

Mas o presidente mais bem avaliado da história do país frisou que tem consciência do seu papel e do quanto a sua eleição representou para o povo brasileiro. “Ninguém conhece a alma do povo brasileiro como eu conheço, ninguém viveu a alma deste povo como eu vivi. É por isso que houve uma interação tão grande entre mim e a população brasileira, porque eu não era um estranho na Presidência, eu era um deles na Presidência. E isso, obviamente, fez com que houvesse tanta solidariedade, que a gente pudesse eleger a Dilma e reeleger a Dilma. Eu sou grato ao carinho do povo”, pontuou.

Ele ainda reafirmou o seu compromisso com o Brasil. “Para defender este povo, eu faço qualquer coisa. Para defender o direito do pobre entrar na educação, na universidade, eu faço qualquer coisa. Para fazer com que os pobres subam mais um degrauzinho na ascensão social, eu trabalharei 24 horas por dia”, afirmou.

Polarização política

Lula classificou as eleições de 2014 como a mais “virulenta” da história do país, mas salientou que não há espaço para manobras golpistas, como tenta a oposição encabeçada pelos tucanos.

“Eu acho que o Brasil não corre esse risco”, disse ele. E explica: “Não corre porque o Brasil já está calejado. Nós estamos vivendo hoje o mais longo período democrático desde a Proclamação da República neste país. E é importante, porque a democracia é complicada. A democracia exige paciência, sacrifício, muita conversa, muito diálogo. Tem gente que não gosta”.

Sobre a onda conservadora, Lula enfatizou: “Eu, de vez em quando, vejo na rua pessoas pedindo a volta do regime militar. Certamente, essas pessoas têm mais simpatia pelos torturadores do que pelos torturados. E quem viveu aquele período não quer a volta da ditadura militar. Nós queremos mais democracia porque é a única coisa que garante que um operário metalúrgico chegue à Presidência. É a única coisa que garantiu que um índio chegasse à Presidência na Bolívia. É a democracia”.

Soberba de FHC

Lula também comentou a postura do ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que, segundo ele, sofre com o sucesso que as forças populares conquistaram nos últimos anos.

“Eu acho que o FHC tem um problema comigo, que é um problema de soberba. O FHC, ele sofre com o meu sucesso. Ele sofre. Porque eu acho que ele queria que eu ganhasse, não que o Serra ganhasse. Porque ele imaginava o seguinte: o Lula vai ganhar, ele é um coitadinho metalúrgico, vai chegar aqui e não vai saber nada, não vai dar certo. Quando chegar em 2006, eu voltarei de braços abertos para os braços do povo. Ele devia pensar: o Lula não fala inglês, o Lula não vai saber conversar com as pessoas. O que aconteceu é que o meu governo se transformou numa coisa admirada por todo mundo. Porque nós fizemos a maior inclusão social da história deste país”, afirmou.

Lula voltou a comparar os números do primeiro ano do segundo mandato da Dilma e o primeiro ano do segundo mandato do FHC.

“Só para mostrar. No FHC, nós tínhamos só R$ 36 bilhões de reservas, dos quais R$ 19 bilhões eram do FMI. A Dilma tem R$ 370 bilhões. No primeiro ano do FHC, em 99, a dívida pública líquida era R$ 44 bilhões. A da Dilma é R$ 35 bilhões. O câmbio subiu, no FHC, 66%. Na Dilma, subiu 40%. A inflação, no FHC, era exatamente 9%. Igual à da Dilma, que era 9%”, resgatou.

Sobre as ilações de FHC, Lula afirmou que toda vez que ele tiver que falar de corrupção, ele tem que lembrar da emenda da reeleição. “Ele tem que lembrar que o único mensalão criado foi o dele. Ele tem que lembrar que nenhum processo dele é investigado”, rebateu Lula. E acrescentou: “Ele tem que lembrar que o único mensalão criado, reconhecido inclusive por deputados do DEM, que disseram que receberam, foi dele. Ele tem que lembrar que nenhum processo dele era investigado. Cadê a pasta cor de rosa, que não foi investigada? O MP dele se chamava engavetador”.

Investigações seletivas

Questionado pelo jornalista se tinha ‘temor’ sobre ser preso por conta das ilações e factoides divulgados de forma criminosa pela grande mídia, Lula foi enfático: “Não temo ser preso porque eu duvido que tenha alguém nesse país, do pior inimigo ao melhor amigo, que diga que um dia teve uma conversa ilícita comigo”, disse.

“O melhor patrimônio que a minha mãe deixou pra mim foi o direito de andar de cabeça erguida. Nunca interferi em nada. Só tem um jeito das pessoas não serem investigadas nesse país, é andar corretamente”, disse.

Para ele, as mentiras e calúnias lançadas contra ele são um problema ‘político’. “Tenho a consciência tranquila. Estamos vivendo a República da suspeição, não precisa de provas”, frisou.

Lula, no entanto, enfatiza que as ações de investigações “são coisas normais de um país democrático” e ainda mais normal porque é resultado “de 12 anos de governo que permitiu que fossem criados todos os instrumentos de transparência neste país e de modernização de todo o sistema de investigação”.

“Porque 15 anos atrás, não acontecia isso. É uma coisa nova. Uma coisa que, daqui a alguns anos, a história vai mostrar… Houve modernização na inteligência, houve mais liberdade para a Polícia Federal, houve mais autonomia do Ministério Público. Houve tudo melhor, tudo. E isso a gente faz porque combater a corrupção é obrigação, não é mérito”, ressaltou.

Ele salientou que durante o seu governo e depois que saiu da Presidência da República, nunca houve qualquer interferência nos órgãos de investigações ou da Justiça, mas frisou: “Há um processo, parece até um cartel, em que na quinta-feira começa a sair boato, na sexta começa a sair revista, no sábado vai para a televisão, domingo vai para os jornais e na semana seguinte começa tudo outra vez. E o vazamento é seletivo. Eu tenho casos em que o advogado do cliente não recebeu a denúncia, mas a imprensa recebeu. Então, eu acho um processo equivocado”.

Ainda sobre os factoides da imprensa, Lula apontou a enxurrada de mentiras lançadas contra a sua família. “Você acompanha a vida do meu filho Fábio. Acompanha na internet: ele tem avião, ele tem a torre Eiffel, ele tem a casa Branca, ele tem todos os bois da Friboi. Você não sabe a quantidade de desmentido que é feita todo santo dia. E é uma guerra que você não consegue acabar. Nem tudo que o delator fala tem veracidade. O delator fala porque o delator está sendo premiado”, ressaltou.